quarta-feira, 24 de abril de 2024

A luz do Evangelho em nossa vida (330)

330 | Ano B | Festa de São Marcos, Evangelista | Marcos 16,15-20

25/04/2024

Mesmo estando inserido no contexto da ressurreição de Jesus, o texto hoje está referido a Marcos, cristão de Jerusalém, companheiro de missão de Pedro e de Paulo e redator do segundo evangelho canônico. Propondo-nos este texto, a Igreja sugere que coloquemos Marcos, evangelista e missionário, no rol das grandes testemunhas da páscoa de Jesus, ampliando o mandato que, normalmente, é visto como restrito aos apóstolos.

Este trecho da Palavra de Deus está inserido no contexto das aparições de Jesus crucificado e ressuscitado aos discípulos/as. Trata-se da terceira manifestação, desta vez aos onze discípulos, numa refeição. Jesus começa desaprovando a falta de fé e a dureza de coração daquele grupo escolhido e ao qual Jesus dedicara uma intensa formação. Eles não haviam acreditado naqueles que lhes anunciavam que tinham visto Jesus ressuscitado.

Mesmo assim, Jesus manifesta total confiança nos discípulos, e põe na mão e nos lábios deles a missão de anunciar a Boa Notícia do Reino de Deus e de continuar sua ação própria libertadora. A universalidade dessa missão é mais que ressaltada nestes poucos versículos: eles são enviados ao mundo todo para anunciar o Evangelho de Deus a todas as criaturas. Nada nem ninguém pode ficar sem a luz do Evangelho!

Os sinais que atestarão a veracidade da missão dos discípulos missionários são os mesmos que acompanharam a missão de Jesus: eles viverão a compaixão, que impede a indiferença diante das pessoas oprimidas; libertarão as pessoas dos males que as amarram e despersonalizam; curarão as pessoas das suas enfermidades; não se acanharão e não deixarão de anunciar e construir o reino de Deus diante de qualquer ameaça ou perigo.

Tendo Jesus sido elevado ao céu e sentado à direita de Deus – em outras palavras, tendo sido reconhecido plenamente na sua divindade – Marcos diz que os discípulos partiram e pregaram o Evangelho de Jesus por toda parte, e o anúncio deles era confirmado pelos sinais que o acompanhavam. Finalmente, eles conseguem entender o significado da vida, da morte e da ressurreição de Jesus: é muitíssimo mais que esperar a ressurreição depois da morte. E eis que os discípulos medrosos se tornam missionários generosos!

 

Meditação:

·    Você sente-se pessoalmente enviado por Jesus? Enviado a quem e para anunciar qual mensagem?

·    Há algo que limita ou enfraquece o vigor da sua missão?

·    Quais são os sinais que acompanham o seu anúncio e as suas palavras sobre Jesus e o Evangelho?

·    O que a dedicação de Marcos ao Evangelho nos ensina hoje?

terça-feira, 23 de abril de 2024

A luz do Evangelho em nossa vida (329)

329 | Ano B | 4ª Semana da Páscoa | Quarta-feira | João 12,44-50

24/04/2024

Este episódio do evangelho está no contexto da festa da dedicação do templo de Embora apresentem cenas da vida de Jesus antes da morte e ressurreição, os evangelhos são totalmente pós-pascais, e precisam ser lidos nesta perspectiva. É isso que estamos fazendo desde o segundo domingo da Páscoa.  E o texto de hoje está situado no final da primeira parte do evangelho segundo João, imediatamente antes da narração da ceia e do lava-pés, cena com a qual inicia-se a narração da paixão, morte e ressurreição de Jesus.

Sobre Jesus já pesava um decreto de morte, e ele estava plenamente consciente disso. É por isso que ele andava se escondendo, mas não se furtava de dizer aquilo para o qual o Pai o havia enviado. As palavras de hoje são as últimas que Jesus pronuncia diante de todos/as os/as ouvintes, pois doravante falará apenas com seus discípulos/as e com seus perseguidores. E é a terceira vez que Jesus fala alto, gritando (como em  Jo 7,28.37). Escutemos atentamente!

