domingo, 28 de abril de 2024

A luz do Evangelho em nossa vida (334)

334 | Ano B | 5ª Semana da Páscoa | Segunda-feira | João 14,21-26

29/04/2024

Saltando alguns versículos que prosseguem o trecho meditado no último sábado, os quais apresentam a promessa de Jesus de enviar aos seus discípulos/as um “outro Advogado”, o “Espírito da Verdade”, este trecho afirma a presença de Deus nas relações fraternas, solidárias e servidoras dos seus discípulos e discípulas. Não somos apenas nós que podemos morar na casa de Deus; ele mesmo pode estabelecer em nós sua morada.

Esta é a primeira vez que Jesus fala do amor dos discípulos a ele. Até este momento, ele falara apenas da necessidade de amar os irmãos e irmãs, e de estar disponível às necessidades do povo. Nesta perspectiva, crer em Jesus significa aderir amorosamente a ele, comportar-se como ele, compartilhar seus sonhos, seus pensamentos e suas atitudes. Mas o amor a ele se encarna e se mostra necessariamente no amor aos irmãos e irmãs, no amor que nos torna irmãos, porque não é mero sentimento. A ação em benefício dos outros é a única forma de concretizar o amor.

Este amor só é chamado de mandamento porque é norma de vida, e fundamenta e substitui todos os demais códigos de leis. No evangelho de João, Jesus jamais cita ou enumera os dez mandamentos, pois entende que só existe um mandamento. O amor fraterno e concreto é a chave que abre a porta para que o Pai e o Filho façam em nós sua morada. Sendo o que “acomuna” o Pai e o Filho, o Espírito Santo de Amor é também o que une os discípulos entre si, a Jesus e ao Pai. Enquanto algo a ser proclamado, esse amor recebe o nome de mensagem; enquanto norma de vida, é chamado de mandamento; enquanto dinamismo de Deus em nós, é apresentado como Espírito Santo.

Jesus adverte seus discípulos e discípulas sobre o fato de que amá-lo significa guardar sua Palavra, ou sua ordem, de amarmo-nos como ele nos amou, implica em comportar-se como ele em relação a tudo e todos/as. Sendo a essência do Espírito de Deus, o amor transforma a comunidade cristã e os milhões de discípulos/as anônimos/as em infinitas vivendas mediante as quais Deus se faz presente no mundo. Não o adoramos em santuários ou templos, mas em espírito e verdade, mediante atitudes e ações muito concretas.

 

Meditação:

·    Recomponha na memória as palavras que Jesus dirige aos discípulos, depois da ceia e prestes a ser preso e crucificado

·    Situe-se junto com os discípulos, perturbados com o gesto extremo de fraternidade de Jesus expresso no lava-pés, com o anúncio da sua morte e com a previsão de que seria traído por um dos seus discípulos mais íntimos

·    Será que na voz de Judas se expressa a ideologia, ainda muito presente em nós, que espera de Jesus manifestações gloriosas e espetaculares, jamais a manifestação íntima e discreta aos discípulos e na cruz?

sábado, 27 de abril de 2024

A luz do Evangelho em nossa vida (333)

333 | Ano B | 5ª Semana da Páscoa | Domingo | João 15,1-8

28/04/2024

Jesus se compara à “verdadeira videira”. Esta videira se contrapõe e toma o lugar de uma outra videira, potencialmente falsa. E a videira não-verdadeira é Israel, no seu sentido de unidade política e religiosa, fechado em si mesmo e a serviço dos privilegiados, representada pelo “pessoal do templo”.

Como no caso da videira e dos ramos, a relação de Jesus com os/as discípulos/as é de recíproca dependência: a cepa só pode frutificar através dos ramos, e os ramos só produzem frutos se permanecerem ligados à cepa. “Fiquem unidos a mim e eu ficarei unido a vocês... Porque sem mim vocês não podem fazer nada”. Jesus conta com as nossas ações para amar e servir.

Assim como os ramos nada produzem sem a seiva que lhes vem gratuitamente da cepa, também os/as discípulos de Jesus pouco conseguimos fazer se não permanecermos ligados/as a Jesus Cristo. É uma união de atitudes fundamentais, uma identificação com seu dinamismo de amor e de dom. É na força dessa união que construímos a Justiça e a paz. Sem isso seremos ramos estéreis, que para nada servem, e devem ser cortados.

