sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

O evangelho dominical

ONDE ESTAMOS NÓS?

Uns desconhecidos comunicam a Jesus a notícia da horrível matança de uns galileus no recinto sagrado do templo. O autor da chacina foi mais uma vez, Pilatos. O que mais os horroriza é que o sangue daqueles homens se tenha misturado com o sangue dos animais que estavam a oferecer a Deus.
Não sabemos por que recorrem a Jesus. Desejam que se solidarize com as vítimas? Querem que lhes explique por que horrendo pecado foi cometido para merecer uma morte tão ignominiosa? E se não pecaram, porque Deus permitiu aquela morte sacrílega no Seu próprio templo?
Jesus responde recordando outro acontecimento dramático ocorrido em Jerusalém: a morte de dezoito pessoas esmagadas pela queda de uma torre da muralha próxima da piscina de Siloé. Pois bem, a respeito de ambas as situações Jesus faz a mesma afirmação: as vítimas não eram mais pecadoras que outros. E termina a Sua intervenção com a mesma advertência: «se não vos converteis, todos perecereis».
A resposta de Jesus faz pensar. Antes de mais nada, recusa a crença tradicional de que as desgraças são um castigo de Deus. Jesus não pensa num Deus «justiceiro» que vai castigando os Seus filhos e filhas repartindo aqui ou ali doenças, acidentes ou desgraças, como resposta aos Seus pecados.
Depois, muda a perspectiva da situação. Não se detém em elucubrações teóricas sobre a origem última das desgraças, falando da culpa das vítimas ou da vontade de Deus. Volta o Seu olhar para os presentes e confronta-os consigo mesmos: devem escutar nestes acontecimentos o chamado de Deus à conversão e à mudança de vida.
Todavia vivemos abalados pelo trágico terramoto do Haiti. Como ler esta tragédia a partir da atitude de Jesus? Certamente, em primeiro lugar não devemos perguntar-nos onde está Deus, mas onde estamos nós. A pregunta que pode encaminhar-nos para uma conversão não é «porque permite Deus esta horrível desgraça?», mas «como consentimos nós que tantos seres humanos vivam na miséria, tão indefesos ante a força da natureza?».
Ao Deus crucificado não o encontraremos pedindo contas a uma divindade longínqua, mas identificando-nos com as vítimas. Não o descobriremos protestando contra Sua indiferença ou negando a Sua existência, mas colaborando de mil formas para mitigar a dor no Haiti e no mundo inteiro. Então, talvez, possamos intuir entre luzes e sombras que Deus está nas vítimas, defendendo a Sua dignidade eterna, e nos que lutam contra o mal, alentando o seu combate.
José Antonio Pagola

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