Em seu discurso, Jesus sublinha que suas ações e palavras são luz, amor solidário que conduz à vida. São um caminho diametralmente oposto às trevas, que são o egoísmo doentio, que produzem opressão e levam à morte. Quem o encontra é posto numa encruzilhada, e deve escolher entre luz e trevas. Nesta oposição nada metafísica e profundamente histórica, Jesus resume sua missão, como João já o fizera no primeiro capítulo do seu evangelho.

E o que Jesus faz e ensina não é aquilo que ele gosta ou acha oportuno, mas aquilo que o Pai pede que ele diga e faça. Ele não faz nada por si mesmo, e sente-se honrado em ser enviado, em cumprir a vontade do Pai. Ele dispensa qualquer protagonismo, pois basta-lhe a plena comunhão com o Pai no ensino e na ação. Para conhecermos Deus precisamos olhar para Jesus diz e faz, renunciando às ideias preconcebidas e aos conceitos abstratos.

Ele é caminho para a vida, e salva-nos suscitando em nós a capacidade de amar como ele ama. Por isso, este é “a” ação do Pai, especialmente no gesto de repartir o pão e lavar os pés dos seus discípulos. Quem escolhe outro caminho, prepara o próprio malogro e ruína, não chega a realizar-se como ser humano.

 

Meditação:

·    Olhando para o que Jesus faz, e escutando o que ele ensina, conseguimos ver e ouvir Deus Pai?

·    Ou permanecemos com ideias preconcebidas sobre Deus e procuramos desesperadamente adequá-las a Jesus?

·    Jesus não fala aqui de mandamentos, mas de mandamento (no singular): qual é mesmo este único mandamento do Pai que se mostra em Jesus?

·    O que significa para nós, que meditamos diariamente o Evangelho, ouvir e guardar a Palavra de Jesus Cristo?

segunda-feira, 22 de abril de 2024

A luz do Evangelho em nossa vida (328)

328 | Ano B | 4ª Semana da Páscoa | terça-feira | João 10,22-30

23/04/2024

Este episódio do evangelho está no contexto da festa da dedicação do templo de Jerusalém, quando Jesus se apresenta como porta que conduz à vida e pastor que conhece seu rebanho e cujas ovelhas reconhecem e seguem sua voz. Mesmo que o templo abrigue seus maiores opositores, que já o ameaçaram com apedrejamento, Jesus passeia por ele como quem se sente em casa.

As lideranças que controlam o templo e o judaísmo veem Jesus como uma ameaça, têm a impressão que ele lhes tira o fôlego. Pouco antes do episódio de hoje, haviam dito claramente que Jesus estava louco ou possuído pelo diabo. Angustiados e irritados, elas cercam Jesus no templo, numa clara demonstração de ameaça. E o desafiam a apresentar-se claramente como Messias, não para que acreditassem, mas para terem motivo para condená-lo.

O vazio de poder aberto pela espera indefinida de um messias havia sido ocupado por estas lideranças, membros das famílias nobres e empoderadas, e elas temem perder o poder. Jesus havia dito que tais pessoas eram cegas por opção, não fazem parte do seu rebanho, não reconhecem nele a voz e a mão de Deus, servem e seguem a mercenários. Orgulham-se de ser descendentes de Abraão e defensores da Lei de Moisés, mas o são apenas da boca para fora.

Jesus percebe a artimanha deles e, como já fizera em várias oportunidades, foge de uma discussão teórica e estéril sobre o Messias. Jesus prefere invocar o testemunho das suas ações de afirmação da dignidade e restauração da liberdade das pessoas, e os chama a tomar posição. São suas obras que testemunham se ele está com Deus ou não, se Deus está com ele ou não. Assumir a defesa do ser humano humilhado significa estar com Deus. Mas as lideranças do templo são cegas, não querem ver.

A conclusão da cena é dramática. Jesus adverte as lideranças a não tentarem recuperar o controle que perderam sobre parte do povo. Aqueles/as que o reconhecem e seguem como Pastor Bom acessaram a vida plena, e ninguém vai arrancá-los das suas mãos, pois o Pai não o permitirá. Jesus diz que ele e o Pai são um, e, diante disso, as lideranças reagem ameaçando apedrejá-lo.

 

Meditação:

·    Fazemos parte do rebanho de Jesus Cristo, daqueles/as que ouvem e seguem a sua voz e continuam seu estilo de vida?

·    Reconhecemos a mão de Deus nas ações humanizadora e libertadoras de Jesus e de todos/as os/as que fazem o bem?

·    Como demonstramos isso? Nosso modo de ser testemunha claramente nossa pertença ao caminho ou “movimento” de Jesus?

·    Somos capazes de demonstrar nossa pertença a Jesus colocando-nos ao lado do ser humano ameaçado?

domingo, 21 de abril de 2024

A luz do Evangelho em nossa vida (327)

327 | Ano B | 4ª Semana da Páscoa | Segunda-feira | João 10,1-10

22/04/2024

Jesus entra em nossa casa e nos conduz para fora. O Bom Pastor não quer isolar seu rebanho dentro de um redil e conservá-lo seguro, mesmo que este redil se chame Igreja. Ele não quer reduzir a vida dos/as discípulos/as ao ambiente doméstico, indiferente ao mundo exterior. Ele chama pelo nome e conduz aqueles/as que o ouvem para fora de si mesmos e para fora de um sistema que anestesia e, ao mesmo tempo, separa, hierarquiza e aprisiona as pessoas.

Jesus, o Bom Pastor, chama pelo nome e manda sair às periferias. Neste percurso, ele mesmo caminha à nossa frente, livre e solidário, cordeiro e pastor. Ele não considera suficiente despertar os homens e mulheres, e mostrar-lhes um caminho. Ele se faz caminho e companheiro de caminhada, um pouco à frente para dissipar medos e incertezas, mas sempre próximo para curar as feridas e fortalecer nos tropeços. No fim, ele é porta aberta em forma de cruz, passagem-páscoa para a liberdade, seta que aponta para um outro mundo possível. O importante é reconhecer sua voz que nos chama pelo nome e nos convida a sair.

Além de manter uma relação personalizada com cada pessoa, Jesus também reúne um rebanho, uma comunidade, uma coletividade. Àqueles que ele congrega, também aponta um caminho de saída, um estilo de vida comunitário, solidário. Somos ovelhas do seu rebanho, membros de um povo solidário. Recebemos o bônus e o ônus de estarmos ligados a um povo e a um mundo que caminha para a liberdade tropeçando nos próprios pés, mas que também mantém o olhar fixo naquele que vai à sua frente.

O sonho de Deus é ver a vida florescendo em todas as dimensões e para todos os seus filhos e filhas. Não se trata de uma vida miúda, apertada e resignada, mas de uma vida abundante, transbordante. A festa da vida não pode ser reservada a uma meia dúzia de privilegiados/as. É entrando e saindo do redil de Jesus, vivendo nossa vida como dom, que encontramos pastagem. É na ousadia de ir além dos limites e muros erguidos por ideologias mesquinhas que encontraremos o alimento que sustenta esta vida tão sonhada.

 

Meditação:

·    Recomponha na memória as principais comparações desta polêmica pregação de Jesus contra as lideranças

·    Como a imagem da porta pode nos ajudar a entender a identidade e a missão da comunidade cristã e da Igreja de hoje?

·    Nossas comunidades e Igrejas se parecem mais com portas abertas, que ajudam a entrar e sair, ou com redis ou currais fechados?

·    Em tempos de indiferença doentia e de proliferação de Igrejas, o que significa entrar por Jesus, sair e encontrar pastagem?

·    Num contexto de crescente distância entre ricos e pobres, como e através de quem Jesus concede vida abundante a todos/as?

sábado, 20 de abril de 2024

A luz do Evangelho em nossa vida (326)

326 | Ano B | 4ª Semana da Páscoa | Domingo | João 10,11-18

21/04/2024

Uma das mais belas imagens que o povo de Israel usou para falar de Deus e da sua relação conosco é a metáfora do pastor. Essa imagem, visualizada pelo antigo povo de Israel na sua expectativa de um Messias, também nos ajuda a compreender uma faceta de Jesus Cristo. Sua vida é uma cotidiana realização do amor pastoral, da missão entendida como ação de pastoreio.

Senão vejamos: ele tem compaixão das multidões porque estão cansadas e abatidas, como ovelhas sem pastor (Mt 9,35-36); ele procura as ovelhas dispersas e em situação de risco, como as mulheres, os doentes e pecadores marginalizados (Mt 18,12-14); ele festeja o reencontro, e diz que é maior sua alegria por um marginalizado resgatado que por noventa e nove que se consideram perfeitos (Lc 15,3-7).

