A fé nos leva a ver e agir no mundo do jeito de Deus.
Depois da
parábola do rico e de Lazaro, os apóstolos pedem que Jesus os faça crescer na
fé. Por trás desse pedido e da resposta de Jesus estão alguns problemas bem concretos:
o abismo que separa os ricos e indiferentes dos pobres e carentes; o escândalo
que isso provoca nas comunidades cristãs; a orientação exigente e concreta da
Palavra de Deus; a recusa, por parte de Jesus, em mudar o mundo mediante
milagres; o imperativo do perdão incondicionado aos irmãos e irmãs (cf. Lc
16,19-17,4). É diante disso que os apóstolos reagem assustados e preocupados, e
suplicam a Jesus: “Aumenta a nossa fé!”
Qual é o
problema dos apóstolos, daqueles escolhidos por Jesus e de todos os que vieram
depois? Sentimo-nos incapazes de romper com alguns valores profundamente
arraigados e tidos como essenciais pela cultura religiosa: a necessidade de
punir as pessoas consideradas pecadoras ou impuras; a sedução por uma religião
que prioriza ações espetaculares; a valorização absoluta da riqueza e do
próprio bem-estar, como se fosse sinal inequívoco da benção de Deus, mesmo
quando conseguida às custas da indiferença; e assim por diante.
Os apóstolos
percebem vivamente que necessitam da luz e da força da fé para superar esta
floresta de amoreiras que impedem a vida e a compaixão. Eles sabem que a fé não
é estéril, mas parecem ignorar que seus frutos não são necessariamente espetaculares.
Trata-se da irresistível atração pelas coisas grandiosas e que ainda hoje leva
tantos irmãos e irmãs a lerem a metáfora usada por Jesus de forma literal. É
triste assistir à multiplicação de pretensos milagres em templos, estádios e
praças, com transmissão ao vivo...
O que chama a
atenção na resposta de Jesus não é o apelo a uma fé prodigiosa e espetacular,
mas a necessidade de uma fé mínima. “Se tivésseis fé, mesmo pequena como um
grão de mostarda...” O próprio Jesus sempre evitou recorrer a ações miraculosas
para ser fazer ouvido e aceito. Ele tinha consciência de que a fé não procede
do milagre, mas o precede. É a fé que nos leva a ver maravilhas, e não as ações
maravilhosas que despertam a fé. As ações de Jesus que chamamos de milagres são
respostas compassivas do socorro de Deus em favor de quem não tem com quem
contar.
O fruto da fé
se mostra substancialmente na descoberta da própria dignidade socialmente
negada e no olhar que reconhece os seres humanos e todas criaturas como
parceiras e irmãs. O Vaticano II diz que a fé tem força crítica e dinamismo
libertador, pois “ilumina com sua luz tudo que existe e manifesta o propósito
divino a respeito da plena vocação humana, orientando assim o espírito para as
verdadeiras soluções” (GS 11). Ou, como diz o Papa Francisco, “a fé nos dá a
justa dimensão de todas as coisas, fazendo-nos ver o mundo com os olhos e o
coração de Deus”. Mesmo parecendo pequena, desprezível e frágil como semente de
mostarda, ela tem força para jogar no fundo do mar as estruturas poderosas e
opressoras simbolizadas pela amoreira.
Mas para que
isso aconteça, é preciso ser capaz de romper com a lógica do poder. Nesta perspectiva,
Paulo lembra a Timóteo a fé sincera que recebeu da sua avó Loide e da sua mãe
Eunice, e pede-lhe que conserve esse dom sempre vivo e ativo. A fé gosta de vir
acompanhada pela fortaleza, pelo amor e pela sobriedade. Como Paulo e Timóteo,
os verdadeiros missionários não conhecem a vergonha, nem diante de Jesus
Cristo, nem diante da perseguição ou do escárnio que sofrem aqueles que levam
adiante seu projeto. Como o caso daqueles que, desavergonhadamente, se opõem ao
Sínodo da Amazônia.
A ação
missionária da Igreja é sempre frutuosa, mas ao modo do grão de mostarda. O
trabalho generoso dos missionários, quando brota do ventre da compaixão e da
misericórdia, jamais será estéril. Aqueles que agem como filhos de Deus. Talvez
seja exatamente isso o que os missionários têm a oferecer ao mundo em nome dos
cristãos: uma fé capaz de romper com todos os dinamismos de isolamento e de
dominação; um amor capaz de reestabelecer a dignidade de quem a tem negada; uma
ação que articula a fé com a defesa da integridade da criação, que considera
que tudo está interligado.
É a ti que nos dirigimos, Deus Pai e Mãe,
neste primeiro domingo do Mês Missionário Extraordinário. Dá-nos uma fé capaz
de construir pontes com os demais homens e mulheres e de impedir a tentação do
isolamento. Faz com que o encontro com o teu Filho e nosso Irmão nos torne
autênticos discípulos, destemidos apóstolos e eloquentes testemunhas no serviço
solidário e gratuito aos mais pobres. Vem em nosso auxilio para que nossa fé,
mesmo sendo pequena como semente de mostarda, seja ativa, remova as amoreiras
da injustiça social e da depredação das natureza, e dinamize a presença dos
cristãos no mundo. Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
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