Celebrando o Jubileu que não houve:
60 anos da ordenação presbiteral do Pe. Rodolpho Ceolin msf
60 anos da ordenação presbiteral do Pe. Rodolpho Ceolin msf
Se o saudoso Pe. Rodolpho Ceolin estivesse ainda
conosco, no dia 25 de novembro estaríamos celebrando seus 60 anos de ministério
presbiteral. Seria uma festa e tanto, marcada pela alegria, pela gratidão, pela
serena esperança. Uma festa com presença de muitos coirmãos, familiares e
amigos de todas as idades. Afinal, ele marcou muitas gerações!
Carrego ainda vivas lembranças da celebração do seu
Jubileu de Ouro, em Jaguari, na sua querida comunidade natalícia (Linha 7,
Carlos Gomes). Quando ele marcou a data da celebração, no mês de outubro,
fiquei indignado, pois tinha previsto um encontro de formação missionaria. E o
encontro seria na Escola Apostólica Sagrada Família, a mesma que o recebera
como adolescente vocacionado em 1943, como néo-sacerdote em 1957, e para a qual
estava nomeado no final de 2012, para concluir sua fecunda existência. Mas, pela grande admiração e gratidão que
tinha por ele, eu não podia não cancelar o evento, e assim o fiz.
Lembro-me que, na véspera, tinha uma assessoria à assembleia
da diocese de Uruguaiana, atendendo ao convite de Dom Ângelo Domingos Salvador.
Mal terminei meu trabalho, deixei Uruguaiana no meio da tarde e segui, via
Alegrete, Manoel Viana, São Francisco de Assis e Santiago, rumo a Jaguari. Para
mim, um caminho absolutamente desconhecido, que foi se tornando belo e
acolhedor, pois me conduzia a uma pessoa que eu amava. Cheguei já escuro na
casa do Ermindo, irmão do Rodolpho.
Todos me esperavam, já preocupados. No dia seguinte, a
celebração marcada pela emoção e pela gratidão, com a presença de muitos amigos
e admiradores, alguns amigos de infância e a comunidade toda. Depois, uma festa
simples e animada, bem do jeito do povo do interior. Um momento de graça, e não
apenas para o Pe. Rodolpho.
Uma memória necessária
Devo dizer que lamento muito não podermos celebrar
este novo jubileu. Sentia-me no direito de esperar que o Pe. Ceolin não nos
deixasse antes dos 90 anos de vida. Sabedoria, maturidade e humanidade como a
que encontrávamos nele não se encontra em qualquer pessoa... Mas ele partiu,
deixando um vazio, suscitando recordações, ensinando silenciosas lições. Mas
sua memória tem ainda o dom de semear pontos de luz e de vida nesses tempos bicudos
que vivemos.
Recordamos e celebramos a memória do Pe. Rodolpoho
Ceolin msf não para engrandecê-lo e honrá-lo, como se disso ele gostasse e
necessitasse. Mantemos viva a memória de sua vida fecunda porque isso nos faz
bem, nos ajuda a manter o rumo certo, a perseverar na vida religiosa fraterna e
missionaria, a ‘desviver-nos’ por coisas que valem a pena, a pagar com alegria
e generosidade o preço da esperança que nos mantem dignamente vivos.
Ele foi sim um bom pastor!
Celebrando essa festa que deveria acontecer – que ele,
Lourival, Hermeto, Jovino, Estanislau, e, desde há pouco, Romulo e Susana compartilham
lá do outro lado – quero recordar os derradeiros pensamentos que partilhou
conosco, nos primeiros meses do seu último ano de vida. Na festa da páscoa de
2013 (31 de março), no ele escrevia (os destaques são dele):
“No período que me encontro (em
tratamento) no Lar de Nazaré, venho tendo a feliz oportunidade para boas
leituras, para orar e rever minha vida em diversos aspectos. Venho me detendo,
com mais afinco, na avaliação sobre como tenho vivido minha consagração a Deus
como religioso Missionário da Sagrada Família, e como exerci o ministério
sacerdotal, até atingir a bela idade de 83 anos...
Trato de me avaliar,
perguntando-me: na minha vida, fui deveras MISSIONÁRIO da Sagrada Família? De
2002 para cá, em Santo Ângelo, fui deveras BOM PASTOR? Poderia e deveria ter
sido bem mais... Das tantas e tantas horas que dediquei ao cultivo da horta e à
limpeza nos arredores da casa paroquial, bem que devia tê-las usado para
visitas aos enfermos, e catequizandos, ao atendimento às pessoas...
Em certa ocasião, num encontro
pessoal com Dom Estanislau, manifestei-lhe que eu vinha me questionando, até
com certa angústia, a respeito do estilo da ação pastoral em determinadas
paróquias: ‘Sem a pretensão de ser dono da verdade, minha impressão é a de que
corremos o risco de ser pastores demasiadamente confinados em nossos gabinetes
e casas paroquiais, com insuficiente ação e presença junto ao povo, seja tanto
da matriz, como dos bairros e das comunidades do interior...’ Aliás, esse era o
meu caso!...