No evangelho de hoje, apresentando-nos Jesus como bom pastor, João tem presente sua vida e suas ações concretas. Jesus é bom e excelente como o vinho abundante servido nas bodas de Caná. Ele é bom e porque não é mercenário: não foge nem esmorece diante das perseguições, mas arrisca sua vida para que os mais fracos tenham plenas condições de vida.

Mas ele é o Pastor bom e excelente também porque estabelece um relacionamento próximo e personalizado com seu povo, bem diferente de um herói ou benfeitor distante, incapaz de se misturar com as pessoas comuns. Jesus é o Bom Pastor porque conhece cada pessoa pelo nome, por mais simples que seja. Ele ouve seus clamores e conhece seus sofrimentos, desce para defendê-las e fazê-las subir (cf. Ex 3,7-10).

Jesus, o Pastor Bom e Filho do Homem, não veio nem vive para fundar uma instituição, mas para reunir as pessoas dispersas. É o pastor bom e exemplar porque não se orienta por fanatismos exclusivistas, não se detém nas cercas ou muros religiosos, nacionais, étnicos ou de classe... “Tenho também outras ovelhas que não são deste curral. Também a elas devo conduzir. Elas ouvirão a minha voz e haver um só rebanho e um só pastor”, diz ele sem rodeios.

 

Meditação:

·      Recomponha na memória as principais frases desta polêmica pregação de Jesus contra as lideranças religiosas e políticas

·      Como podemos distinguir hoje a diferença entre as lideranças mercenárias e as autênticas, como o Bom Pastor?

·      Como cristãos e seguidores/as de Jesus, conhecemos realmente sua Voz, sua Palavra, em meio a tantos ensinos e lições diversas?

·      Quais são hoje, em nosso meio, as “outras ovelhas, que não deste curral”, e que Jesus conduz e ouvem sua voz?

·      Em relação à sua família, sua comunidade e sua cidade: suas atitudes são como aquelas do Pastor Bom?

O Evangelho dominical (Pagola) - 21.04.2024

 ELE CAMINHA CONOSCO

O símbolo de Jesus como bom pastor produz hoje um certo desconforto e cansaço em alguns cristãos. Não queremos ser tratados como ovelhas num rebanho. Não precisamos de ninguém que nos governe e controle a nossa vida. Queremos ser respeitados. Não necessitamos de nenhum pastor.

Não sentiam assim os primeiros cristãos. A figura de Jesus, bom pastor, converteu-se rapidamente na imagem mais querida de Jesus. Já nas catacumbas de Roma, Jesus é representado carregando sobre os ombros a ovelha perdida. Ninguém pensava em Jesus como um pastor autoritário, dedicado a vigiar e controlar os seus seguidores, mas como um bom pastor que cuida das suas ovelhas.

O «bom pastor» preocupa-se com as suas ovelhas. É a sua primeira característica. Não as abandona nunca. Não as esquece. Vive pendente delas. Está sempre atento às mais fracas ou doentes. Não é como o pastor mercenário que, quando vê algum perigo, foge para salvar a vida, abandonando o rebanho: não se preocupa com as ovelhas.

Jesus deixou uma memória inesquecível. Os relatos evangélicos descrevem-no preocupado com os doentes, os marginalizados, os pequenos, os mais indefesos e esquecidos, os mais perdidos. Não parece preocupar-se consigo mesmo. Sempre o vemos pensando nos outros. Preocupam-no sobretudo as pessoas mais desamparadas.

Mas há algo mais. «O bom pastor dá a vida pelas suas ovelhas». É a segunda característica. O evangelho de João repete cinco vezes esta expressão. O amor de Jesus pelas pessoas não tem limites. Ele ama os outros mais do que a si mesmo. Ama a todos com o amor de um bom pastor, que não foge do perigo, mas dá a vida para salvar o rebanho.

Por isso, a imagem de Jesus, «bom pastor», converteu-se rapidamente numa mensagem de conforto e confiança para os seus seguidores. Os cristãos aprenderam a dirigir-se a Jesus com palavras tomadas de Salmo 22: «O Senhor é o meu pastor, nada me falta. Ainda que caminhe pelo vale da sombra da morte, nada temo, porque tu estás comigo. A Tua bondade e a Tua misericórdia acompanham-me todos os dias da minha vida».

