quarta-feira, 21 de junho de 2017

ANO A – SOLENIDADE DO SAGRADO CORAÇÃO DE JESUS – 23.06.2017

Nosso Deus tem um coração, grande e compassivo.
A tentação de imaginar Deus de forma abstrata e de propor a mensagem cristã de forma estritamente doutrinal está sempre rondando os cristãos das diferentes Igrejas. A doutrina do Deus uno e trino, celebrada na festa da Trindade, pode virar uma difícil questão de matemática ou de metafísica. A boa notícia recordada pela solenidade de Corpus Christi pode descambar numa discussão polêmica, fisicista e anti-ecumênica. E, com isso, acabamos representando o mistério de Deus mediante figuras abstratas ou ameaçadoras, como o triângulo, a lei, o olho, o juiz, o rei, o chefe dos exércitos...
Precisamos superar os resquícios de imagens abstratas, parciais e distorcidas de Deus. Que consolação podemos encontrar naquela representação de Deus como um triângulo composto de linhas e ângulos absolutamente simétricos, mas carentes de pulsação e de vida? Que orientação ou estimulo pode nos vir de conceitos herméticos como união hipostática, duas pessoas em uma natureza, três pessoas em um só Deus? Por mais que sejam doutrinalmente ortodoxas, estas fórmulas não são capazes de produzir liberdade, solidariedade e vida...
A Sagrada Escritura nos apresenta a história e a imagem de um Deus vivo, que se caracteriza pela Compaixão, e é isso que a solenidade do Sagrado Coração de Jesus quer colocar em evidência. Não precisamos ter medo de reconhecer traços antropomórficos em nossas imagens de Deus. Nunca nos livraremos disso. O que precisamos evitar é a tentação de projetar na ideia de Deus elementos de uma antropologia que exclui a corporeidade, a relação, a compaixão e a solidariedade. Estes elementos mutilam nossa humanidade e distorcem nossa ideia de Deus!
A solenidade do Sagrado Coração de Jesus quer sublinhar que Deus tem um rosto humano, um coração que ama apaixonadamente a humanidade. Aliás, é pouco e insuficiente dizer que Deus nos ama: Ele é amor, e sua relação conosco só pode ser de amante para amado, de pai e mãe que recompõe as forças dos filhos cansados e levanta o ânimo dos abatidos. Um Deus que é amor não traz fardos, mas alívio, não profere sentenças condenatórias mas multiplica atos que libertam. Celebrar o coração sagrado de Jesus significa celebrar a revelação de Deus como amor, apenas amor, sempre amor.
Como filhos e filhas gerados no ventre de Deus, como gente que recebeu nos lábios o beijo e o Sopro de Deus para ser no mundo sua imagem viva, também somos chamados a conjugar o verbo amar, especialmente no modo indicativo, no presente e no futuro, e na primeira pessoa do singular e do plural. João escreve: “Se Deus nos amou assim, nós também devemos amar-nos uns aos outros... Deus é amor: quem permanece no amor permanece com Deus e Deus permanece com ele.” Quando nossas relações são sustentadas pelo amor, demonstramos que conhecemos quem é Deus!
Moisés lembra aos hebreus que a afeição de Deus por eles não é motivada pelo poder ou importância que possam ter, mas pela insignificância, não porque eles fossem bons, mas porque Deus é bom, é amor. Seu amor é causa e não consequência de nossa retidão. Deus é assim! Jesus faz questão de afirmar que Deus não se dá a conhecer aos sábios e entendidos, aos grandes e poderosos, mas aos pequeninos e humildes. E é aos cansados e fatigados que ele dirige seu convite e faz sua oferta de alívio e descanso. É isso que significa a mansidão e humildade de coração que o caracteriza e que nós invocamos.
Mais que na celebração de cultos solenes, na elaboração de doutrinas eruditas e na obediência formal a leis minuciosas, a alegria de Deus consiste em buscar e proteger as pessoas indefesas e ameaçadas e preparar para elas uma mesa farta diante dos inimigos que as perseguem sem tréguas. E isso na proporção de 1 por 99! E ele também se alegra com os homens e mulheres que, estimulados por seu jeito de ser e de amar, procuram fazer o mesmo. Este é o caminho e a proposta de Jesus, e não deveria ser outro o caminho das Igrejas e de todos aqueles que creem que Deus tem um coração. Haja coração!
Jesus de Nazaré, Coração de Deus na carne humana, Compaixão de Deus na complexidade da história! Tu nos revelaste a Misericórdia e o Amor como dinamismos que aproximam e articulam a divindade da humanidade. Traído, preso e executado na cruz, tu nos amaste até o fim e para além de todo merecimento. Do teu lado aberto pela lança, deixaste correr sangue e água, dando-nos o Espírito que te movia, para que, atraídos por teu coração, pudéssemos beber na fonte da salvação. Por isso, não cansamos de louvar teu nome e de pedir que seja teu o coração que sustenta nossa missão. Mas precisamos que permitir que teu amor nos regenere, de novo e sempre. Assim seja! Amém!

Itacir Brassiani msf
(Livro do Deuteronômio 7,6-11 * Salmo 102 (103) * Primeira Carta de São João 4,7-16 * Evangelho de São Mateus 11,25-30)

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