quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

2° Domingo do tempo comum

Crer é assmilar a visão e continuar a ação de Jesus.
(1Sm 3,3-10.19; Sl 39/40; 1Cor 6,13-20; Jo 1,35-42)
Depois de ter sido batizado no rio Jordão, Jesus não foi festejar ou  fazer férias! O batismo marca o amadurecimento da sua consciência messiânica e o início da missão de emancipar e libertar as pessoas dependentes e oprimidas. Somos hoje convidados/as a acompanhá-lo nos primeiros passos da missão, deixando-nos interpelar por seu olhar, suas ações e suas palavras. Hoje ele volta a nós seu olhar acolhedor e questionar e pergunta: “O que você está procurando?” Mas também dirige a cada um/a de nós seu convite: “Venham comigo, participem de minha intimidade e experimentem  meu amor sem fronteiras e minha utopia de vida plena para todos.” Esse convite pode ser experimentado em cada celebração eucarística, na qual ele confirma sua doação sem limites e renova sua aliança conosco.
“Vendo Jesus caminhando...”
João Batista nos diz que não conhecia direito Jesus antes de tê-lo batizado (cf. 1,33). Vendo-o no rio, misturado àquela multidão de gente marginalizada, humilde e bem intencionada, João vislumbrou nele a Sabedoria de Deus na carne humana, o amor de Deus acampado no meio de nós, uma espécie de ‘bode expiatório’ (ou cordeiro de Deus) que carregava no seu corpo as dores e pecados da humanidade. E João Batista fala aberta e claramente disso aos discípulos que o seguiam.
Mas parece que a passagem entre a experiência que Jesus fez por ocasião do batismo e a sua atividade libertadora não foi nem rápida, nem automática. Antes, foi um lento processo de busca e discernimento no qual o próprio João Batista pode ter colaborado. Um dia desses, vendo Jesus que caminhava solitário e meditativo nos arredores de Betânia, perto do rio Jordão, Jão chamou a atenção daqueles que estavam com ele: “É dele que eu falei...”
“Olhem aí o Cordeiro de Deus...”
As palavras que João Batista usou para apresentar Jesus naquela ocasião se tornaram fórmula repetida em todas as celebrações eucarísticas: “Eis o Cordeiro de Deus, aquele que tira o pecado do mundo...” Mas pode ocorrer que, à força da repetição desatenta e descontextualizada, essas palavras acabem sendo esvaziadas em seu conteúdo provocador. Qual o significado da imagem do “cordeiro” para nossa cultura ocidental e urbanizada?
As palavras são escolhidas com muito cuidado. João não apresenta Jesus como Messias ou líder ungido pelo Espírito para resgatar o povo, nem como Rei de Israel, como Filho de Deus ou como Senhor. Busca na tradição ritual do povo de Israel a figura do Cordeiro que era sacrificado substitutivamente para desculpar os pecados da comunidade. A figura do cordeiro sublinha, substancialmente, a mansidão, a inocência, a vítima solidária.
Mas, ao apresentar Jesus como Cordeiro, João acrescentou que ele é aquele “que tira ou carrega o pecado do mundo”. Assim, Jesus não está aí para, em nome de Deus, acusar os homens e mulheres de sua insuperável condição de pecadores, mas para atrair sobre si mesmo a violência que tende a explodir sobre os semelhantes e para abrir um caminho de liberdade e de comunhão. O Messias esperado age mais como amigo que como juiz, mais como irmão que como acusador.
“Os dois discípulos ouviram esta declaração de João e passaram a seguir Jesus.”
Tendo ouvido as breves palavras com as quais João apresentou aquele Jesus até então incógnito, dois dos discípulos de João o deixaram e se puseram a caminho, seguindo de perto os passos de Jesus. Parece que se aproximaram sem dizer nada, um pouco curiosos, um pouco tímidos. Quanto tempo teriam seguido Jesus desse modo? Quanto tempo teria sido necessário para que pudessem entrar na sua intimidade e conhecê-lo profundamente?
Sabemos que um daqueles dois discípulos da primeira hora se cham André e é irmão de Simão, que conhecemos como Pedro. André e o outro entram no caminho de Jesus por sugestão de João Batista. Não terá sido fácil deixar o mestre já conhecido e sua pregação clara e interpeladora para seguir um jovem até então desconhecido. E Jesus nem os havia chamado, como o faziam comumente os mestres...
