sábado, 16 de agosto de 2025

Semana Nacional da Família

Deus conhece a dor e a delícia de ser família

No mês de agosto, dedicado inteiramente às vocações, as comunidades católicas celebram a Semana Nacional da Família. E quando tratamos do tema da família, é recorrente a referência à bíblia, particularmente à família biológica de Jesus. Mas esse recurso pode se tornar arriscado se ignoramos a distância histórica e cultural entre a família oriental do tempo de Jesus e as famílias ocidentais do século 21. Consideremos brevemente essa questão.

Nos evangelhos, a Sagrada Família de Nazaré aparece como uma autêntica família judaica, herdeira fiel das esperanças messiânicas que alimentavam a vida dos pobres, guardiã fiel e praticante das orientações religiosas do judaísmo. Ao mesmo tempo, os evangelhos mostram a família de Jesus como o gérmen da nova família humana, sustentada e orientada pela utopia do Reino de Deus como graça que congrega as pessoas e derruba as barreiras.

Por estar radicada em Nazaré, na Galiléia, e por desempenhar trabalhos artesanais, no olhar das famílias de Jerusalém, a Sagrada Família carregou a marca da suspeita e do menosprezo. O domicílio em Nazaré sublinha a inserção da Sagrada Família no povo de Israel, como numa espécie de grande família étnica. O crescimento de Jesus ocorre nessa interação viva. Ele aprende e ensina, unindo a relação com Deus e a relação com os homens e com o seu povo.

Em relação à família tradicional, Jesus foi uma espécie de transgressor. Rompeu com ela e afastou-­se das suas expectativas, que consistia em casar, cuidar da família e lutar pela sobrevivência. Vivendo o celibato, Jesus transgrediu também a obrigação de casar e gerar filhos, algo impensável para um rabino. Viveu a partir do sonho do reino de Deus, interessou­-se pelas pessoas simples da Galiléia, identificou­-se com seus problemas e esperanças.

Esta opção de Jesus pela utopia do Reino de Deus e pela defesa vida das vítimas está na raiz do conflito com sua família. Seus parentes tiveram dificuldades de acreditar nele e até pensaram que havia enlouquecido. O desfecho deste conflito foi o distanciamento da família de sangue e uma opção por uma vida itinerante. A comunidade que nasceu da sua pregação também foi crítica em relação aos laços familiares, como testemunham es escrituras.

Este distanciamento de Jesus em relação à sua família de sangue, especialmente no período de sua missão pública, não significa que as experiências afetivas e familiares da infância e da juventude não tenham permanecido vivas. Tudo o que ele aprendeu, amou e sonhou em Nazaré aflorou mais tarde na sua pregação: o valor das coisas pequenas e escondidas, a solidariedade com os vizinhos, o caráter paterno e próximo de Deus.

No que se refere a José e Maria, podemos dizer que eles realizaram de modo exemplar a participação na família nova, inaugurada pelo filho Jesus Cristo, em obediência ao Pai. Também eles cumpriram com prontidão a vontade do Pai. Marcada pelo ambiente simples e desprezado de Nazaré, a Sagrada Família, foi protagonista e modelo na busca e no cumprimento da vontade do Pai. Mas aqui já não temos mais a simples família tradicional.

Jesus ocupa um lugar central na Sagrada Família de Nazaré. Sua presença se irradia sobre Maria e José: eles se comovem, impressionam e maravilham diante da novidade; acolhem e recebem seu mistério do Reino de Deus, embora, por vezes, fiquem atrapalhados e desorientados. Jesus transcende seus próprios pais, e isso os estimula ao crescimento na compreensão do mistério de Deus na sua vida. Eles se tornarão discípulos do próprio filho!

Dom Itacir Brassiani msf

Bispo Diocesano de Santa Cruz do Sul

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