Concluo, com sábias e categóricas
palavras de nosso amado Fundador, que praticou o que nos recomenda: “Ah, meus
filhos, É PRECISO ir ao encontro das pessoas, pois elas não virão até vocês! É PRECISO
procurar o povo, e não esperar que ele venha ao nosso encontro. As pessoas não vem
a Deus em bando, É PRECISO conquista-las uma a uma. É PRECISO conquistar os
homens, as mulheres, os jovens, as crianças! Qualquer outra ideia que se fizer
sobre o nosso ministério (presbiteral) é falsa, ou, ao menos, incompleta!”
Poucos dias mais tarde, no ultimo bilhete que me
enviou, respondendo à minha carta de agradecimento e despedida e enviando-me o
texto da reflexão acima descrita, o Pe. Ceolin escrevia (também aqui os
destaques são dele):
“A estas alturas da
vida, não devo agradecer-lhe apenas pela amizade e benquerença fraternal.
Sou-lhe muito grato, em especial, por sua constante intercessão a Deus por
minha saúde e crescimento espiritual, na fase que estou vivendo com os demais
coirmãos enfermos e idosos. Além disso, você vem me abastecendo de leituras
animadoras, mormente nesta fase tão rica, humana e espiritual, que o Deus da
VIDA, me proporciona aqui no Lar de Nazaré...
Mas quanto à
mensagem que você fez chegar a mim, através do nosso amigo comum Pe. André, a
meu ver, só me resta dizer: ITA, é demais!
Não passo de um mortal como todo ser humano. O que fui e sou, devo-o
unicamente ao BOM DEUS e a VOCÊS confrades e a tantos amigos (as) que ELE
colocou na minha vida!
Meu estado de
saúde, de momento, consiste em lutar para que a medula se reative e volte a
produzir as plaquetas em quantia suficiente. Ita, por meio do André, aqui vai
um pouco do que vivo e reflito atualmente, a respeito de que e de como vivi
meus anos como MSF. Ita, meu abraço fraterno, amigo, carinhoso e agradecido.”
Deus é todo amor, pastor em busca da ovelha
amada!
Desde então ele foi silenciando progressivamente,
deixando sua emoção aflorar com mais intensidade e serenidade, pensando na
despedida, na travessia e no encontro, no dom e na oferta radical e
incondicional de si mesmo a Deus, que ele havia antecipado sacramentalmente no
batismo e na consagração, e que em breve deveria viver. É nesse contexto que
brotam e adquirem pleno sentido as palavras que ele deixou escrito, em forma de
testamento, para serem lidas nas suas próprias exéquias (aqui também, os
destaques são do texto original).
“Nos meses vividos
em Passo Fundo, recolhido e acolhido no Lar de Nazaré para tratamento de saúde,
junto a confrades verdadeiramente irmãos e funcionárias (os) dedicadas (os),
fiz a experiência mais bela da vida: DEUS É TODO AMOR, É PAI DEVERASMENTE
MISERICORDIOSO, É PASTOR EM BUSCA DA OVELHA AMADA.
Como é bonito estar
cercado não só do Amor de Deus mas também muito cercado do amor de vocês, familiares,
parentes, amigos (as) de tantos lugares, em especial de Santana Prado e da
comunidade tão querida da Linha 7, Carlos Gomes; cercado de amor de meus
confrades de toda a Província e do Generalado, cercado, ultimamente pelos de
Passo Fundo e de Santo Ângelo; cercado de amor pelos funcionários (as) do Lar
de Nazaré.
É bonito morrer
cercado de amor como fui pelas queridas irmãs Carmelitas, pelo Pe. Jacinto e pelo
Pe. Marcos, pelos funcionários (as) da casa Paroquial, pelos paroquianos (as)
que me conduziam ao Hospital de Ijuí, pelos que me assistiam de dia e de noite
no Hospital de Santo Ângelo e na casa Paroquial. É mais que bonito morrer
cercado de tanto amor dos amados paroquianos (as) que tanto oraram por mim.”
A saudade espalha as sementes
O que nos resta dizer? Há algo que possa ser
acrescentado? Não é esse o retrato acabo e em cores vibrantes, rico de detalhes
que muitos guardamos com carinho, de uma pessoa que viveu seu ministério com
generosidade sem limites e de modo fecundo até a derradeira Travessia? Da minha
parte, consola-me ouvir sempre de novo as últimas palavras que ele dirigiu a
mim, expressando seu abraço “fraterno,
amigo, carinhoso e agradecido”. A amizade e o carinho são seus, Pe. Ceolin,
mas a gratidão é toda nossa! Deus seja louvado pelo seu ministério e sua vida
generosa e fecunda!
Itacir Brassiani msf
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