quarta-feira, 30 de novembro de 2011

POR UMA EVANGELIZAÇÃO REALMENTE NOVA (1)

Um novo Conselho e um novo Sínodo
No dia 21 de setembro de 2010 o Papa Bento XVI criaou o Pontificio Conselho para a Nova Evangelização. Fazem parte das tarefas confiadas a este Conselho: aprofundar o significado teológico e pastoral da nova evangelização; promover e favorecer a difusão e a aplicação do Magistério pontifício relativo a esta temáticas; publicar e incentivar iniciativas de nova evangelização em curso e promover novas formas, comprometendo os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica; estudar e favorecer a utilização das modernas formas de comunicação na evangelização.
Pouco tempo mais tarde, o mesmo Bento XVI anunciou a realização do XIII Sínodo Mundial dos Bispos (previsto para o mês de outubro de 2012, em Roma) com o tema “nova evangelização para a transmissão da fé cristã”. No último 2 de fevereiro de 2011 veio a público o instrumento de trabalho (‘Lineamenta’) para o anunciado Sínodo.
No prefácio do Lineamenta é explicitado o foco da nova evangelização e do próprio Sínodo, infelizmente voltadoa ao mundo e à Igreja do hemisfério norte: “Tendo presente a evangelização como horizonte comum da Igreja, bem como a ação de anúncio do Evangelho ad gentes, (...) a nova evangelização é, antes de mais, endereçada a quantos se afastaram da Igreja nos Países da antiga cristandade.”
O objetivo do Sínodo é assim descrito: “Retomando a reflexão até agora realizada sobre o argumento, a Assembleia sinodal terá por objetivo analisar a situação atual nas Igrejas particulares, para traçar, em comunhão com o Santo Padre Bento XVI, Bispo de Roma e Pastor Universal da Igreja, novas formas e expressões da Boa Notícia que devem ser transmitidas ao homem contemporâneo com renovado entusiasmo, próprio dos santos, alegres testemunhas do Senhor Jesus Cristo.”
No centenário da nossa primeira missão
No contexto da memória dos 100 anos da primeira aventura ad gentes dos Missionários da Sagrada Família, pergunto-me: Como podemos participar da reflexão que este processo sinodal nos possibilita e pede? Certamente, a pior das atitudes seria fazer de conta que isso não tem nada a ver conosco, ou justificar noss indiferença denunciando perspectiva alienante ou pouco justa da proposta.
Creio que a primeira arena de debate na qual podemos entrar, motivados e desafiados por nosso carisma missionário, é o espaço das dioceses nas quais estamos presentes. Certamente as Igrejas particulares aproveitarão a oportunidade e responderão ao apelo da Santa Sé promovendo congressos, seminários, reuniões e encontros para abodar a questão da nova evangelização. E se não o fizerem, devemos nós mesmos tomar a iniciativa.
O segundo espaço de participação é o das nossas comunidades locais. Imagino que seria possível e oportuno dedicar, em cada comunidade, ao menos três dos encontros mensais para debater a questão, pressupondo a leitura do Lineamenta por parte de todos os coirmãos. E o nosso Instituto Superior de Filosofia Berthier poderia dar uma contribuição particular, promovendo seminários ou jornadas sobre o tema.
Várias aproximações
O Lineamenta apresenta uma série de descrições daquilo que seria a nova evangelização, mas evita, como se esperava, definir ou delimitar conceitualmente em que ela realmente consiste. Infelizmente devemos dizer que esta é uma uma fraqueza, pois, apesar de conhecido e amplamente usado, o conceito não goza de univocidade e acaba sendo pouco operacional. Vejamos algumas destas descrições.
“A nova evangelização é, antes de mais, uma ação espiritual, a capacidade de assumir, no presente, a coragem e a força dos primeiros cristãos, dos primeiros missionários. É uma ação que requer, em primeiro lugar, um processo de discernimento acerca do estado de saúde do cristianismo, o reconhecimento das medidas tomadas e das dificuldades encontradas” (§ 5).
“Nova Evangelização é sinônimo de renascimento espiritual da vida de fé das igrejas locais, início de percursos de discernimento das mudanças que afetam a vida cristã nos diferentes contextos culturais e sociais, releitura da memória da fé, assunção de novas responsabilidades e novas energias em vista de uma proclamação alegre e contagiante do Evangelho de Jesus Cristo” (idem).
 “Nova evangelização significa trabalhar nas nossas Igrejas locais para construir caminhos de leitura dos fenômenos que permitam traduzir a esperança do Evangelho em termos práticos. Isto significa que a Igreja se edifica aceitando medir-se com esses desafios, tornando-se cada vez mais a artífice da civilização do amor” (§ 7).
