quarta-feira, 16 de abril de 2014

Missa da Pascoa de Jesus (Ano A - 2014)

Nossa verdadeira liberdade está com Cristo, em Deus!

A festa cristã da Páscoa celebra o reconhecimento de Jesus – o profeta perseguido e assassinado, o irmão e servidor da humanidade – como Filho de Deus. Proclama que nele Deus vence todas as formas de morte, desde a morte física dos indivíduos até a morte progressiva e massiva que resulta das estruturas iníquas e dos poderes despóticos, passando pelo dolorido flagelo do tráfico de seres humanos. A páscoa anuncia que Jesus, a pedra sem utilidade e problemática na construção do mundo, foi considerado por Deus como pedra fundamental da construção de um mundo novo.
É isso que escutamos no testemunho entusiasmado e corajoso de Pedro. Ele recorda que Jesus andou por toda parte fazendo o bem e agindo sem medo, apesar da violência que havia levado João Batista à morte. Pedro anuncia que Deus estava com Jesus, inclusive no vazio e escuro da cruz, quando parecia havê-lo abandonado. Foi o próprio Deus que o ressuscitou dos mortos e transformou em juiz aquele que fora réu de morte. E os discípulos da primeira hora, apesar da dificuldade de acreditar nele e de tê-lo abandonado, são constituídos testemunhas e pregadores desta Boa Notícia.
A Páscoa de Jesus de Nazaré e dos cristãos celebra as infinitas possibilidades escondidas na vida de cada criatura e de cada pessoa, e também na história da humanidade. Afirma que a última palavra não será do discurso frio daqueles que impõem sua injusta ordem e mandam calar os profetas. Proclama que a ação realmente eficaz e grávida de futuro é aquela que estabelece a absoluta superioridade do outro, da vítima, do pequeno. Evidencia que a direção certa e o sentido da vida estão no esquecimento de si, no fazer-se semente de uma outra vida, no viver uma liberdade que se faz solidariedade.
E é claro que esta não é uma realidade que se manifesta apenas depois da morte. Paulo afirma surpreendentemente que os cristãos já foram ressuscitados. Ele fala do dinamismo pascal do nosso batismo, que possibilita e requer a passagem de uma vida fechada para uma vida plena e solidária. “Procurem as coisas do alto”, exorta Paulo. E isso significa assumir um estilo de vida centrado no dom e no amor, no serviço e na partilha, no compromisso perseverante e generoso com a gestação de um outro mundo, na conversão permanente da Igreja ao Evangelho de Jesus Cristo.
Mas a ressurreição de Jesus não é algo que se impõe com força de evidência, que vem acompanhado de manifestações potentes. Começa com uma sepultura vazia, diante da qual Maria Madalena foge alarmada para avisar Pedro e João. Também eles correm e, chegando, entram na sepultura vazia e vêem os panos e o sudário. Somente mais tarde, Madalena abrirá os olhos, quando será chamada pelo nome. E os discípulos desanimados encontrarão Jesus com fisionomia de peregrino no caminho de Emaús. E os outros apóstolos o reconhecerão numa manhã cinzenta, depois de uma pesca frustrada...
O dia já havia amanhecido, mas, na cabeça de Maria Madalena e dos demais discípulos e apóstolos, a experiência do fracasso pairava como escuridão intransponível. Só muito lentamente eles foram percebendo que os lençóis estendidos não estavam lá para cobrir um cadáver, mas para acolher as núpcias de uma nova aliança. O sudário sim, depois de cobrir a cabeça de Jesus, estava à parte e envolvia totalmente o templo, o lugar onde a morte era tramada e deliberada. Precedido e encorajado por Maria Madalena, o discípulo amado entrou na sepultura escura e fria, “viu e acreditou”.
A Páscoa de Jesus de Nazaré inaugura a nova criação. Não se trata de uma simples correção do passado, de perdão dos pecados, de vitória sobre a morte física e individual. Jesus de Nazaré, o ressuscitado que traz no corpo as marcas dos pregos e da lança, que passou fazendo o bem, é o Homem Novo, o primogênito de todas as criaturas e o irmão de todos os homens e mulheres. Os discípulos e discípulas se reúnem em torno de sua memória e organizam comunidades que continuam sua pró-existência e desconhecem limites de sangue, de raça ou de qualquer outra ordem.
Deus Pai e Mãe, útero sagrado no qual a vida é gerada e regenerada: obrigado pela luz e pela força da ressurreição de Jesus Cristo que hoje estamos celebrando. Aqui renovamos a convicção de que o Filho do Homem e Irmão dos Pequenos se tornou juiz dos vivos e dos mortos, dos que escravizam e dos que são escravizados, dos que morrem e dos mandam matar. Hoje redescobrimos nossa vocação de ser semente que morre para ser fecunda, e voltaremos às nossas casas caminhando e cantando, para demonstrar nossa alegria e para espantar o medo. Que a vida seja sempre mais forte que a morte! Assim seja! Amém!

Pe. Itacir Brassiani msf
(Atos dos Apóstolos 10,34-43 * Salmo 117 (118) * Carta aos Colossenses 3,1-4 * João 20,1-9)

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