quinta-feira, 7 de julho de 2016

ANO C – DÉCIMO QUINTO DOMINGO DO TEMPO COMUM –10.07.2016

A compaixão resgata a humanidade e suscita a eternidade!

O Verbo de Deus não cessa de fazer-se carne, mas nós estamos sempre às voltas com a tentação de menosprezar este substantivo em nome de muitos adjetivos. O essencial da vida cristã, mesmo sendo exigente, não é complicado, não se esconde em difíceis fórmulas ou teoremas. Precisamos livrar-nos da mania dos especialistas: levantar sempre novas perguntas, acrescentar novos pontos na discussão já esgotada, formular conceitos que nos mantêm soberanamente inativos e indiferentes. Agrada-nos esquecer que Deus ama a terra e a humana carne, e preferimos levantar questões sobre a vida eterna.
Muitas das perguntas que fazemos não passam de estratégias para desviar da questão central. Isso acontecia também no tempo de Jesus. Ele acabara de enviar os discípulos e discípulas – muitos de origem samaritana – em missão. Eles voltavam com o coração cheio de alegria e de novidades para partilhar. Haviam anunciado a proximidade do Reino de Deus, curado doentes, reconstruído a paz; haviam se hospedado nas casas de pessoas desprezadas e sentado à mesa com elas. Para as pessoas muito espiritualistas, tudo isso parecia ser coisas demasiadamente corporais, materiais e terrenas.
Então, entre decepcionado e escandalizado, um doutor da lei procura testar a ortodoxia de Jesus e recolocá-lo nos trilhos da verdadeira religião. Com a pergunta pela vida eterna, o teólogo do judaísmo quer afastar Jesus das preocupações com a vida cotidiana das pessoas. Considerando também a passagem de Lucas 18,18-30, parece que são especialmente as pessoas que não querem se comprometer com os irmãos e irmãs que levantam a preocupação pela vida eterna. Como se a religião fosse uma espécie de droga para nos afastar das dificuldades da vida presente...
Sabendo da erudição teológica, da estreiteza de horizontes e da má intenção do doutor da Lei, Jesus não se dá ao trabalho de responder à sua pergunta. Pede que o próprio que apresenta a questão a responda, o que ele faz com absoluta precisão: a Lei manda amar a Deus com todo o coração, com toda alma e com toda a força e ao próximo como a si mesmo. Jesus apenas chama a atenção para a dimensão prática desta doutrina: “Respondeste corretamente. Faze isso e viverás.” O segredo da vida está na prática e não na prédica! Vejam bem: Jesus não diz que este é o caminho para assegurar a vida eterna, uma vida suplementar e superior depois ou à margem desta vida, mas simplesmente um caminho de vida.
Com a primeira pergunta, o doutor da lei queria testar a ortodoxia de Jesus, mas, com a segunda, pretende se justificar. A questão do amor a Deus é mais abstrata, manipulável e pouco mensurável. O amor ao próximo é mais concreto, mas as autoridades religiosas discutiam incansavelmente sobre a quem se aplica o apelativo ‘próximo’. A doutrina oficial praticamente identificava o próximo com quem pertencia ao judaísmo, com os membros do próprio grupo. Por trás da tentativa de justificar a estreiteza do seu mundo, o doutor da lei escondia a implícita intenção de recriminar a prática inclusiva de Jesus.
Jesus evita a discussão teórica sobre quem é o próximo. Ele prefere propor uma situação concreta. Há um homem (não se diz se é judeu o pagão) agredido, caído na estrada, necessitado de socorro. Um sacerdote e um levita passam pelo local, enxergam a pessoa assaltada e ferida, mas não tomam conhecimento de suas necessidades, afastam-se e seguem o caminho exclusivo da atenção às práticas religiosas e aos códigos legais. Afinal, aquele sujeito caído na estrada poderia ser alguém que deixara a santa Jerusalém e abandonara a comunidade de fé...
Aparece então um homem que vivia na Samaria e que, movido pela compaixão, se aproxima da pessoa ferida e, sem perguntar se é ou não é seu próximo, cuida dos ferimentos, carrega-a no próprio animal e convoca outros a completar o cuidado. Uma pessoa que não vinha do Templo e carregava na própria carne a ferida do desprezo e da exclusão foi capaz de perceber a necessidade e se aproximar de uma outra pessoa menosprezada e ignorada. O critério que orientou sua ação não foi a pertença religiosa mas a necessidade humana.  “Qual dos três foi o próximo do homem que caiu nas mãos dos assaltantes?”
Jesus, divino samaritano que vens ao nosso encontro, primogênito da criação e cabeça de um corpo formado de discípulos e discípulas. Somos a Igreja, teu corpo vivo na história e não queremos ter outro caminho que o teu. Ajuda-nos a seguir teus passos e as batidas do teu coração, caminhando compassivamente ao encontro das pessoas consideradas indignas ou inúteis pelos sistemas que se guiam pelo poder e pelo lucro. Que nossos passos jamais se afastem daqueles que só podem contar conosco. Seria este o segredo de uma vida plena de sentido e de luz? Assim seja! Amém!

Itacir Brassiani msf
(Deuteronomio 30,10-14 * Salmo 18 (19) * Carta aos Colossenses 1,15-20 * Evangelho de S. Lucas 10,25-37)

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