Para que produzam frutos bons e abundantes, o vínculo dos discípulos com Jesus Cristo não pode ser um dado estático, mas um processo ativo e vivo, que conhece exigências e requer decisões, um dinamismo de permanente limpeza e poda. “Os ramos que dão fruto, o Pai os poda para que deem mais frutos ainda”, diz Jesus. E a poda é sempre uma intervenção exigente.

Na videira, a prática da poda tem como objetivo eliminar os fatores de debilitação e de morte e, ao mesmo tempo, direcionar as energias para que resultem em bons e abundantes frutos. Para o/a discípulo/a, o seguimento de Jesus Cristo na ceia, no lava-pés e na cruz que leva à ressurreição é um caminho de progressiva inserção numa comunidade e de conversão do ‘eu’ para o ‘nós’.

Permanecer unido/a a Jesus Cristo não significa apenas frequentar o culto ou a missa assiduamente. Por isso, Jesus insiste que precisamos manter e aprofundar nossa adesão ao seu projeto, ao seu caminho: fazer-se próximo, não perder a vida correndo atrás de vaidades, entregá-la a serviço dos outros.

 

Meditação:

·    Recomponha na memória a bela e sugestiva alegoria, dando asas à imaginação para entender seu alcance

·    Qual é o significado e as implicações de permanecer unido a Jesus como o ramo não pode separar-se da cepa?

·    Qual é o sentido e as implicações da “poda” na videira e na vida dos discípulos e discípulas de Jesus que já produzem bons frutos?

·    E quais são as implicações do fato de que a cepa (Jesus) produz frutos unicamente nos ramos (os cristãos)?

A luz do Evangelho em nossa vida (332)

332 | Ano B | 4ª Semana da Páscoa | Sábado | João 14,7-14

27/04/2024

Esta é a Palavra do Evangelho que ilumina a nossa vida neste sábado da quarta semana do tempo pascal. Esta passagem faz parte da comovida catequese que Jesus desenvolve logo depois da ceia e do lava-pés, para orientar e confortar os discípulos, que estavam assustados. Filipe, um discípulo do grupo dos Doze, pede que Jesus lhes mostre o Pai. “Senhor, mostra-nos o Pai, e isso nos basta”!

Jesus já havia deixado claro que é nele – nas relações de amor compassivo que ele viveu e entregou-nos como mandamento – que temos acesso ao Pai, pois ele é o caminho, a verdade e a vida. Por isso, responde quase que lamentando a dificuldade de Filipe e dos demais: “Se me conheceis, conhecereis também o meu Pai. Há tanto tempo estou convosco e não me conheces? Quem me vê, vê o Pai. Crede, ao menos, por causa destas obras...”

O problema de Filipe é o mesmo problema da Igreja, o nosso problema. Custa-nos aceitar que o Deus que revestimos de infinitude e colocamos no altíssimo nos seja dado a conhecer nas ações concretas e no corpo de Jesus de Nazaré. Não é que queiramos ver mais; queremos ver outras coisas, menos concretas, mais abstratas e passíveis de manipulação; coisas mais doutrinais e menos interpeladoras, como o é lavar os pés dos/as irmã/os, alimentar os famintos, resgatar a cidadania de quem está à margem e dar a vida sem reservas.

O problema continua e se torna mais sério quando e na medida em que queremos dar a impressão de que conhecemos Jesus, e fazemos o possível para impor nossa ideia a quem crê diversamente. A tentação da qual não nos livramos facilmente é esta: fazer Jesus “vestir o figurino” que de antemão preparamos para ele, obrigá-lo a fazer aquilo que decidimos que aprendemos que ele deve fazer em nossas faculdades de teologia e gabinetes doutrinais.

Imagino Jesus dirigindo-se a nós, dizendo afirmativamente: “Há tanto tempo estou convosco e não me conheces...” Crer nele é fazer aquilo que ele faz, prosseguir sua ação libertadora, entrar no caminho da compaixão, armar a tenda dos nossos sonhos e projetos no chão da humanidade ferida e sedenta de vida. O resto é culto às vaidades que passam, serviço aos poderes que oprimem, fuga da responsabilidade que nos torna humanamente maduros/as.

 

Meditação:

·      Recomponha na memória os gestos as palavras desse diálogo de Jesus com os seus discípulos no ambiente da última ceia

·      Será que também nós partilhamos da cegueira de Filipe, e não reconhecemos Deus naquilo que Jesus faz e pede?

·      Quais são as ações de Jesus que expressam de modo mais eloquente e libertador a ação do Pai?

·      Como podemos nós, em nosso tempo, recriar esta ação de Jesus, inclusive com maior alcance e eficácia?

