A necessidade de tributos mais justos
Há meses as questões do alargamento da faixa de isenção do Imposto de
Renda (IR) e da compensação fiscal pela taxação das grandes rendas ou das
transações financeiras (IOF) vem dominando o debate político no cenário nacional.
Nas últimas semanas, as mobilizações pela securitização das dívidas dos
produtores rurais introduziram um novo ingrediente nesta questão já bastante
complexa. Tanto como cristãos como cidadãos, não podemos ficar omissos a esse
debate e aos interesses que gravitam em torno dele.
A Doutrina Social da Igreja
Católica (DSI) coloca o conceito de Justiça
no centro da abordagem das questões sociais. A justiça é a “constante e firme vontade de dar a Deus e ao próximo o que
lhes é devido e constitui o critério
determinante da moralidade no âmbito intersubjetivo e social” (CDSI, §
201). E o conceito de Justiça Social diz
respeito aos aspectos sociais, políticos, econômicos e, sobretudo, à dimensão
estrutural dos problemas e suas respectivas soluções. E
aqui entra o conceito de Justiça
Tributária.
O Compêndio da Doutrina Social da Igreja (CDSI) diz os impostos e a despesa pública têm uma “importância
econômica crucial” para qualquer comunidade civil e política, devem ser administrados
com responsabilidade e transparência e ter como meta o Bem Comum, a
solidariedade e o desenvolvimento equitativo e eficiente dos diversos
segmentos da sociedade. Nesse horizonte, o pagamento de impostos é uma
concretização do dever de solidariedade, e a carga tributária deve ser racional
e equitativa (cf. CDSI, § 355).
A Justiça Social e a Justiça Tributária são tão relevantes que seu esquecimento ou
descumprimento é considerado um Pecado
Social. “Pecado Social é todo o pecado contra o Bem Comum
e contra as suas exigências, em toda a ampla esfera dos direitos e dos deveres
dos cidadãos” (CDSI, § 118). Assim, o seu enfrentamento é necessário, e promove a
liberdade e a dignidade humana. E, para assegurar o bem comum, os governos devem harmonizar com justiça os
diversos interesses setoriais (cf. CDSI, § 169).
Por isso, a reação de alguns segmentos
econômicos e grupos políticos à proposta de mudança nas regras do IR, de
taxação das grandes rendas, do lucro das BET’s e algumas outras atividades
merecem uma análise mais apurada. Não se trata de aumento de impostos, mas da
busca de uma maior justiça tributária. A obstrução da taxação das grandes
fortunas e das transações financeiras é uma agressão à Justiça Social, e pode ser vista como Pecado Social. A securitização das dívidas dos produtores rurais,
sem distinção de grandes e pequenos, vai na mesma linha e merece crítica
semelhante.
Podemos ver na ação destes grupos semelhança
com a prática dos fariseus e doutores da lei, criticada implacavelmente por
Jesus: “Amarram fardos pesados e insuportáveis e os põem aos ombros dos homens,
mas eles mesmos não querem movê-los, nem sequer com um dedo” (Mt 23,4); “Os
reis das nações dominam sobre elas, e os que exercem o poder se fazem passar
por benfeitores. Entre vocês não seja assim” (Lc 22,24-25). Como cristãos, não
podemos nos alinhar a estes falsos benfeitores, e precisamos postular uma
justiça multidimensional e plena (cf. Mt 3,15). Se a nossa justiça não for
maior que a desses senhores, não seremos verdadeiros cidadãos do Reino de Deus
(cf. Mt 5,20).
Dom Itacir
Brassiani msf
Bispo Diocesano de
Santa Cruz do Sul
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