domingo, 8 de outubro de 2017

Romaria da Aparecida em Passo Fundo

Nossa Senhora Aparecida reúne uma multidão: qual é o segredo?

Eu fui apenas mais um entre as mais de 100 mil pessoas que, desde o início da manhã, iam e vinham, depois de permanecer algum tempo no espaço do Santuário. Que mistério ou que força é essa que atrai, ano após ano, uma multidão ao pequeno Santuário de Nossa Senhora Aparecida, em Passo Fundo? E o que essa gente encontra naquele lugar?

Talvez essa gente não encontre nada, e o segredo esteja na profética experiência de caminhar, de sair de casa, de descobrir-se mais que um simples fragmento perdido na cidade, de experimentar a alegria e a força de ser parte de um povo, de um povo que caminha, não obstante as forças nefastas que poderiam levar à fuga, ao fechamento, ao isolamento.

Talvez o segredo esteja naquela imagem pequenina, quase invisível, menor que quase tudo, encontrada em pedaços, posteriormente feita em migalhas, profeticamente negra como um povo escravizado no passado e discriminado no presente; imagem pequena e intencionalmente simples, acolhida e compreendida por gente simples, em cuja cabeça não cabem coroas, pois ela não vem dos palácios, mas das senzalas.

Talvez a força que move essa multidão não esteja nas palavras articuladas, nos sermões proclamados e nem mesmo nas canções cuidadosamente escolhidas, mas nas palavras silentes e eloquentes das lagrimas e soluções daquele homem anônimo que, ao meu lado, dizia tudo sem que eu entendesse nada: diante da memória da mãe negra e no meio de uma multidão que ele intui que seja sua família, derramou suas dores e obteve o consolo que não recebeu antes em lugar algum e de quem quer que fosse.

A força que atrai e seduz talvez esteja implícita e inarticulada no arquétipo de um Deus terno e materno, que gosta de se manifestar sem falar, cuidando e reunindo, chamando e acompanhando; de um Deus que não se sente bem nas alturas inacessíveis, mas vibra de alegria descendo às estrebarias, compartilhando refeições, caminhando pressuroso ao encontro da ovelha amada, descendo aos infernos, compartilhando o desespero, surpreendendo caminheiros que antecipam a Aurora.

A multidão com a qual eu caminhei e celebrei era majoritariamente branca, muito branca. Índios e escravos poucos sobreviveram às duras penas impostas pelos colonizadores nessas pampas. E estes poucos talvez ainda não consigam se ver em nossas comunidades e devoções. Vi gente de pele negra, sim, muitos negros recentemente desembarcados da África moderna e ainda violentada. Eles trabalhavam vendendo comida e badulaques, como aqueles de 300 anos atrás, ao mesmo tempo parte da caravana e excluídos dela. Terão a alegre surpresa de encontrar hoje em suas redes a Mãe, machucada e quebrada como eles, e nela encontrar um pouco de divino consolo?

Itacir Brassiani msf

Um comentário:

Adriane Alves disse...

Nossa que belas palavras.��