O Evangelho dominical (Pagola) - 28.04.2024

CONTACTO VITAL

Segundo o relato evangélico de João, na véspera da sua morte, Jesus revela aos seus discípulos o seu desejo mais profundo: «Permaneçam em mim». Conhece as suas covardias e sua mediocridade. Em muitas ocasiões recriminou-os pela sua pouca fé. Se não permanecem vitalmente unidos a ele, não poderão subsistir.

As palavras de Jesus não podem ser mais claras e expressivas: «Assim como o ramo não pode dar fruto por si mesmo, se não permanecer na videira, assim também vocês não podem dar fruto, se não permanecerem em mim». Se não se mantiverem firmes naquilo que aprenderam e viveram com ele, sua vida será estéril. Se não viverem do seu Espírito, o que foi iniciado por ele será extinto.

Jesus utiliza uma linguagem forte: «Eu sou a videira e vocês são os ramos». Nos discípulos há de correr a seiva que vem de Jesus. Os discípulos nunca devem esquecer isso. «Aquele que permanece em mim e eu nele, esse dá frutos abundantes, porque sem mim nada podeis fazer». Separados de Jesus, os discípulos não podem nada.

Jesus não só lhes pede que permaneçam nele. Diz-lhes também que as «suas palavras permanecem neles». Que não as esqueçam. Que vivam do seu Evangelho. Essa é a fonte da qual devem beber. Já lhes tinha dito em outra ocasião: «As palavras que vos disse são espírito e vida».

O Espírito do Senhor Ressuscitado permanece hoje vivo e operante na sua Igreja de múltiplas formas, mas a sua presença invisível e silenciosa adquire traços visíveis e uma voz concreta graças à memória guardada nos relatos evangélicos daqueles que o conheceram de perto e o seguiram. Nos evangelhos entramos em contato com sua mensagem, o seu estilo de vida e o seu projeto para o reino de Deus.

Por isso, nos evangelhos encontra-se a força mais poderosa que as comunidades cristãs possuem para regenerar as suas vidas. A energia que necessitamos para recuperar a nossa identidade como seguidores de Jesus. O evangelho de Jesus é o instrumento pastoral mais importante para renovar hoje a Igreja.

Muitos bons cristãos nas nossas comunidades só conhecem os evangelhos «de segunda mão», através de testemunhas Tudo o que sabem sobre Jesus e a sua mensagem provém daquilo que puderam reconstruir a partir das palavras dos pregadores e dos catequistas. Vivem a sua fé sem ter um contato pessoal com as palavras de Jesus.

É difícil imaginar uma nova evangelização sem proporcionar às pessoas um contato mais direto e imediato com os evangelhos. Nada tem mais força evangelizadora do que a experiência de escutar juntos o evangelho de Jesus a partir das perguntas, dos problemas, dos sofrimentos e das esperanças do nosso tempo.

José Antonio Pagola

Tradução de Antonio Manuel Álvarez Perez

quinta-feira, 25 de abril de 2024

A luz do Evangelho em nossa vida (331)

331 | Ano B | 4ª Semana da Páscoa | Sexta-feira | João 14,1-6

26/04/2024

Este texto está situado no contexto do lava-pés, como parte de uma catequese que desenvolve o significado desse gesto de Jesus para confortar os discípulos. Na verdade, eles ficam desconcertados e confusos com o ensino e a prática de Jesus, como também pela percepção de que traições se desenhavam entre eles.

Estava clara uma espécie de divórcio entre as expectativas de sucesso, segurança e libertação política que os discípulos alimentavam, por um lado, e a proposta de Jesus centrada na reconciliação e na fraternidade, no serviço gratuito aos mais vulneráveis, por outro. O gesto do pão e do vinho, antecipando a sua paixão e morte, e o sinal do lava-pés, afirmando a igualdade fundamental de todos diante de Deus, chega a escandalizá-los.

Neste diálogo, Jesus procura consolar e confortar aqueles/as que ele ama e que o seguem. E começa afirmando que no “lar” do Pai, de onde ele vem e para onde ele volta, existe lugar para todos/as, lugar que o próprio Jesus prepara. Mas para chegar lá, os discípulos devem leva-lo mais a sério. “Acreditem no Pai acreditando em mim”, diz Jesus, de modo imperativo. É assim que poderão ser acolhidos por Jesus na plenitude e gratuidade do amor que ele vive.

