terça-feira, 19 de julho de 2016

Descolonizaçao

Descolonizar é preciso!
Continuamos aqui a partilha daquilo que vem acontecendo no Curso de Aperfeiçoamento da Ação Missionaria, que está sendo desenvolvido em Santa Cruz de la Sierra, Bolívia. Completamos aqui o relato sobre o primeiro dia, dedicado a alguns elementos da história da América Latina, dirigido pelo professor José Luis Lopez. Eis aqui algumas ideias.

Hoje está em curso uma ideia de que a história se move em vista da novidade. Outros, querem nos convencer de que a história é caótica. Mas temos hoje também o marco teórico da descolonização, uma perspectiva que lança raízes nas teorias pós-coloniais e na teoria da dependência, assim como nas mobilizações indígenas e populares dos últimos 40 anos e na filosofia e na teologia da libertação. Este marco teórico tem muito a ver com a América Latina, e parte da constatação de que a história normalmente é contada na perspectiva dos vencedores, e que devemos recuperar a voz dos vencidos e submetidos para que eles tenham seu lugar no palco da história de hoje.
As teorias descolonizadoras não são uma lamentação pelos males da história, não são teorias que se preocupam unicamente à identidade indígena ou afrodescendente, com estas “minorias” consideradas pouco significativas no atual momento do continente latino-americano. Também não são teorias socialistas ou esquerdistas. São uma opção interpretativa da realidade e uma opção de intervenção na realidade, um projeto epistêmico, político e ético. Uma orientação de ‘desaprendizagem’ (de mudança), que articula as lutas de resistência às práticas de ‘re-existência’.
Que leitura da realidade latino-americana faz a teoria da descolonização? Oferece uma ideia transversal para todos os procedimentos, uma tendência, uma perspectiva, uma orientação. Um primeiro ponto é entender que existe um novo padrão moderno e colonial de poder, o sistema-mundo moderno capitalista, cuja base é a articulação dos recursos naturais, do trabalho e seus produtos em torno do capital e do mercado mundial. Para este, ideia de controle da economia como expansão, de vencer limites territoriais e metas de produção e venda é fundamental. Para isso, é preciso vencer, eliminar ou anular os competidores, reais ou potenciais. Segundo Immanuel Valerstein, o capitalismo se desenvolve à base do controle de terras e recursos e do desenvolvimento e controle de variadas formas de exploração do trabalho. Por sua parte, as teorias descolonialistas afirmam que o capitalismo moderno tem seu berço na expansão colonialista e a decorrente exploração econômica e humana que dela decorre.
Como se instala historicamente este novo padrão de poder? O primeiro vetor é a classificação social a partir da ideologia de raça. O segundo, a inserção da ideologia da modernidade, a partir dos mitos de civilização e de progresso (século XVI). Estes mitos não foram discutidos posteriormente! Juan Ginés de Sepúlveda (1547) afirmava que é justo e natural o domínio dos homens probos e prudentes (humanos, superiores) sobre os nativos latino-americanos (não humanos, inferiores), como dos adultos sobre os menores e dos homens sobre as mulheres. Assim, nomeado explicitamente ou não, o racismo se estabelece como forma de definir superioridades e inferioridades humanas. A estrutura esquemática de qualificação humana pode ser assim apresentada: índio-europeu; cristão-pagão; civilizado-selvagem; desenvolvido-subdesenvolvido; moderno-tradicional.

Como se instala a ideologia da modernidade? Para Sepúlveda, os indígenas recebem dos colonizadores a civilização, que os faz humanos e vale mais que o ouro que lhes roubam ou a violência que lhes impõem. A colonização é um sistema de dominação que articula as esferas religiosa, cultural, social, afetiva, educacional, política e econômica. Dominação colonialista é a submissão da vontade do colonizado à vontade do colonizador. É um processo de negação da humanidade do outro, do diferente. Esvaziado de si mesmo, o oprimido começa a imitar o opressor, e a colonização passa a operar mediante a sedução. Razão-civilização e raça se correspondem. A superioridade racial se compreende como superioridade de uma civilização global para a qual devem encaminhar-se todos os povos.
Itacir Brassiani

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