Os cristãos vivemos com frequência uma relação bastante pobre com Jesus. Necessitamos conhecer uma experiência mais viva e cativante. Não acreditamos que ele cuide de nós. Esquecemos que podemos recorrer a ele quando nos sentimos cansados e sem forças, ou perdidos e desorientados.

Uma Igreja formada por cristãos que se relacionam com um Jesus pouco conhecido, confessado apenas doutrinariamente, um Jesus distante cuja voz não se escuta bem nas comunidades, corre o risco de esquecer o seu Pastor. Mas quem cuidará da Igreja senão o seu Pastor?

José Antonio Pagola

Tradução de Antonio Manuel Álvarez Perez

sexta-feira, 19 de abril de 2024

A luz do Evangelho na vida de cada dia (325)

325 | Ano B | 3ª Semana da Páscoa | Sábado | João 6,60-69

20/04/2024

Tornou-se recorrente reduzir o “diálogo catequético” de Jesus, que meditamos durante toda a semana que está terminando, a uma inofensiva e evasiva doutrina sobre a eucaristia. O trecho de hoje, que é o desfecho desse diálogo, não deixa dúvidas sobre seu caráter profético, exigente e provocador do ensino de Jesus, tanto que faz os discípulos desabafarem: “Estas Palavras são duras demais! Quem poderá continuar ouvindo isso?” Alguém reagiria assim diante de uma simples catequese “espiritual” sobre a Eucaristia?

A reação de Jesus não é adocicar seu anúncio para não perder ouvintes e seguidores. Frente aos discípulos que acham seu ensino insuportável, murmuram escandalizados, que só conseguem esperar de Jesus sucesso e triunfo, que conseguem apenas entender sinais de poder, que se rebelam e pensam em desertar, Jesus reage com mais uma provocação frontal: “Entre vós há alguns que não creem... Vós também não quereis ir embora?”

Parece que Jesus prefere ficar sozinho a contar com discípulos pela metade, mais firmes em suas próprias ambições e medos que na proposta de Jesus, centrada no dom solidário de si mesmo pela vida do mundo. Entre os Doze há quem não seja fiel na adesão a Jesus e na amizade com ele, é inimigo e causador de divisão e não consegue se afastar de um projeto contrário ao de Jesus.

Os Doze, representados por Pedro, intuem que, por mais duras que sejam as palavras, e por mais exigente que seja o caminho proposto por Jesus, não há vida que valha a pena longe ou fora dele: “A quem iremos, Senhor? Tu tens palavras de vida eterna. Nós cremos firmemente e reconhecemos que tu és o Santo de Deus”. Mesmo cercados de dúvidas, eles percebem o que é essencial.

Se antes Jesus se dirigia às multidões e aos líderes dos judeus, agora dirige-se aos discípulos. Na verdade, todo a catequese é dirigida virtualmente a eles, desde a convocação a ajudar a saciar a fome da multidão até a provocação a tomar a decisão radical de ficar com ele ou deixá-lo. Apesar da resposta firme dada na voz de Pedro, eles tropeçarão, cairão e recomeçarão. Como nós!

 

Meditação:

·    Recomponha na memória este trecho final da catequese pascal que Jesus desenvolve para a multidão, mas com ênfase aos discípulos

·    Será que a assimilação profunda e integral da proposta e do caminho de Jesus também não deveria nos deixar preocupados/as?

·    O que pensar de pessoas que dedicam horas e horas à adoração eucarística, mas mostram total indiferença diante do próximo?

·    O que nos mantém firmes no caminho de assimilação da proposta de Jesus e impede que abandonemos seu barco?

·    Qual é a “palavra”, gesto ou ensinamento de Jesus que, para você, tem mais sabor e dinamismo de vida plena?

quinta-feira, 18 de abril de 2024

A luz do Evangelho em nossa vida (324)

324 | Ano B | 3ª Semana da Páscoa | Sexta-feira | João 6,52-59

19/04/2024

Neste penúltimo trecho da “catequese” que Jesus após o sinal da multiplicação dos pães e dos peixes, a discussão se concentra na vulnerabilidade da condição humana de Jesus (sua “carne” e seu “sangue”). No centro da polêmica está a questão do caminho que assegura a vida plena: este caminho é a Lei (o ditado de Deus) ou a pessoa humana concreta e frágil de Jesus (o enviado do Pai)?