Mas, para chegar e habitar na intimidade familiar com o Pai e experimentar a vida em sua plenitude só há um caminho: o estilo de vida de Jesus, o caminho do amor sem medida, que relativiza a própria vida. Vida é a meta, o termo da caminhada. Neste caminho que é Jesus, o/a discípulo descobre a verdade sobre si mesmo/a e sobre Deus: nascemos do amor, vivemos por amor e morremos por amor. O amor está no caminho, no dinamismo de crescimento e amadurecimento, e a vida é a meta ou o resultado esperado.

O caminho, a verdade e a vida é a pessoa e o Evangelho Jesus, e não esta ou aquela religião, esta ou aquela doutrina, uma ou outra denominação cristã. Como discípulos/as, jamais poderemos relativizar a pessoa e a proposta de Jesus. Se o fizermos, estaremos caindo na mentira, perdendo-nos nas encruzilhadas, caindo prisioneiros/as da morte, fora do nosso “lar”.

 

Meditação:

·    Recomponha na memória os gestos as palavras desse diálogo de Jesus com os seus discípulos no ambiente da última ceia

·    Será que também nós perdemos a noção da meta da vida cristã (a vida plena no amor sem medidas) e, por isso, estamos confusos?

·    O que mais nos deixa perplexos e confusos, no atual momento da Igreja, do Brasil e do mundo? Ou somos indiferentes a tudo?

·    O que seria concretamente a “verdade” e a “vida” para as quais Jesus afirma ser o caminho?

·    Cremos em Deus acreditando verdadeiramente em Jesus, ou projetamos em Jesus nossas surradas ideias sobre Deus?

quarta-feira, 24 de abril de 2024

A luz do Evangelho em nossa vida (330)

330 | Ano B | Festa de São Marcos, Evangelista | Marcos 16,15-20

25/04/2024

Mesmo estando inserido no contexto da ressurreição de Jesus, o texto hoje está referido a Marcos, cristão de Jerusalém, companheiro de missão de Pedro e de Paulo e redator do segundo evangelho canônico. Propondo-nos este texto, a Igreja sugere que coloquemos Marcos, evangelista e missionário, no rol das grandes testemunhas da páscoa de Jesus, ampliando o mandato que, normalmente, é visto como restrito aos apóstolos.

Este trecho da Palavra de Deus está inserido no contexto das aparições de Jesus crucificado e ressuscitado aos discípulos/as. Trata-se da terceira manifestação, desta vez aos onze discípulos, numa refeição. Jesus começa desaprovando a falta de fé e a dureza de coração daquele grupo escolhido e ao qual Jesus dedicara uma intensa formação. Eles não haviam acreditado naqueles que lhes anunciavam que tinham visto Jesus ressuscitado.

Mesmo assim, Jesus manifesta total confiança nos discípulos, e põe na mão e nos lábios deles a missão de anunciar a Boa Notícia do Reino de Deus e de continuar sua ação própria libertadora. A universalidade dessa missão é mais que ressaltada nestes poucos versículos: eles são enviados ao mundo todo para anunciar o Evangelho de Deus a todas as criaturas. Nada nem ninguém pode ficar sem a luz do Evangelho!

Os sinais que atestarão a veracidade da missão dos discípulos missionários são os mesmos que acompanharam a missão de Jesus: eles viverão a compaixão, que impede a indiferença diante das pessoas oprimidas; libertarão as pessoas dos males que as amarram e despersonalizam; curarão as pessoas das suas enfermidades; não se acanharão e não deixarão de anunciar e construir o reino de Deus diante de qualquer ameaça ou perigo.

Tendo Jesus sido elevado ao céu e sentado à direita de Deus – em outras palavras, tendo sido reconhecido plenamente na sua divindade – Marcos diz que os discípulos partiram e pregaram o Evangelho de Jesus por toda parte, e o anúncio deles era confirmado pelos sinais que o acompanhavam. Finalmente, eles conseguem entender o significado da vida, da morte e da ressurreição de Jesus: é muitíssimo mais que esperar a ressurreição depois da morte. E eis que os discípulos medrosos se tornam missionários generosos!

 

Meditação:

·    Você sente-se pessoalmente enviado por Jesus? Enviado a quem e para anunciar qual mensagem?

·    Há algo que limita ou enfraquece o vigor da sua missão?

·    Quais são os sinais que acompanham o seu anúncio e as suas palavras sobre Jesus e o Evangelho?

