quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

SEGUNDO DOMINGO DO ADVENTO (ANO C – 06.12.2015)

Uma profunda e abrangente mudança está em curso...

O Advento não é um simples tempo espera, ele sugere mudanças. A liturgia do segundo domingo nos convida a olhar para as experiências dos nossos antepassados e celebrá-las como próprias, em vista de uma escuta atenta e responsável: “Preparem o caminho!... Endireitem suas estradas!...” Nossa atenção é requisitada pelo presente, e exclamamos: “Que Javé mude a nossa sorte, como as torrentes do Negueb!” A profética convicção de que o lobo e o cordeiro pastarão juntos nos convoca a práticas concretas de mudança, a fim de que as pessoas humilhadas sejam elevadas.
O profeta Baruc atua num tempo difícil. O povo hebreu vivia disperso em meio a uma cultura hostil. A capital e seu suntuoso templo eram um monte de escombros. A nação não existia mais. Era um tempo de luto e de lamentação, sem esperanças, como o é hoje para as vítimas do “acidente” em Mariana e para os refugiados da fome na Africa e das guerras no Oriente Médio. Neste contexto, as palavras do profeta soam como um delírio: “Jerusalém, tire a roupa de luto e aflição e vista para sempre o esplendor da glória que vem de Deus. Vista o manto da justiça de Deus e a coroa gloriosa do Eterno...”
Os tempos sombrios e desoladores escondem no próprio ventre sementes que pedem para germinar e transformam os desertos em jardins. A gestação da nova humanidade e da nova criação é compromisso firmado pelo próprio Deus, e começa com o reconhecimento da nossa responsabilidade pelos males que agridem suas amadas criaturas. É o próprio Deus que nos anima, orienta e sustenta. Ele nos batiza com novos nomes e nos convoca a escalar os muros, olhar em todas as direções e contemplar um povo novo que vai sendo reunido com gente que vem de todos os lados.
Isso significa que está em curso um amplo, profundo e misterioso processo de gestação e de mudança, de dispersão dos orgulhosos e de libertação dos humilados. O que precisamos é assumi-lo e cuidar dele como a mãe cuida da criatura que carrega no seio, que depende dela mas não é sua propriedade. Importa ajudar Deus na tarefa de rebaixar colinas e aterrar vales, de aplainar o chão para facilitar seu crescimento e sua caminhada. E aqui podemos entender a relevância da atividade e das palavras proféticas de João Batista...
O profeta do Jordão sabe que é apenas o precursor de Algo melhor e de Alguém maior que ele. Sua missão transcorre num tempo em que coexistem e se articulam os poderosos da Judéia, de Roma e do Templo. Ele rompe com Jerusalém, capital da terra prometida que acabara se tornando centro de opressão, e se retira para o deserto, lugar da impotência, da resistência, do êxodo e da transformação profunda. É esta radicalidade profética que o faz grande, maior que os maiorais do seu tempo. Convicto de que o tempo estava maduro para mudanças profundas e amplas, João convoca seu povo a arregaçar as mangas: “Preparem o caminho do Senhor, endireitem suas estradas!”
Para João, a preparação deste caminho começa por endireitar as sinuosas curvas construídas pelos doutores da lei. Estas curvas dificultam ou impedem aos mais pobres e humildes o acesso à salvação, ou seja, ao reconhecimento da sua  humana dignidade e dos seus direitos mais elementares. Ele afirma que Deus está comprometido neste trabalho e faz a sua parte: aterra os vales, aplaina as colinas, endireita as curvas e tapa os buracos. Ou seja: vê a humilhação do seu povo, estende sua misericórdia a todas as gerações, derruba os poderosos e eleva os humildes (cf. Lc 1,48-55).
Horizontes amplos e utopias de grande alcance são importantes. É absolutamente necessário perceber que o universo inteiro aspira e conspira para que a vida seja possível e abundante. Afastando-se de nós na mesma medida em que delas nos aproximamos, as utopias cumprem o papel essencial de nos manterem na caminhada. Mas elas também nos chamam à conversão, a mudanças profundas e concretas. Esta conversão começa com mudanças no modo de ver a vida, mas precisa também ser traduzida em práticas concretas e cotidianas no âmbito pessoal, familiar, comunitário e societário.
Deus querido, pai e mãe que amas e elevas os humilhados: ajuda-nos e acolher e viver o espírito do Advento, melhorando nosso viver de modo corajoso e radical. Que nossa fé e nosso amor cresçam e amadureçam em concretude e perspicácia. Que tuas Igrejas e cada um de nós nos dediquemos mais a abrir portas e janelas que em erguer muros; mais a elevar as pessoas humilhadas que a construir torres; mais na abertura de caminhos de encontro que na formulação de dotrinas que produzem desencontros. E assim estaremos preparando entre nós um lugar para o teu Filho. Assim seja! Amém!

Itacir Brassiani msf
(Profeta Baruc 5,1-9 * Salmo 125 (126) * Carta aos Filipenses 1,4-11 * Evangelho de São Lucas 3,1-6)

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