O judaísmo chamava “Lei” ao conjunto de valores e práticas (atitudes, mandamentos e proibições) que garantiam que uma pessoa fosse boa, ou seja, garantiam a salvação. É o que hoje chamamos de ideologia: conjunto de fins e meios, valores e práticas que nos torna “pessoas de bem”, diferentes e melhores que os outros. Hoje, são leis como “cada um pra si”; “quem pode mais chora menos”; “direitos humanos são para os humanos direitos”; e assim por diante.

Os líderes do judaísmo consideraram incompreensível e inaceitável que Jesus Cristo, em sua concretude e humana fragilidade (“carne e sangue”) pudesse ser o caminho para o bem-viver, para ser agradável a Deus. Para eles, não existia outro caminho senão o poder, a separação, a supremacia de uns sobre outros, a distância em relação àqueles “que não rezam pela cartilha deles”.

Jesus, por sua parte, insiste que não há caminho para a vida abundante que não passe pela assimilação daquela compaixão que o faz irmão e servidor da humanidade, especialmente das pessoas excluídas, a ponto de dar a própria vida. Isso fica claro na expressão “carne e sangue”, que Jesus repete quatro vezes. É na sua paixão e morte que ele dá seu corpo e sangue e se torna pão para a vida do mundo. Salva-se quem assimila sua humanidade.

Assim, Jesus de Nazaré, o Enviado do Pai para dar vida ao mundo, o Filho do Homem que demonstra em sinais a compaixão de Deus especialmente pelas pessoas e grupos mais oprimidos e sofredores, assume e supera o Antigo Testamento, mostra que a Lei caducou. O amor incondicional de Jesus, assimilado por seus discípulos, é o que dá vida ao mundo. Quem come deste “pão”, viverá eternamente, e saciará a fome e a sede da humanidade.

 

Meditação:

·    Recomponha na memória este trecho da catequese pascal que Jesus desenvolve para a multidão que o procura

·    O que significa a insistência de Jesus, que fala quatro vezes em “comer” sua carne e “beber” seu sangue?

·    Será que não nos enganamos ainda hoje, pensando que o que nos salva é o “poder” de Jesus, e não sua compaixão e humanidade?

·    Em que apostamos “todas as nossas fichas”, porque cremos que somente isso nos dá vida e salvação?

·    O que significa viver “por causa de Jesus”, assim como ele viveu “por causa do Pai” que vive e o enviou?

quarta-feira, 17 de abril de 2024

A luz do Evangelho em nossa vida (323)

323 | Ano B | 3ª Semana da Páscoa | Quinta-feira | João 6,44-51

18/04/2024

Nesta quarta parte da sua catequese sobre o verdadeiro pão, Jesus enfrenta o escândalo que suas ações e suas declarações causam nos judeus. Ele volta a comparar a si mesmo com o maná com o qual Deus alimento o povo hebreu no seu êxodo, mas aproveita a oportunidade e aborda também a questão do dinamismo da fé, da sua origem divina e da qualidade das ações que realiza.

Os “judeus” aos quais se refere o texto de João não são as pessoas que vivem Israel, mas aqueles que resistem em reconhecer os sinais de Deus e aderir a ele, onde quer que estejam e qualquer que seja sua nacionalidade. No deserto, os “judeus” reclamaram do maná, chamando de “alimento nojento”, e não o reconheceram como sinal do amor de Deus. Agora, reclamam de Jesus, “filho de José”, que, aos olhos deles, não goza de nobreza para ser filho de Deus.

A busca de Deus, o encontro com ele, e a adesão prática ao seu querer tem um dinamismo: parte de Deus, que atrai a ele; e supõe nossa disponibilidade e a docilidade. Deus nada faz sem nossa livre adesão, mas pouco ou nada de bom realizamos se ele não nos atrair. É o que Jesus experimentou como Filho, e nos revelou. Quem se deixa atrair por Deus precisa reconhecê-lo em sua condição humana, tal como se manifesta na compaixão humana do “filho de José”.