·    O que a dedicação de Marcos ao Evangelho nos ensina hoje?

terça-feira, 23 de abril de 2024

A luz do Evangelho em nossa vida (329)

329 | Ano B | 4ª Semana da Páscoa | Quarta-feira | João 12,44-50

24/04/2024

Este episódio do evangelho está no contexto da festa da dedicação do templo de Embora apresentem cenas da vida de Jesus antes da morte e ressurreição, os evangelhos são totalmente pós-pascais, e precisam ser lidos nesta perspectiva. É isso que estamos fazendo desde o segundo domingo da Páscoa.  E o texto de hoje está situado no final da primeira parte do evangelho segundo João, imediatamente antes da narração da ceia e do lava-pés, cena com a qual inicia-se a narração da paixão, morte e ressurreição de Jesus.

Sobre Jesus já pesava um decreto de morte, e ele estava plenamente consciente disso. É por isso que ele andava se escondendo, mas não se furtava de dizer aquilo para o qual o Pai o havia enviado. As palavras de hoje são as últimas que Jesus pronuncia diante de todos/as os/as ouvintes, pois doravante falará apenas com seus discípulos/as e com seus perseguidores. E é a terceira vez que Jesus fala alto, gritando (como em  Jo 7,28.37). Escutemos atentamente!

Em seu discurso, Jesus sublinha que suas ações e palavras são luz, amor solidário que conduz à vida. São um caminho diametralmente oposto às trevas, que são o egoísmo doentio, que produzem opressão e levam à morte. Quem o encontra é posto numa encruzilhada, e deve escolher entre luz e trevas. Nesta oposição nada metafísica e profundamente histórica, Jesus resume sua missão, como João já o fizera no primeiro capítulo do seu evangelho.

E o que Jesus faz e ensina não é aquilo que ele gosta ou acha oportuno, mas aquilo que o Pai pede que ele diga e faça. Ele não faz nada por si mesmo, e sente-se honrado em ser enviado, em cumprir a vontade do Pai. Ele dispensa qualquer protagonismo, pois basta-lhe a plena comunhão com o Pai no ensino e na ação. Para conhecermos Deus precisamos olhar para Jesus diz e faz, renunciando às ideias preconcebidas e aos conceitos abstratos.

Ele é caminho para a vida, e salva-nos suscitando em nós a capacidade de amar como ele ama. Por isso, este é “a” ação do Pai, especialmente no gesto de repartir o pão e lavar os pés dos seus discípulos. Quem escolhe outro caminho, prepara o próprio malogro e ruína, não chega a realizar-se como ser humano.

 

Meditação:

·    Olhando para o que Jesus faz, e escutando o que ele ensina, conseguimos ver e ouvir Deus Pai?

·    Ou permanecemos com ideias preconcebidas sobre Deus e procuramos desesperadamente adequá-las a Jesus?

·    Jesus não fala aqui de mandamentos, mas de mandamento (no singular): qual é mesmo este único mandamento do Pai que se mostra em Jesus?

·    O que significa para nós, que meditamos diariamente o Evangelho, ouvir e guardar a Palavra de Jesus Cristo?

segunda-feira, 22 de abril de 2024

A luz do Evangelho em nossa vida (328)

328 | Ano B | 4ª Semana da Páscoa | terça-feira | João 10,22-30

23/04/2024

Este episódio do evangelho está no contexto da festa da dedicação do templo de Jerusalém, quando Jesus se apresenta como porta que conduz à vida e pastor que conhece seu rebanho e cujas ovelhas reconhecem e seguem sua voz. Mesmo que o templo abrigue seus maiores opositores, que já o ameaçaram com apedrejamento, Jesus passeia por ele como quem se sente em casa.

As lideranças que controlam o templo e o judaísmo veem Jesus como uma ameaça, têm a impressão que ele lhes tira o fôlego. Pouco antes do episódio de hoje, haviam dito claramente que Jesus estava louco ou possuído pelo diabo. Angustiados e irritados, elas cercam Jesus no templo, numa clara demonstração de ameaça. E o desafiam a apresentar-se claramente como Messias, não para que acreditassem, mas para terem motivo para condená-lo.

O vazio de poder aberto pela espera indefinida de um messias havia sido ocupado por estas lideranças, membros das famílias nobres e empoderadas, e elas temem perder o poder. Jesus havia dito que tais pessoas eram cegas por opção, não fazem parte do seu rebanho, não reconhecem nele a voz e a mão de Deus, servem e seguem a mercenários. Orgulham-se de ser descendentes de Abraão e defensores da Lei de Moisés, mas o são apenas da boca para fora.

