A santidade cristã não passa ao largo das lutas humanas!
No dia 30 de outubro
recordávamos o martírio de Santo Dias da Silva, líder cristão, operário e
militante sindical. No dia 31, a páscoa definitiva de Martinho Lutero, monge
católico que, há exatamente 500 anos, expôs seu sonho e sua reivindicação de
uma Igreja mais evangélica. Dois homens sensíveis ao próprio tempo que, em
diferentes circunstâncias, sonharam e lutaram por uma sociedade mais justa e
uma Igreja mais fiel a Jesus Cristo. Dois cristãos que tinham fome e sede de
justiça e sofreram perseguição. Será que eles não fazem parte da multidão de
servos/as de Deus, cujas frontes foram marcadas com o sinal do Cordeiro?
A verdadeira santidade
se manifesta na vida dos/as missionários/as, das pessoas que ousam sair do
estreito limite dos seus próprios
interesses e se aproximam solidariamente dos últimos; que tecem
pacientemente os fios que fazem do mundo inteiro uma única família; que vão aos
rincões mais distantes ou periféricos para levar a bandeira da paz; que são
movidas por uma insaciável sede de justiça; que choram as dores dos povos de
todas as cores e provam o fel da violência e da perseguição; que transformam a
terra pela mansidão.
Início do milênio,
João Paulo II nos provocava a não nos contentar-nos com pequenas medidas, com voos
rasantes, com ideais nanicos, e pedia que aspirássemos nada menos e nada mais
que a santidade. Esta vocação de todos/as precisa se transformar em desejo
pessoal e em decisões e ações concretas. Como diz São João, nós somos chamados
filhos/as de Deus e já o somos desde agora, mas precisamos crescer na
identificação com Jesus Cristo, gravar no corpo as marcas do sonho que
mobilizou e deu sentido à vida dele.
O Papa Francisco nos
diz que “a santidade é o rosto mais belo da Igreja”, e que não podemos imaginar
nossa missão na terra sem a conceber “como um caminho de santidade”. Mas “não
podemos nos propor um ideal de santidade que ignore a injustiça deste mundo,
onde alguns festejam, gastam folgadamente e reduzem sua vida às novidades do
consumo, ao mesmo tempo em que outros se limitam a olhar de fora enquanto sua
vida passa e termina miseravelmente”. Para
ele, “ser santo/a não significa revirar os olhos num suposto êxtase
prescindindo do reconhecimento vivo da dignidade humana”. Por isso, somos
chamados a “ver a santidade no povo paciente de Deus”, a “classe média da
santidade” (cf. Exortação Gaudete et Exsultate).
Jesus Cristo é por
excelência o santo de Deus e, ao mesmo tempo, o caminho para a santidade. Não
há santidade à margem do seguimento de Jesus Cristo. Realizar a vocação à
santidade é refazer o caminho trilhado por Jesus: amar como Jesus amou; sonhar
como Jesus sonhou; pensar como Jesus pensou; viver como Jesus viveu. Este é o
caminho para que, no meio ou no fim do dia ou da vida, sejamos felizes. Nas
bem-aventuranças Jesus propõe o caminho de santidade e da felicidade que ele
mesmo percorreu demarcando oito sinais ou aspectos importantes e essenciais
dessa caminhada.
As bem-aventuranças,
cuja vivência o Papa Francisco toma como marcas visíveis da santidade,
apresentam oito características da pessoa que percorre este caminho. Esta via
começa com a pobreza e termina com a perseguição, pois o Reino de Deus é dos
pobres e dos perseguidos, a consolação é para os aflitos, a herança é para os
mansos, a saciedade é para os famintos, a misericórdia é para os compassivos, a
visão de Deus é para os puros de coração e a filiação divina é para os promotores
da paz é promessa para o futuro, mas a alegria sem fim do Reino é experiência
concreta dos pobres e dos perseguidos já no presente!
A santidade à qual
todos/as somos chamados/as tem a fisionomia
do discipulado missionário, do despojamento solidário; tem o coração dos que se afligem e choram
compassivamente as dores dos outros; tem o ritmo
inquieto dos que anseiam e pela justiça plena e universal; tem o olhar terno e puro da misericórdia; a ousadia daqueles/as que promovem tem a
paz; e tem a indestrutível alegria de
quem assume o custo de ser livre e libertador. Os santos/as são beatos/as, ou
seja: pessoas plenamente felizes. O caminho da santidade e o caminho para a
felicidade coincidem e se mostram, inclusive, no bom humor.
Deus pai e mãe, fonte de toda santidade: aqui vimos te
pedir a graça de ficar de pé diante do teu Filho, rodeados de testemunhas de
todas as nações, tribos, raças e línguas. Ajuda-nos a superar a doce tentação
de separar, catalogar e hierarquizar católicos e evangélicos, cristãos e
não-cristãos. Que a inexplicável alegria em meio às intermináveis lutas seja
nossa arma e nosso triunfo. E que vejamos os santos e santas mais como
testemunhas de um amor sem limites que como mediadores dos nossos interesses.
Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
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