Num dado momento, percebendo que aqueles dois o seguiam já há algum tempo, Jesus se voltou e lhes perguntou: “Que procurais?” Não era um chamado insistente, como aquele que o jovem Samuel havia escutado, mas uma pergunta desconcertante. A questão não era sobre Jesus – uma pergunta ou uma declaração sobre si mesmo – mas  sobre os interesses e expectativas dos jovens discípulos. Estranho!
A resposta da dupla foi curta e objetiva: “Mestre, onde moras?” Eles desejam passar ao seu campo de influência, aprender a partir da convivência e da experiência, participar da sua intimidade e da sua missão. E Jesus os convida a ir e ver, a descobrir como nele a Palavra de Deus se tornava carne e acampava na humanidade. E eles foram , começaram a viver com ele e nunca mais voltaram atrás.
 “Encontramos o Cristo!.”
Aquela experiência inicial foi tão marcante que, quase 70 anos depois, eles não haviam esquecido a hora. Foi uma das  travessias mais importantes da vida daqueles jovens. Eram 4 horas da tarde! Benditas as palavras de João Batista! Bendita a liberdade de André e seu amigo! Bendito o olhar de Jesus! Bendita aquela desconcertante pergunta! Bendita experiência que mudou o rumo da vida!
Profundamente impressionado com aquilo que viram e experimentaram, os dois jovens discípulos espalharam a notícia. André foi buscar seu irmão Pedro, que como ele, tinha vindo de Betsaida para escutar e seguir João Batista, mas não estava presente quando este apresentou-lhes Jesus. André anunciou a Simão a boa notícia: “Encontramos o Cristo!” Para André, o Ungido pelo Espírito era também o Cordeiro que sinaliza a páscoa-liberdade, e ambos se identificavam com Jesus de Nazaré.
“Tu és Simão, flho de João. Tu te chamarás Pedro.”
André levou Simão e o apresentou a Jesus. E Jesus dirigiu a ele um olhar profundo, um olhar capaz de ver a alma. Mas é impressionante como Simão se comporta: nenhum movimento, nenhuma palavra, nada.  Parece uma estátua de pedra! É certo que ele havia rompido com o status quo e esperava a vinda de um Messias, e por isso deixara Betsaida e procurara o Batista. Mas não deixa de ser intrigante sua (falda de) reação diante da notícia de André e diante da presença, do olhar e da palavra de Jesus....
Frente a um Simão passivo e calado – resistente! –  e depois de olhá-lo antentamente, Jesus apenas declara: “Tu és Simão, filho de João. Tu te chamarás Pedra.” Jesus ressalta os laços que unem Pedro e João Batista (filho/discípulo de João) e sua resistência e dureza (pedra). Ele deverá fazer a passagem da idéia de um Messias guerreiro para  um Messias Cordeiro. Será um processo difícil que terá na paixão e morte de Jesus seu momento crítico, e só será consolidado depois da ressurreição.
“O que procurais?”
Deixemos nosso Pedro em paz, junto com seu irmão André. Tomemos o Evangelho por aquilo que ele é, uma Palavra de Deus dirigida hoje a nós. Como está a qualidade da nossa escuta da Palavra de Deus? Não estaríamos repetindo anacronicamente a criancice de Samuel que ‘dormia’ na casa de Deus mas não conhecia sua Palavra? Padres, religiosos/as e agentes de pastoral corremos o risco de  dormir na Igreja, de ‘domesticar’ o Mistério e protegermo-nos das suas interpelações.
Bem ou mal, foram outros/as que nos apresentaram Jesus Cristo e estamos nesse caminho há muitos anos. Mas hoje ele se volta a nós e pergunta: “O que é que você está procurando?” Precisamos examinar com profundidade nossas expectativas a respeito de Jesus Cristo. Não podemos deixar de avaliar criticamente os interesses que nos mantém na comunidade cristã, pois nem todos são aceitáveis para homens e mulheres maduros, e nem todos são lícitos para discípulos/as de Jesus.
Amado e querido Jesus, carpinteiro em Nazaré e Cordeiro de Deus: Como André, queremos te conhecer entrar na tenda que armaste  entre os pobres. Livra-nos da  passividade e do silêncio resistentes de Pedro. Salva tua Igreja da rigidez, do fechamento e da autosuficiência demonstrada por ele, verdadeira pedra de tropeço para aqueles/as que te buscam com coração sincero. Acorda-nos da ilsusão de sermos maioria, do repouso tranquilo sobre as glórias do passado, da falta de atenção à tua Palavra viva e eficaz. Acolhe-nos na tua intimidade para que vejamos e acreditemos! Assim seja! Amém!
Pe. Itacir Brassiani msf

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