quarta-feira, 30 de novembro de 2011

ARDOR E AMOR MISSIONÁRIOS

A missão nasce no coração de Deus
"Tudo vale a pena quando a alma
nao é pequena..."
O ardor missionário é sinal claro e evidente de que a nossa hora de Igreja Missionária chegou. É natural que a partir disso sintamos necessidade de proclamar as maravilhas que Deus fez em nós: anunciar a Palavra em espírito e verdade e dar a oportunidade a quem a recebe de tornar-se filho/a de Deus. O destinatário da missão, por sua vez, é sempre um interlocutor e nunca ficará calado e passivo. Antes, anunciará a sua alegria aos irmãos e irmãs.
O que nos impulsiona e desinstala é a força da Palavra de amor. Por isso, podemos afirmar que o dinamismo original e primário da missão é a Boa Nova da Salvação. É isso que expressamos quando dizemos que Deus é nosso Pai (Muluku Tithi, na língua makua) e que nós somos seus filhos e filhas, irmãos e irmãs entre nós. Deus revela em Jesus seu rosto profundamente humano, e n’Ele a humanidade se encontra numa grande família. Se acreditamos que Deus é Pai e todos, então os “outros” serão nossos irmãos e irmãs. A missão vem de Deus, e Deus é amor.
A partir da prática missionária de Jesus (cf. Mt 9, 35-37), percebemos que não podemos esperar estar prontos e formados para só então partir para a missão. Precisamos confiar no Espírito Santo (Eroho Yowarya) e lançarmo-nos, mesmo na precariedade e na insegurança. Jesus organizou sua missão e a missão da comunidade na precariedade e na itinerância.
Nossa missão em Mecubúri
A nossa comunidade missionária de Mecubúri (diocese de Nampula, Moçambique) é composta de quatro membros: Pe. Neiri Segala, Pe. Firmino Santana, Ir. Edilson Frey e Pe. Pedro Léo Eckert. Conosco vive também um funcionário da Escola Familiar Rural, que é também vocacionado. No povoado estão presentes também, há quase quarenta anos, as Irmãs Servas de Nossa Senhora de Fátima. E em breve chegará uma comunidade de Irmãs Franciscanas Capuchinhas.
A missão está ainda em processo de estruturação. Vivemos numa área bem abrangente, na savana africana, no meio de várias montanhas. É uma região inóspita. Chove apenas entre o final de novembro e o final de março. Estamos  há duas horas de carro da cidade de Nampula. Vivemos numa casa com energia que captamos com placas solares. Com isso é possível acender, mesmo que muito precariamente, pequenas lâmpadas nos quartos, na cozinha, na sala e nos banheiros.
Cada dia precisamos nos programar para viver sem televisão, sem geladeira e sem outros confortos absolutamente normais noutras partes do mundo. Por outro lado, todo santo dia precisamos atiçar a criatividade e o bom humor para conviver com isso como algo que não nos empobrece, mas exercita nossa paciência e entrega.
Cultivamos uma boa horta, criamos galinhas, porcos e cabritos. Cultivamos também algumas árvores frutíferas, um recanto de flores e chás e uma machamba (roça), onde plantamos mandioca, milho, feijão, ervilha... Tudo para o sustento da própria missão, já que estamos longe dos freezers e prateleiras dos supermercados. Fornecemos trabalho para algumas pessoas: um cozinheiro, um vigia, uma pessoa que cultiva a horta e cuida dos animais, outra que cuida da limpeza e da rouparia. São jovens em busca de algo que os ajude nos estudos.
Algumas informações
Crianças, sempre crianças,
muitas crianças...
Esta é uma espécie de introdução para falar um pouco das impressões de um missionário que há três meses chegou a este novo país e a este novo continente,  que está conhecendo essa nova gente, essa nova cultura, essa diferente realidade. Falar das primeiras impressões pode ser interessante, mas pode ser também perigoso, pois podemos ser generosos demais, ou então injustos: faltam conhecimento e experiência. Fazer o caminho da evangelização inculturada na África, aqui em Moçambique, na Arquidiocese de Nampula, nas Paróquias de Nossa Senhora da Assunção, Santa Cruz de Muite, é realmente um desafio que parece ultrapassar nossas forças.
