sábado, 22 de dezembro de 2018

ANO C | TEMPO DO NATAL | CELEBRAÇÃO DA NOITE | 25.12.2018


Jesus, um caminho para o abraço entre a paz e a justiça.
As casas, mercados, ruas e praças estão repletas de luzes. Os espaços religiosos, comerciais e de lazer estão tomados por melodias harmoniosas. Os shoppings estão abarrotados de mercadorias e são invadidos por multidões movidas por um insaciável desejo de consumo. Entretanto, uma sensação de noite escura provoca um temor que insiste em não desaparecer. E um sentimento de vazio insaciável sobrevive às mesas fartas e à abundância de bebidas. Objetivamente, jugos diversos oprimem o povo, cargas insuportáveis são jogadas nas suas costas. E um desejo insistente e profundo desejo de paz e bem queima nossa alma.
Naquele tempo, quando Quirino governava a região, César Augusto decretou em Roma uma medida que mexeu com a vida do povo de Israel, como se já não estivesse difícil demais. Usando as palavras de Isaías, a canga da opressão política, econômica e religiosa vergava o pescoço dos pobres; a prepotência dos fiscais se superava a cada dia na forma e na intensidade; as tropas de soldados, com suas botas ruidosas e suas fardas ensanguentadas, desfilavam para assustar o povo da roça e da cidade. O povo vivia como os pastores, obrigados a trabalhos noturnos e acossados permanentemente pelo medo de tudo e de todos.
Em nosso tempo, sentimo-nos encurralados pelos discursos agressivos e ameaçadores das elites saudosas do escravagismo, apaixonadas pela tortura, casadas com a violência e promotoras de um mercado total, sem limites e sem coração. Estas elites, mancomunadas com setores dos poderes legislativo, executivo e judiciário e com a imprensa mercantilista, conseguiram tornar vencedor um projeto de segregação social, de limitação de direitos, de ódio aos indígenas e imigrantes, de intolerância com o pensamento divergente, de segurança jurídica para os capitalistas às custas da insegurança dos trabalhadores. Também hoje a noite é escura...
A escuridão tenebrosa dessa noite assusta e abate, a mentira repetida ininterruptamente toma feições e cores de verdade, a intolerância e a violência rondam nosso pensamento e nos tentam como saídas viáveis e desejáveis. Mas a memória do nascimento de Jesus em Belém, da sua pregação na Galileia, da sua ação livre, destemida e libertadora no caminho a Jerusalém, da ousada firmeza diante dos podres poderes – da Boa Notícia de Deus! – abre nossos olhos, enxuga nossas lágrimas, põe fogo nas cangas que nos oprimem e nas botas e fardas manchadas de sangue, põe-nos de pé. Damo-nos as mãos e cantamos, desafiando a noite.
A alegria suscitada pela encarnação de Deus não é uma entre as outras alegrias que experimentamos, não se equipara à que sentimos quando adquirimos um bem desejado, recebemos a visita esperada, realizamos a viagem planejada ou conseguimos a vitória nas urnas. É uma alegria intensa, profunda e imensa, quase inexplicável. Ela vem da certeza de que na fragilidade de um Deus que se faz criança a justiça que necessitamos e a paz que aspiramos se entrelaçam e completam; que a luz do Evangelho ilumina e elimina as trevas e abre caminhos, evidenciando a irmandade universal; que este mundo imundo não é eterno...
A celebração do Natal suscita essa alegria porque, em Jesus, a graça de Deus se manifesta e confirma a dignidade e o valor das pessoas excluídas da lista dos meritórios homens de bem (ou homens dos bens?). O Natal suscita esperança porque revela que a força da mudança mora em nós, em nossa capacidade de viver com piedade, equilíbrio e justiça.  Aproximando-se da humanidade, Deus se faz conselheiro admirável. Assumindo nossa fragilidade, ele se mostra forte e nos fortalece. Enfrentando incansavelmente os opressores, ele se mostra príncipe da paz. Armando sua tenda na escuridão, ele se faz nossa luz.
Os pastores são os primeiros a receber a notícia, a ver e a tocar esse mistério inefável, a experimentar a alegria que exorciza o medo. Mas não são os únicos! Essa alegria, suscitada pela esperança cuja realização embrionária nos espera na periferia do mundo, é para todo o povo, para todos os que “jazem nas sombras da morte”. As praças iluminadas e os shoppings sedutores não conseguem produzi-la, nem o cinismo dos vitoriosos conseguirá suprimi-la. Nossas igrejas preocupadas unicamente com o culto, a devoção e a lei estrão em condições de entendê-la e celebrá-la? Ela brota do abraço entre a paz e a justiça!
Deus amável, abraço da misericórdia e da justiça, comunhão incondicional e sem limites, encontro reconciliador entre a divindade e a humanidade! No mistério dessa noite fazes resplandecer a verdadeira luz, e nela entendemos que não queres habitar as alturas inacessíveis e nos queres como tua morada. Que tua encarnação nos faça menos medrosos e mais alegres, menos resignados e mais lutadores, menos indivíduos e mais comunidade, mais proféticos que piedosos, espaço e sementeira de justiça e paz. Amém! Assim seja!
                                                                                                    Itacir Brassiani msf
Profecia de Isaías 9,1-6 | Salmo 95 (96)
Carta de São Paulo a Tito 2,11-14 | Evangelho de São Lucas 2,1-14

Nenhum comentário: