A morte não deve ser temida e escondida, mas esperada
e preparada!
As
festas dos/as Santos/as e de Finados não são uma relíquia do passado, nem um
negócio de floriculturas. São a oportunidade que temos de nos perguntar: que
significa a morte para nós? É o
momento propício para recordar, de forma agradecida, todos/as que nos
precederam e, ao mesmo tempo, de nos perguntar, pelo menos uma vez ao ano, como
queremos viver e como estamos vivendo. Vivemos como quem é ameaçado/a pela
noite escura e vazia ou como quem espera um encontro festivo e um abraço
afetuoso?
Tendo
presente as palavras de Jesus, nós recordamos todos os/as falecidos/as,
sobretudo aqueles/as com quem convivemos e deixaram marcas evangélicas em
nossas vidas. Recordamos não só como ausentes, mas também como presentes. Estão
presentes porque estão vivos/as “em-Deus”,
que é Deus dos vivos. Estão vivos/as em nosso coração pelo amor que lhes
dedicamos. Estão vivos/as nos frutos positivos que semearam em suas vidas e em
nossas vidas; e porque continuam amando, e de uma maneira mais plena, em Deus.
A morte é inevitável e costuma nos surpreender,
às vezes de maneira muito violenta. Ela é a única certeza absoluta que temos. No
entanto, apesar de ser algo tão certo e que todos os seres vivos compartilhamos
dessa realidade, não é fácil falar da morte. No contexto atual, a morte passou
a ser um tabu; por isso, ela é escondida. Hoje, evitamos falar da morte, mesmo
estando continuamente ela presente na nossa vida familiar e em nosso círculo de
relações. Acima de tudo, queremos evitar pensar sobre a nossa própria morte, o
único evento certo que está diante de nós.
A
morte é afastada para lugares apropriados e torna-se a única realidade obscena,
algo que não deve ser visto, contemplado, considerado. Mas, a vida marcada pelo
medo da morte é uma vida em terra de sombras, que contradiz nossa vocação de
sermos filhos/as do dia e da luz. Se a morte nos surpreende apegados/as
apaixonadamente à vida, terminaremos humilhados/as e derrotados/as. Para a fé
cristã, a morte é passo
para a comunhão plena, o último passo. Por isso, a morte não pode ser
escondida, deve ser preparada. A fé revela-nos a morte como momento em que a pessoa se abre
para dimensões nunca antes imaginadas.
Os/as
santos/as e os/as falecidos/as que conhecemos, sobretudo nossos parentes e
ancestrais, são as raízes das quais vivemos. Finados é uma ocasião privilegiada para
aprofundar e reflexão sobre a árvore que nós mesmos somos. Nossa árvore tem
raízes profundas e abre uma copa no alto. Somos seres da terra e do céu. Nossas
raízes são nossos antepassados. Por meio de rituais compartilhamos de seu vigor
e de sua fé.
A
morte não entende de títulos, de êxito ou de fracasso. E de duração entende
algo, mas não muito, porque ninguém tem uma idade garantida, salvo a que temos
neste momento. Não é que devamos viver assustados/as, temerosos de um acidente
ou ameaçados/as por uma doença que nos está esperando atrás de alguma esquina.
Não é que a perspectiva de morrer, ou de perder a quem amamos, tenha de nos
paralisar. Mas sim, deveria nos dar perspectivas para dedicar mais tempo àquilo
que cremos ser importante.
Se
rezamos por e com nossos mortos não é para que Deus
lhes conceda algo que não obteriam sem a nossa intervenção. O amor de Deus por
eles/as ultrapassa infinitamente o nosso. O que buscamos é tomar consciência da
nossa comunhão com eles/as. Todas as suas falhas passadas são também falhas
nossas, e todas as suas virtudes nos pertencem. Em Deus, a humanidade é una
como o próprio Deus é Um.
Como
cristãos, temos o privilégio de olhar a morte de frente. Por quê? Porque
podemos olhá-la com esperança, com a certeza de que a morte não é o final do
caminho, mas a porta para a vida eterna. Jesus Cristo nos precedeu na morte, e
ressuscitou para nos dizer que não tenhamos medo. O fato de assumir com
inteireza o fato de que vamos morrer pode nos ajudar a viver de uma maneira
mais autêntica e, inclusive, mais alegre, pois nos conecta com nossa realidade
de seres finitos.
Somos
todos peregrinos/as e vivemos contínuas travessias
provisórias até fazermos a grande travessia para Deus. Quando
nascemos, recebemos o sopro do Criador; quando morrermos seremos aspirados para dentro de Deus. Nosso destino é
o Coração de Deus: “D’Ele
viemos e para Ele retornamos”. Por isso, somos eternos/as. Já vivemos a eternidade nesta
vida. Descobrimos no coração de nossa vida mortal a eternidade que vive em nós.
Na verdade, a morte nunca fala
sobre si mesma. Ela sempre nos fala sobre aquilo que estamos fazendo com a
própria vida
Pe.
Adroaldo Palaoro SJ