Mesmo assim, quero descrever brevemente esta realidade. Nas duas Paróquias confiadas aos Missionários da Sagrada Família pela Arquidiocese de Nampula, existem cadastradas e atendidas 270 pequenas comunidades eclesiais e vários grupos de oração (novos aglomerados de cristãos organizados que esperam a aprovação e o reconhecimento do estatuto de comunidades).
As duas Paróquias são organizadas em quatro núcleos: o núcleo de Mecubúri, dividido em onze zonas, cada uma das quais tem 5 a 12 comunidades; o núcleo de Namina, reorganizado em sete zonas, com 4 a 8 comunidades cada uma; núcleo de Milhana, dividido em sete zonas que contam, cada qual, com 7 a 13 comunidades; núcleo de Ratane, organizado em nove zonas, cada uma das quais conta com 6 a 9 comunidades. Cada comunidade tem um ancião ou anciã (dirigentes), catequistas e animadores. As zonas têm seus animadores zonais e seus representantes pastorais. As paróquias têm seus Conselhos e animadores.
A organização pastoral ainda pequena e progride lentamente, mas temos um certo ritmo e algum programa para as mães, para a juventude, para o dízimo, para a animação litúrgica, para a catequese infantil e adulta, para a animação vocacional, e um pequeno géermen da Infância e Adolescência Missionária.
Um dos edificios da
Casa Familiar Rural
A formação é realizada nas zonas, regiões ou paróquias. São cursos de formação geral ou específica (para cada organismo ou setor pastoral). A estrutura para essa formação ainda é muito precária. Centro de formação temos apenas um; um segundo é muito precário. Precisamos estruturar pelo menos mais dois centros de formação para termos condições mínimas de pensar uma formação adequada.
A Escola Profissional Familiar Rural de Mecubúri (EPFRM) também está em processo de estruturação, e conta com recursos próprios: parcerias entre a Província, o Governo de Moçambique e a Disop (ONG da Bélgica). O diretor é o Ir. Edilson, que já está com a autorização de funcionamento em mãos. A partir de 2012, se Deus quiser, a Escola começará a funcionar.
Desafios, muitos desafios
Enumeramos alguns desafios dos quais temos consciência e que precisamos enfrentar mais e melhor: a saudade da última missão, que insiste em permanecer; a vida comunitária que deve avançar; melhorar o atendimento das pessoas que vêm até nós e tomar iniciativas para ir a eles; cultivar a comunhão com os coirmãos que não estão aqui; superar as dificuldades de comunicação; viver o espírito, e não só a ação missionária; saber conviver com as dificuldades de locomoção e buscar saídas para as péssimas condições das estradas e para superar as grandes e enormes distâncias, tanto geográficas, como culturais e até religiosas; conviver com as circunstâncias climáticas e ecológicas; superar o sentimento de impotência e o medo do fracasso; conviver sem medo com a possibilidade de doenças (especialmente a malária); mergulhar de vez no processo de verdadeira inculturação; etc.
Queridos coirmãos e amigos/as: não estamos com medo, nem queremos chorar pelo que não temos ou ainda não somos. Preferimos nos alegrar com a coragem dos passos dados até aqui. Sabemos que a roça é grande e que os operários poderiam ser mais numerosos, mas pensamos que você, onde quer que esteja, talvez tenha a mesma sensação, os mesmos pensamentos e o mesmo ardor que experimentamos aqui.
Igreja matriz de Mecuburi
Reconhecemosque esta não é uma África muito romântica, e muito menos perfeita e próspera, como imaginávamos. Um trabalho (muteko) muito árduo nos espera por aqui. A cada dia é preciso soprar as cinzas para que o calor das brasas aqueça o Espírito e não nos deixe cansar. Mesmo na pequenez e na fraqueza, estamos dando nossa colaboração para transformar a realidade e despertar a dignidade e o amor nestas terras de missão.
Pe. Pedro Léo Eckert msf
(Em nome da Comunidade, maio de 2011)

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