A oração alarga a visão
e a ajuda a perseverar na caminhada.
A catequese de
Jesus sobre a oração está inserida no contexto da sua caminhada para Jerusalém,
onde se daria o confronto decisivo entre seu projeto de vida e os poderes
oficiais do judaísmo e do império romano. Depois de relatar o ensino de Jesus
sobre a necessidade de fazer-se próximo de quem está em situação de
vulnerabilidade e nos apresentar sua lição na casa de Marta e de Maria, o
evangelista Lucas começa dizendo que “um dia, Jesus estava orando num certo
lugar”. O escritor sagrado prefere ser genérico, e não oferece maiores detalhes
sobre o conteúdo e a forma dessa oração.
Entretanto, pelo
contexto geral podemos deduzir que a oração de Jesus está claramente a serviço
da fidelidade à sua decisão de construir o Reino de Deus mediante o serviço
profético em favor dos últimos e do enfrentamento das forças que se lhe opõem.
Pelo que deixam entender os evangelhos, nos momentos de oração Jesus vislumbra
e recoloca diante de si o horizonte maior do Reino de Deus, e, assim, confirma
seus passos nesta direção. Mas Jesus não parece preocupado em pedir que os discípulos
rezem: ele simplesmente se retira em oração para confirmar sua identidade e
renovar sua responsabilidade.
Observando a
atitude de Jesus em oração, os próprios discípulos pedem que ele lhes ensine a
rezar. Eles conhecem os ritos e fórmulas de oração ensinados por João Batista e
por outros líderes religiosos, e parece que desejam que Jesus inicie eles nos
ritos e práticas definidas e rígidas de oração. Estariam eles ansiando por
práticas espirituais que os dispensem das exigências da conversão ao Reino, do
despojamento e do dom de si mesmos? Longe de induzir à passividade e a uma
visão mágica da vida, a oração ensinada por Jesus nos ajuda a potencializar os
recursos de que dispomos para construir a vida e transformar a história.
A oração,
especialmente a súplica, supõe, expressa e cultiva a consciência de que nos
falta algo importante. Quem dispõe de todos os poderes e recursos não precisa
pedir nada nem agradecer a ninguém. E quem está absolutamente satisfeito com o
presente não espera nada para a futuro, a não ser um prolongamento repetitivo
do presente. Na oração que pede está
embutido também o senso de urgência e de responsabilidade pessoal e comunitária
diante dos dramas e necessidades do mundo. A oração que Jesus ensina supõe esta
consciência diante da grandeza e da urgência da missão.
A primeira
frase da oração ensinada por Jesus fala de santificar o nome de Deus, e isso significa
esperar, reconhecer e promover ação libertadora de Deus na história. Na
tradição profética, Deus é santificado quando liberta os oprimidos, perdoa os
pecadores, sacia os famintos, repatria os exilados, garante um abrigo aos
deserdados. “Teu nome é santificado quando a justiça é nossa medida”, cantamos
hoje. Por outro lado, Jesus ensina que Deus é um pai bom, a quem podemos
dirigir-nos com confiança, e até a insistir naquilo que necessitamos para fazer
o bem. A atitude de Abraão e a parábola apresentada por Lucas o confirmam.
A oração
funciona também como uma espécie de pedagogia que suscita e alimenta o ardente desejo
do Reino de Deus. “Venha o teu Reino!” Isso significa que a oração cristã nos
insere nos processos de transformação que estão em curso na história, mas que
não se realizam por si mesmos. Esta súplica profunda e envolvente nos ajuda a
evitar duas atitudes pouco cristãs: a conformidade resignada com o mundo do
jeito que ele está; a preocupação escapista com uma indefinida vida depois da
morte. Antes, a oração ensinada por Jesus estimula o ardente desejo do pão
farto e gostoso em todas as mesas, todos os dias.
A oração
cristã é uma ação essencialmente comunitária, e está enraizada no presente
histórico e voltada ao futuro. E isso está patente na segunda parte da oração
que Jesus nos ensinou: os pedidos estão na segunda pessoa do plural e são
expressão da voz de uma comunidade. Mesmo quando oração é feita
individualmente, sempre supõe uma comunhão real, profunda e visceral, não
apenas com os cristãos da comunidade ou mesmo com a Igreja, mas com a
humanidade e a criação inteira. É disso que fala o pedido do ‘pão nosso de cada
dia’ e do perdão das nossas ofensas na medida do perdão que concedemos a quem
nos ofendeu.
Jesus de Nazaré, irmão e amigo da
humanidade e mestre na arte de rezar: ajuda-nos a pedir o que realmente
necessitamos para continuar teu caminho. Tu sublinhas a importância de pedir
com confiança e insistência. Mas qual é o pedido que o teu e nosso Pai não
deixa sem resposta? Ajuda-nos a pedir mais que alimento e saúde, sucesso ou boa
morte. Dá-nos o teu Espírito, sem o qual não há discipulado, profecia,
liberdade e vida verdadeiras. Envia-nos teu Espírito, Senhor, e isso nos basta!
Amém! Assim seja!
Itacir Brassiani msf
Carta de Paulo aos Colossenses 2,12-14| Evangelho
de São Lucas 11,1-13
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