Jesus percebe a artimanha deles e, como já fizera em várias oportunidades, foge de uma discussão teórica e estéril sobre o Messias. Jesus prefere invocar o testemunho das suas ações de afirmação da dignidade e restauração da liberdade das pessoas, e os chama a tomar posição. São suas obras que testemunham se ele está com Deus ou não, se Deus está com ele ou não. Assumir a defesa do ser humano humilhado significa estar com Deus. Mas as lideranças do templo são cegas, não querem ver.

A conclusão da cena é dramática. Jesus adverte as lideranças a não tentarem recuperar o controle que perderam sobre parte do povo. Aqueles/as que o reconhecem e seguem como Pastor Bom acessaram a vida plena, e ninguém vai arrancá-los das suas mãos, pois o Pai não o permitirá. Jesus diz que ele e o Pai são um, e, diante disso, as lideranças reagem ameaçando apedrejá-lo.

 

Meditação:

·    Fazemos parte do rebanho de Jesus Cristo, daqueles/as que ouvem e seguem a sua voz e continuam seu estilo de vida?

·    Reconhecemos a mão de Deus nas ações humanizadora e libertadoras de Jesus e de todos/as os/as que fazem o bem?

·    Como demonstramos isso? Nosso modo de ser testemunha claramente nossa pertença ao caminho ou “movimento” de Jesus?

·    Somos capazes de demonstrar nossa pertença a Jesus colocando-nos ao lado do ser humano ameaçado?

domingo, 21 de abril de 2024

A luz do Evangelho em nossa vida (327)

327 | Ano B | 4ª Semana da Páscoa | Segunda-feira | João 10,1-10

22/04/2024

Jesus entra em nossa casa e nos conduz para fora. O Bom Pastor não quer isolar seu rebanho dentro de um redil e conservá-lo seguro, mesmo que este redil se chame Igreja. Ele não quer reduzir a vida dos/as discípulos/as ao ambiente doméstico, indiferente ao mundo exterior. Ele chama pelo nome e conduz aqueles/as que o ouvem para fora de si mesmos e para fora de um sistema que anestesia e, ao mesmo tempo, separa, hierarquiza e aprisiona as pessoas.

Jesus, o Bom Pastor, chama pelo nome e manda sair às periferias. Neste percurso, ele mesmo caminha à nossa frente, livre e solidário, cordeiro e pastor. Ele não considera suficiente despertar os homens e mulheres, e mostrar-lhes um caminho. Ele se faz caminho e companheiro de caminhada, um pouco à frente para dissipar medos e incertezas, mas sempre próximo para curar as feridas e fortalecer nos tropeços. No fim, ele é porta aberta em forma de cruz, passagem-páscoa para a liberdade, seta que aponta para um outro mundo possível. O importante é reconhecer sua voz que nos chama pelo nome e nos convida a sair.

Além de manter uma relação personalizada com cada pessoa, Jesus também reúne um rebanho, uma comunidade, uma coletividade. Àqueles que ele congrega, também aponta um caminho de saída, um estilo de vida comunitário, solidário. Somos ovelhas do seu rebanho, membros de um povo solidário. Recebemos o bônus e o ônus de estarmos ligados a um povo e a um mundo que caminha para a liberdade tropeçando nos próprios pés, mas que também mantém o olhar fixo naquele que vai à sua frente.

O sonho de Deus é ver a vida florescendo em todas as dimensões e para todos os seus filhos e filhas. Não se trata de uma vida miúda, apertada e resignada, mas de uma vida abundante, transbordante. A festa da vida não pode ser reservada a uma meia dúzia de privilegiados/as. É entrando e saindo do redil de Jesus, vivendo nossa vida como dom, que encontramos pastagem. É na ousadia de ir além dos limites e muros erguidos por ideologias mesquinhas que encontraremos o alimento que sustenta esta vida tão sonhada.

 

Meditação:

·    Recomponha na memória as principais comparações desta polêmica pregação de Jesus contra as lideranças

·    Como a imagem da porta pode nos ajudar a entender a identidade e a missão da comunidade cristã e da Igreja de hoje?

·    Nossas comunidades e Igrejas se parecem mais com portas abertas, que ajudam a entrar e sair, ou com redis ou currais fechados?

·    Em tempos de indiferença doentia e de proliferação de Igrejas, o que significa entrar por Jesus, sair e encontrar pastagem?

·    Num contexto de crescente distância entre ricos e pobres, como e através de quem Jesus concede vida abundante a todos/as?

sábado, 20 de abril de 2024

A luz do Evangelho em nossa vida (326)

326 | Ano B | 4ª Semana da Páscoa | Domingo | João 10,11-18

21/04/2024

Uma das mais belas imagens que o povo de Israel usou para falar de Deus e da sua relação conosco é a metáfora do pastor. Essa imagem, visualizada pelo antigo povo de Israel na sua expectativa de um Messias, também nos ajuda a compreender uma faceta de Jesus Cristo. Sua vida é uma cotidiana realização do amor pastoral, da missão entendida como ação de pastoreio.

Senão vejamos: ele tem compaixão das multidões porque estão cansadas e abatidas, como ovelhas sem pastor (Mt 9,35-36); ele procura as ovelhas dispersas e em situação de risco, como as mulheres, os doentes e pecadores marginalizados (Mt 18,12-14); ele festeja o reencontro, e diz que é maior sua alegria por um marginalizado resgatado que por noventa e nove que se consideram perfeitos (Lc 15,3-7).

No evangelho de hoje, apresentando-nos Jesus como bom pastor, João tem presente sua vida e suas ações concretas. Jesus é bom e excelente como o vinho abundante servido nas bodas de Caná. Ele é bom e porque não é mercenário: não foge nem esmorece diante das perseguições, mas arrisca sua vida para que os mais fracos tenham plenas condições de vida.

Mas ele é o Pastor bom e excelente também porque estabelece um relacionamento próximo e personalizado com seu povo, bem diferente de um herói ou benfeitor distante, incapaz de se misturar com as pessoas comuns. Jesus é o Bom Pastor porque conhece cada pessoa pelo nome, por mais simples que seja. Ele ouve seus clamores e conhece seus sofrimentos, desce para defendê-las e fazê-las subir (cf. Ex 3,7-10).

Jesus, o Pastor Bom e Filho do Homem, não veio nem vive para fundar uma instituição, mas para reunir as pessoas dispersas. É o pastor bom e exemplar porque não se orienta por fanatismos exclusivistas, não se detém nas cercas ou muros religiosos, nacionais, étnicos ou de classe... “Tenho também outras ovelhas que não são deste curral. Também a elas devo conduzir. Elas ouvirão a minha voz e haver um só rebanho e um só pastor”, diz ele sem rodeios.

 

Meditação:

·      Recomponha na memória as principais frases desta polêmica pregação de Jesus contra as lideranças religiosas e políticas

·      Como podemos distinguir hoje a diferença entre as lideranças mercenárias e as autênticas, como o Bom Pastor?

·      Como cristãos e seguidores/as de Jesus, conhecemos realmente sua Voz, sua Palavra, em meio a tantos ensinos e lições diversas?

·      Quais são hoje, em nosso meio, as “outras ovelhas, que não deste curral”, e que Jesus conduz e ouvem sua voz?

·      Em relação à sua família, sua comunidade e sua cidade: suas atitudes são como aquelas do Pastor Bom?

O Evangelho dominical (Pagola) - 21.04.2024

 ELE CAMINHA CONOSCO

O símbolo de Jesus como bom pastor produz hoje um certo desconforto e cansaço em alguns cristãos. Não queremos ser tratados como ovelhas num rebanho. Não precisamos de ninguém que nos governe e controle a nossa vida. Queremos ser respeitados. Não necessitamos de nenhum pastor.

Não sentiam assim os primeiros cristãos. A figura de Jesus, bom pastor, converteu-se rapidamente na imagem mais querida de Jesus. Já nas catacumbas de Roma, Jesus é representado carregando sobre os ombros a ovelha perdida. Ninguém pensava em Jesus como um pastor autoritário, dedicado a vigiar e controlar os seus seguidores, mas como um bom pastor que cuida das suas ovelhas.

O «bom pastor» preocupa-se com as suas ovelhas. É a sua primeira característica. Não as abandona nunca. Não as esquece. Vive pendente delas. Está sempre atento às mais fracas ou doentes. Não é como o pastor mercenário que, quando vê algum perigo, foge para salvar a vida, abandonando o rebanho: não se preocupa com as ovelhas.

Jesus deixou uma memória inesquecível. Os relatos evangélicos descrevem-no preocupado com os doentes, os marginalizados, os pequenos, os mais indefesos e esquecidos, os mais perdidos. Não parece preocupar-se consigo mesmo. Sempre o vemos pensando nos outros. Preocupam-no sobretudo as pessoas mais desamparadas.

