O empenho cristão pelo justo ordenamento da sociedade
“O empenho pela defesa da vida e dos
direitos da pessoa, pelo justo ordenamento da sociedade, pela dignidade do
trabalho, por uma economia justa e solidária e pela ecologia integral fazem
parte da missão evangelizadora da Igreja”. Esta é uma das afirmações do Documento
final do Sínodo dos Bispos da Igreja Católica Romana, concluído em outubro de
2024, depois de três anos de um intenso processo de escuta e reflexão.
Mesmo sem ser uma novidade, esta
afirmação é importante, dada a intensa atividade de alguns grupos que
questionam a manifestação e a intervenção dos cristãos no campo social,
político e ambiental. Esquecem estes que a primeira intervenção histórica de
Deus foi o apoio ao movimento de desobediência dos escravos hebreus ao poder do
faraó e às lutas para conquistar terras que antes pertenciam a reis de pequenas
cidades-estados.
Não é possível esquecer o caráter
político da condenação de Jesus à morte na cruz, pois esta era a pena imposta
pelo império romano a quem se rebelasse contra seu domínio e aos escravos
fugitivos. “Encontramos esse homem agitando a nossa nação e proibindo pagar
impostos a César” dizem os chefes do judaísmo ao governador (cf. Lc 23,2). E o
crime imputado a Jesus ficou gravado no alto da cruz: “Jesus Nazareno, Rei dos
Judeus”.
Portanto, o pronunciamento das Igrejas
cristãs sobre questões políticas e econômicas faz parte da sua missão, e não
caracteriza ingerência em terreno alheio. O que é inaceitável é as igrejas
atuarem na seara política para assegurar privilégios para si mesmas ou para
impor a todos os cidadãos uma pauta moral que é própria de uma denominação
religiosa, ou orientar-se pela tática de apoiar incondicionalmente os grupos
que exercem o poder.
Ancorado nesta rocha firme da tradição
cristã volto ao debate sobre o aumento da carga tributária sobre as operações
financeiras e sobre a taxação dos grandes lucros, objeto de acirradas disputas
no Congresso e na grande imprensa. A rejeição do decreto do Executivo pelo
Congresso se baseou em meias-verdades ou mentiras inteiras, e foi celebrado
como uma derrota imposta ao governo, como se a política fosse um jogo.
O Congresso atual não está disposto a aceitar
mudanças que afetem privilégios da minoria, e o único ajuste que defende é o
corte nos gastos sociais, diz o economista Mauricio Weiss. Para o historiador e
economista Pedro Faria, os setores que propuseram e aprovaram a derrubada do
decreto sabem que o aumento da taxa do IOF não prejudica os pobres, e o que
eles querem mesmo é que o ajuste fiscal mantenha os juros altos e os subsídios
fiscais às empresas, e diminua o investimento do Estado nas políticas sociais.
O que fazer diante disso, além de gravar
o nome dos que deram seu voto para aprovar essa infame revogação? Informar-se
bem; exercer o nosso direito de eleger deputados, senadores, governadores e
presidentes que defendam leis e políticas que beneficiem os setores sociais
mais vulneráveis; e engajar-se na reflexão sobre a função social e cidadã dos
impostos e sobre passos e medidas viáveis para uma maior justiça tributária,
que faça recair sobre os mais ricos uma maior responsabilidade tributária. Isso
é empenho pelo justo ordenamento da sociedade e por uma economia justa e
solidária.
Dom Itacir
Brassiani msf
Bispo Diocesano de
Santa Cruz do Sul
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