Desde sempre, o que Deus mais deseja e faz é encontrar mil formas de vir ao encontro do ser humano para ajuda-lo e fazê-lo mais humano. Esta vontade e este dinamismo se tornam definitivos e insuperáveis em Jesus Cristo. Mas os “judeus”, ou incrédulos de todos os tempos, queremos dissocia-lo da humanidade de Jesus e afastá-lo da condição humana. Essa falta de fé atesta que não conhecemos (não “vimos”) a Deus.

A aceitação da condição humana fragilizada, radicalmente assumida por Jesus, é o único caminho que pode nos conduzir à vida. Ele, o filho de José, aquele que acolhe pecadores e proscritos, aquele cuja compaixão é sempre viva e ativa, é pão que desce, sacia nossa fome de plenitude e plenifica a vida. Sem esse reconhecimento e aceitação dessa “carne” de Jesus, a vida continua estreita, limitada, precária, “severina”.

 

Meditação:

·    Releia atentamente essa dura e exigente “catequese” de Jesus, evitando concluir sem mais que ele fala simplesmente da eucaristia

·    Será que nós fazemos parte do grupo dos “judeus”, dos incrédulos que não aceitam a condição e a compaixão humana de Jesus?

·    Este Jesus, “filho de José”, irmão universal, amor incondicional e rebeldia profética, é o Deus que nos atrai?

·    Teríamos suficiente sinceridade para dizer aquilo que, em Jesus, nos escandaliza e desestabiliza?

terça-feira, 16 de abril de 2024

A luz do Evangelho em nossa vida (322)

322 | Ano B | 3ª Semana da Páscoa | Quarta-feira | João 6,35-40

17/04/2024

Na terceira parte da catequese sobre o verdadeiro pão, Jesus convida enfaticamente à fé, a reconhecer que ele – o galileu, o carpinteiro, o filho de José e de Maria – é o enviado de Deus, o pão vivo e verdadeiro que desceu do céu. E pede aos seus interlocutores uma confiança fundamental nele e no seu Evangelho, que lhe deem crédito, que aceitem sua verdade. Trata-se de crer que Deus está nele e age nele.

Mas essa fé ou adesão a Jesus não é um ato voluntarista, ritual ou idílico. É uma decisão que tem uma base, um fundamento e um dinamismo: a vontade do Pai, e essa vontade é que nenhum/a filho/a seu se perca, que ninguém perca as condições materiais para viver, nem o sentido da vida. A vontade do Pai é clara: que toda pessoa que vê o Filho e nele crê tenha vida eterna. É para tornar isso possível e palpável que o Filho “desceu”.

Jesus é doador e fonte de vida, e não um limitador da vida (como é a Lei) ou um juiz pronto a identificar e punir culpados. Ele é o pão da vida, e quem vai a ele não terá outra fome. Mas é preciso ir ao encontro dele, aceitar seu caminho, entender a convocação que se esconde em cada sinal que ele realiza. Porém, Jesus constata um pouco desolado: “Vós me vistes, mas não acreditais...”

Jesus afirma com clareza que não afasta nem trata com descaso ou dureza aqueles/as que o Pai confia a ele e o procuram, aqueles/as que decidem percorrer seu caminho e fazer parte do seu povo. Estes/as não perderão nada, nem se perderão; ao contrário, ganharão tudo. Jesus promete que ressuscitará estes/as seguidores/as “no último dia”, o sétimo dia da criação, o ápice da criação saída do coração de Deus.

A expressão “no último dia” é também uma referência à sexta-feira, ao dia da doação total e radical de Jesus na cruz, que ele “abraça livremente”. É do alto da cruz, em meio a duas outras vítimas com as quais se solidariza, que Jesus revela até onde vai o amor do Pai, perdoa os seus próprios assassinos e, por isso, pode declarar: “Tudo está consumado!” Ele é a criação consumada, madura e libertada, o doador da vida no qual todos/as renascemos. É em gestos semelhantes a esse que nos tornamos semelhantes a Deus

 

Meditação:

§  Releia atentamente essa dura e exigente “catequese” de Jesus, evitando concluir sem mais que ele fala simplesmente da eucaristia

§  Será que não estamos entre aqueles/as que viram, mas não acreditam, que não permitem que Jesus e seu Evangelho guie suas opções e organizem seus valores e prioridades?

§  Será que não corremos o risco de evitar o renascimento no amor incondicional e sem medidas, e transformamos o “último dia” na última coisa que seríamos capazes de aceitar?