sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

ANO C – QUINTO DOMINGO DO TEMPO COMUM – 07.02.2016

Precisamos avançar para águas mais profundas!

Nos primeiros domingos do tempo comum somos brindados com belíssimos encontros com a Palavra de Deus. Depois do episódio da sinagoga de Nazaré, quando Jesus foi expulso da cidade depois de apresentar-se como o profeta que prioriza a vida dos marginalizados, temos hoje o belo relato da pesca que termina em vocação. Jesus já havia estado em Cafarnaum e curado um homem possuído por um espírito impuro, a sogra de Pedro curvada sob a febre, e muita gente que estava doente (cf. Lc 4,31-41). Jesus então se retira para rezar (cf. Lc 4,42-44)... E agora chama e reúne os primeiros colaboradores.
Simão, Tiago e João voltam de uma noite de trabalho. Os barcos estão vazios de peixe e cheios de frustração e cansaço. Jesus vê os barcos parados à margem do lago e, mesmo percebendo que os pescadores não estão interessados na sua palavra, pede licença e sobe num dos barcos. É de dentro da própria vida, da lida cotidiana frequentemente dura e às vezes vazia, que Jesus se aproxima do povo e assegura que as promessas de Deus estão se cumprindo, que com ele uma boa notícia finalmente é anunciada aos pobres e opimidos. Jesus entra na nossa vida e, desde o interior dela, nos ama e chama...
Os pescadores e candidatos a discípulos não parecem muito interessados com o que está acontecendo naquele momento às margens do lago de Genesaré. O cansaço e a sensação de frustração os invade por inteiro. Não vislumbram um horizonte que não seja voltar ao mesmo e rotineiro trabalho na noite seguinte. Para eles, a vida dos trabalhadores não pode fazer concessão a sonhos e utopias... Seu destino está desde sempre escrito a ferro e fogo nas instituições. Poderiam repetir o ditado: ‘A vida é um combate que aos fracos abate’. Inicialmente, o jovem pregador não suscita neles nenhuma expectativa.
Não é muito diferente a vida de muitos cristãos. Infelizmente, são muitos aqueles que se contentam com as rotinas de uma cultura religiosa recebida por herança e conservada por inércia. Outros vivem a fé como um fardo que cansa ou como um hábito que envergonha. Permanecem cristãos por conveniência ou por medo de mudar, mas exalam vazio e a frustração por todos os poros. E o que dizer dos bispos, padres, religiosos e catequistas que se conformam com às ‘antigas lições’ e não cansam de lamentar o vazio dos tempos e a falta de perseverança dos catequizandos?
Jesus pede que Pedro avance para águas mais profundas e recomece a pesca. A superficialidade sempre nos parece tentadoramente segura, mas normalmente também é menos fecunda. Lugares profundos costumam ser arriscados e exigem prudência e habilidade, mas a prudência não pode impedir o avanço. A superficialidade conduz inexoravelmente à esterilidade. A abertura e obediência à Palavra abre portas à abundância e à fecundidade. Como Pedro, precisamos superar a idéia de que somos pescadores experientes e tornarmo-nos discípulos e aprendizes.
Em atenção à Palavra de Jesus, Pedro lança as redes novamente, e o resultado é surpreendente. Ele então reconhece e sublinha sua indignidade, mas Jesus não dá ouvidos às suas palavras. “Não tenhas medo! De agora em diante serás pescador de homens!” E ‘pescar’ (zôgreô) significa literalmente: vivificar, reunir para conservar a vida (como fez o herói nacional Sepé Tiarajú, cuja memória celebramos neste domingo). E este chamado que Jesus dirige Pedro não é isolado: Tiago e João, companheiros e sócios no ofício da pesca, são agora também companheiros e participantes desta nova identidade e missão. “Eles levaram os barcos para a margem, deixaram tudo e seguiram Jesus.”
Há uma uma constante no verdadeiro encontro com Deus: somos colocados cara a cara com a nossa realidade mais profunda e autêntica. Nossa verdade é a vulnerabilidade e a finitude, e, se as esquecemos ou negamos, a humanidade acaba pagando um alto preço. Mas, ao mesmo tempo, nos descobrimos preciosos aos olhos de Deus. Ele dá impérios em troca da nossa liberdade (cf. Is 43,3-4), tatua nosso nome na palma da sua mão (cf. Is 49,16) e, tocando nossos lábios, perdoa nosso pecado e confirma nossa dignidade. E nos engaja, lado a lado, ombro a ombro, na sua própria missão...
Jesus de Nazaré, peregrino nos santuários das dores e buscas humanas... Vem, entra nesta barca que é a tua Igreja e transforma seus tímidos viajantes em ardorosas testemunhas. Abre nossos ouvidos à tua Palavra, preenche nossos vazios com tua presença, cura nossas frustrações e desamarra as mãos que o medo e a acomodação imobilizaram. Engaja-nos na tua missão de reunir teus irmãos e irmãs, de promover e conservar a vida e de anunciar uma Boa Notícia que faça sentido às pessoas do nosso tempo. E isso sem esquecer que somos sempre simples discípulos e servidores. Assim seja! Amém!

Itacir Brassiani msf
(Profecia de Isaías 6,1-8* Salmo 137 (138) * 1ª Carta aos Coríntios 15,1-11 * Evang. Lucas 5,1-11)

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