Mas há algo mais. «O bom pastor dá a vida pelas suas ovelhas». É a segunda característica. O evangelho de João repete cinco vezes esta expressão. O amor de Jesus pelas pessoas não tem limites. Ele ama os outros mais do que a si mesmo. Ama a todos com o amor de um bom pastor, que não foge do perigo, mas dá a vida para salvar o rebanho.

Por isso, a imagem de Jesus, «bom pastor», converteu-se rapidamente numa mensagem de conforto e confiança para os seus seguidores. Os cristãos aprenderam a dirigir-se a Jesus com palavras tomadas de Salmo 22: «O Senhor é o meu pastor, nada me falta. Ainda que caminhe pelo vale da sombra da morte, nada temo, porque tu estás comigo. A Tua bondade e a Tua misericórdia acompanham-me todos os dias da minha vida».

Os cristãos vivemos com frequência uma relação bastante pobre com Jesus. Necessitamos conhecer uma experiência mais viva e cativante. Não acreditamos que ele cuide de nós. Esquecemos que podemos recorrer a ele quando nos sentimos cansados e sem forças, ou perdidos e desorientados.

Uma Igreja formada por cristãos que se relacionam com um Jesus pouco conhecido, confessado apenas doutrinariamente, um Jesus distante cuja voz não se escuta bem nas comunidades, corre o risco de esquecer o seu Pastor. Mas quem cuidará da Igreja senão o seu Pastor?

José Antonio Pagola

Tradução de Antonio Manuel Álvarez Perez

sexta-feira, 19 de abril de 2024

A luz do Evangelho na vida de cada dia (325)

325 | Ano B | 3ª Semana da Páscoa | Sábado | João 6,60-69

20/04/2024

Tornou-se recorrente reduzir o “diálogo catequético” de Jesus, que meditamos durante toda a semana que está terminando, a uma inofensiva e evasiva doutrina sobre a eucaristia. O trecho de hoje, que é o desfecho desse diálogo, não deixa dúvidas sobre seu caráter profético, exigente e provocador do ensino de Jesus, tanto que faz os discípulos desabafarem: “Estas Palavras são duras demais! Quem poderá continuar ouvindo isso?” Alguém reagiria assim diante de uma simples catequese “espiritual” sobre a Eucaristia?

A reação de Jesus não é adocicar seu anúncio para não perder ouvintes e seguidores. Frente aos discípulos que acham seu ensino insuportável, murmuram escandalizados, que só conseguem esperar de Jesus sucesso e triunfo, que conseguem apenas entender sinais de poder, que se rebelam e pensam em desertar, Jesus reage com mais uma provocação frontal: “Entre vós há alguns que não creem... Vós também não quereis ir embora?”

Parece que Jesus prefere ficar sozinho a contar com discípulos pela metade, mais firmes em suas próprias ambições e medos que na proposta de Jesus, centrada no dom solidário de si mesmo pela vida do mundo. Entre os Doze há quem não seja fiel na adesão a Jesus e na amizade com ele, é inimigo e causador de divisão e não consegue se afastar de um projeto contrário ao de Jesus.

Os Doze, representados por Pedro, intuem que, por mais duras que sejam as palavras, e por mais exigente que seja o caminho proposto por Jesus, não há vida que valha a pena longe ou fora dele: “A quem iremos, Senhor? Tu tens palavras de vida eterna. Nós cremos firmemente e reconhecemos que tu és o Santo de Deus”. Mesmo cercados de dúvidas, eles percebem o que é essencial.

Se antes Jesus se dirigia às multidões e aos líderes dos judeus, agora dirige-se aos discípulos. Na verdade, todo a catequese é dirigida virtualmente a eles, desde a convocação a ajudar a saciar a fome da multidão até a provocação a tomar a decisão radical de ficar com ele ou deixá-lo. Apesar da resposta firme dada na voz de Pedro, eles tropeçarão, cairão e recomeçarão. Como nós!

 

Meditação:

·    Recomponha na memória este trecho final da catequese pascal que Jesus desenvolve para a multidão, mas com ênfase aos discípulos

·    Será que a assimilação profunda e integral da proposta e do caminho de Jesus também não deveria nos deixar preocupados/as?

·    O que pensar de pessoas que dedicam horas e horas à adoração eucarística, mas mostram total indiferença diante do próximo?

·    O que nos mantém firmes no caminho de assimilação da proposta de Jesus e impede que abandonemos seu barco?

·    Qual é a “palavra”, gesto ou ensinamento de Jesus que, para você, tem mais sabor e dinamismo de vida plena?