“A nova evangelização é o nome dado a esta nova atenção da Igreja à sua missão fundamental, à sua identidade e razão de ser. Por isso, é uma realidade que não diz respeito apenas a algumas regiões bem definidas, mas é a estrada que permite explicar e pôr em prática a herança apostólica no nosso e para o nosso tempo” (§ 10).
O Documento ressalta que não se trata de fazer de novo qualquer coisa que foi mal feita ou que não funcionou no passado. “A nova evangelização não é uma duplicação da primeira, não é uma simples repetição, mas é a coragem de ousar novos caminhos, para atender às mudanças de condições dentro do qual a Igreja échamada a viver hoje o anúncio do Evangelho (§ 5).
Evangelização como discernimento
Um primeiro conceito do Lineamenta que me parece interessante é o de evangelização como discernimento. Partindo de Paulo e das primeiras comunidades cristãs, o apresenta a nova evangelização como um processo de discernimento. “O processo de evangelização transforma-se num processo de discernimento; o anúncio exige que antes exista um momento de escuta, de compreensão, de interpretação” (§ 3).
O discernimento exige a identificação dos objetos e dos temas sobre os quais fazer chama a atenção e a partir dos quais desperta a escuta e o diálogo recíproco. Estes são os seguintes: o nascimento, a propagação e a afirmação da evangelização nas Igrejas locais; as modalidades com as quais a Igreja realiza hoje a tarefa de transmitir a fé; a forma concreta que assumem no presente os instrumentos dos quais a Igreja lança mão para construir a fé; e os desafios com os quais os cristãos são chamados a confrontar-se (cf. § 4).
Nesta perspectiva, a nova evangelização é uma atitude, um estilo audaz. É a capacidade do cristianismo de saber “ler e decifrar os novos cenários” construídos ultimamente e vigentes do mundo de hoje, a fim de habitá-los e transformá-los em lugares e meios de testemunho e de anúncio do Evangelho (cf. § 6).
O Lineamenta diz que, frente aos cenários que caracterizam o mundo de hoje, a nova evangelização é a “audácia de levar a questão de Deus para dentro destes problemas”, realizando a missão específica da Igreja e mostrando como “a perspectiva cristã ilumina de um modo completamente novo os principais problemas da história”. E nos pede para agir nestes cenários saindo do recinto fechado das nossas comunidades e instituições e aceitando o desafio de entrar em tais fenômenos, levando nossa palavra e testemunho (cf. § 7).
Depois de ressaltar que, no subsolo de uma cultura e uma sociedade caraterizadas pelo secularismo e pelo relativismo, existe uma latente e às vezes explícita sede de Deus e de espiritualidade, que se mostra inclusive nos novos movimentos eclesiais, o Documento diz: “A nova evangelização exorta a Igreja a ter a sabedoria de discernir os sinais do Espírito na ação, dirigindo e educando as suas expressões, em vista de uma fé adulta e consciente” (§ 8).
A missão como transmissão da fé
Um segundo conceito interessante é o de missão como transmissão da fé. “A missão da Igreja é realizar a traditio Evangelii, o anúncio e a transmissão do Evangelho, que é ‘poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê’ (Rm 1, 16) e que, em última análise, se identifica com Jesus Cristo (cf. 1 Cor 1, 24). (...) O Evangelho é uma Palavra viva e eficaz, que realiza o que afirma. Não é um sistema de artigos de fé e de preceitos morais, e ainda menos um programa político, mas uma pessoa: Jesus Cristo, Palavra definitiva de Deus, feito homem” (§ 11).
E a transmissão da fé é tem como objetivo prioritário “a realização deste encontro com Jesus Cristo, no Espírito, para chegar a fazer a experiência do Seu e do nosso Pai”. Assim, “transmitir a fé significa criar em cada lugar e em cada tempo as condições para que o encontro entre os homens e Jesus Cristo aconteça” (§ 11).
Por conseguinte, a transmissão da fé é “uma dinâmica muito complexa que implica totalmente a fé dos cristãos e a vida da Igreja. Ninguém pode transmitir aquilo em que não acredita e que não vive. O sinal de uma fé bem arraigada e madura é, precisamente, o modo natural com que é transmitida aos outros” (§ 12).
Esta tarefa de anunciar de criar as condições para o encontro com Jesus Cristo não está reservada apenas a alguns membros do povo de Deus, mas “um dom feito a todas as pessoas que respondem com confiança ao apelo da fé”. A transmissão da fé “não é uma ação para especialistas, a ser contratada a algum grupo ou a alguém especialmente dotado”, mas a “experiência de cada cristão e de toda a Igreja, que nesta ação redescobre continuamente a sua identidade de povo reunido pelo chamamento do Espírito” (§ 12).
Itacir msf

Nenhum comentário: