A missão nasce no coração de Deus
"Tudo vale a pena quando a alma nao é pequena..." |
O que nos impulsiona e desinstala é a força da Palavra de amor. Por isso, podemos afirmar que o dinamismo original e primário da missão é a Boa Nova da Salvação. É isso que expressamos quando dizemos que Deus é nosso Pai (Muluku Tithi, na língua makua) e que nós somos seus filhos e filhas, irmãos e irmãs entre nós. Deus revela em Jesus seu rosto profundamente humano, e n’Ele a humanidade se encontra numa grande família. Se acreditamos que Deus é Pai e todos, então os “outros” serão nossos irmãos e irmãs. A missão vem de Deus, e Deus é amor.
A partir da prática missionária de Jesus (cf. Mt 9, 35-37), percebemos que não podemos esperar estar prontos e formados para só então partir para a missão. Precisamos confiar no Espírito Santo (Eroho Yowarya) e lançarmo-nos, mesmo na precariedade e na insegurança. Jesus organizou sua missão e a missão da comunidade na precariedade e na itinerância.
Nossa missão em Mecubúri
A nossa comunidade missionária de Mecubúri (diocese de Nampula, Moçambique) é composta de quatro membros: Pe. Neiri Segala, Pe. Firmino Santana, Ir. Edilson Frey e Pe. Pedro Léo Eckert. Conosco vive também um funcionário da Escola Familiar Rural, que é também vocacionado. No povoado estão presentes também, há quase quarenta anos, as Irmãs Servas de Nossa Senhora de Fátima. E em breve chegará uma comunidade de Irmãs Franciscanas Capuchinhas.
A missão está ainda em processo de estruturação. Vivemos numa área bem abrangente, na savana africana, no meio de várias montanhas. É uma região inóspita. Chove apenas entre o final de novembro e o final de março. Estamos há duas horas de carro da cidade de Nampula. Vivemos numa casa com energia que captamos com placas solares. Com isso é possível acender, mesmo que muito precariamente, pequenas lâmpadas nos quartos, na cozinha, na sala e nos banheiros.
Cada dia precisamos nos programar para viver sem televisão, sem geladeira e sem outros confortos absolutamente normais noutras partes do mundo. Por outro lado, todo santo dia precisamos atiçar a criatividade e o bom humor para conviver com isso como algo que não nos empobrece, mas exercita nossa paciência e entrega.
Cultivamos uma boa horta, criamos galinhas, porcos e cabritos. Cultivamos também algumas árvores frutíferas, um recanto de flores e chás e uma machamba (roça), onde plantamos mandioca, milho, feijão, ervilha... Tudo para o sustento da própria missão, já que estamos longe dos freezers e prateleiras dos supermercados. Fornecemos trabalho para algumas pessoas: um cozinheiro, um vigia, uma pessoa que cultiva a horta e cuida dos animais, outra que cuida da limpeza e da rouparia. São jovens em busca de algo que os ajude nos estudos.
Algumas informações
Crianças, sempre crianças, muitas crianças... |
Mesmo assim, quero descrever brevemente esta realidade. Nas duas Paróquias confiadas aos Missionários da Sagrada Família pela Arquidiocese de Nampula, existem cadastradas e atendidas 270 pequenas comunidades eclesiais e vários grupos de oração (novos aglomerados de cristãos organizados que esperam a aprovação e o reconhecimento do estatuto de comunidades).
As duas Paróquias são organizadas em quatro núcleos: o núcleo de Mecubúri, dividido em onze zonas, cada uma das quais tem 5 a 12 comunidades; o núcleo de Namina, reorganizado em sete zonas, com 4 a 8 comunidades cada uma; núcleo de Milhana, dividido em sete zonas que contam, cada qual, com 7 a 13 comunidades; núcleo de Ratane, organizado em nove zonas, cada uma das quais conta com 6 a 9 comunidades. Cada comunidade tem um ancião ou anciã (dirigentes), catequistas e animadores. As zonas têm seus animadores zonais e seus representantes pastorais. As paróquias têm seus Conselhos e animadores.
A organização pastoral ainda pequena e progride lentamente, mas temos um certo ritmo e algum programa para as mães, para a juventude, para o dízimo, para a animação litúrgica, para a catequese infantil e adulta, para a animação vocacional, e um pequeno géermen da Infância e Adolescência Missionária.
Um dos edificios da Casa Familiar Rural |
A formação é realizada nas zonas, regiões ou paróquias. São cursos de formação geral ou específica (para cada organismo ou setor pastoral). A estrutura para essa formação ainda é muito precária. Centro de formação temos apenas um; um segundo é muito precário. Precisamos estruturar pelo menos mais dois centros de formação para termos condições mínimas de pensar uma formação adequada.
A Escola Profissional Familiar Rural de Mecubúri (EPFRM) também está em processo de estruturação, e conta com recursos próprios: parcerias entre a Província, o Governo de Moçambique e a Disop (ONG da Bélgica). O diretor é o Ir. Edilson, que já está com a autorização de funcionamento em mãos. A partir de 2012, se Deus quiser, a Escola começará a funcionar.
Desafios, muitos desafios
Enumeramos alguns desafios dos quais temos consciência e que precisamos enfrentar mais e melhor: a saudade da última missão, que insiste em permanecer; a vida comunitária que deve avançar; melhorar o atendimento das pessoas que vêm até nós e tomar iniciativas para ir a eles; cultivar a comunhão com os coirmãos que não estão aqui; superar as dificuldades de comunicação; viver o espírito, e não só a ação missionária; saber conviver com as dificuldades de locomoção e buscar saídas para as péssimas condições das estradas e para superar as grandes e enormes distâncias, tanto geográficas, como culturais e até religiosas; conviver com as circunstâncias climáticas e ecológicas; superar o sentimento de impotência e o medo do fracasso; conviver sem medo com a possibilidade de doenças (especialmente a malária); mergulhar de vez no processo de verdadeira inculturação; etc.
Queridos coirmãos e amigos/as: não estamos com medo, nem queremos chorar pelo que não temos ou ainda não somos. Preferimos nos alegrar com a coragem dos passos dados até aqui. Sabemos que a roça é grande e que os operários poderiam ser mais numerosos, mas pensamos que você, onde quer que esteja, talvez tenha a mesma sensação, os mesmos pensamentos e o mesmo ardor que experimentamos aqui.
Igreja matriz de Mecuburi |
Reconhecemosque esta não é uma África muito romântica, e muito menos perfeita e próspera, como imaginávamos. Um trabalho (muteko) muito árduo nos espera por aqui. A cada dia é preciso soprar as cinzas para que o calor das brasas aqueça o Espírito e não nos deixe cansar. Mesmo na pequenez e na fraqueza, estamos dando nossa colaboração para transformar a realidade e despertar a dignidade e o amor nestas terras de missão.
Pe. Pedro Léo Eckert msf
(Em nome da Comunidade, maio de 2011)