quinta-feira, 22 de março de 2018

O Evangelho dominical - 25.03.2018 (Domingo de Ramos)


IDENTIFICANDO-SE COM AS VÍTIMAS
Nem o poder de Roma nem as autoridades do Templo puderam suportar a novidade de Jesus. A Sua forma de entender e de viver Deus era perigosa. Jesus não defendia o Império de Tibério e chamava a todos para procurar o reino de Deus e a Sua justiça. Não lhe importava quebrar a lei do sábado nem as tradições religiosas. Só lhe preocupava aliviar o sofrimento das pessoas doentes e desnutridas da Galileia.
Não o perdoaram por isso! Ele identificava-se demasiado com as vítimas inocentes do Império e com os esquecidos pela religião do Templo. Executado sem piedade numa cruz, Nele agora se nos revela Deus, identificado para sempre com todas as vítimas inocentes da história. Ao grito de todos eles se une agora o grito de dor do próprio Deus.
Nesse rosto desfigurado do Crucificado revela-se um Deus surpreendente, que quebra as nossas imagens convencionais de Deus e coloca em questão toda a prática religiosa que pretenda dar-lhe culto esquecendo o drama de um mundo onde se continua a crucificar os mais débeis e indefesos.
Se Deus morreu identificado com as vítimas, a Sua crucificação converte-se num desafio inquietante para os seguidores de Jesus. Não podemos separar Deus do sofrimento dos inocentes. Não podemos adorar o Crucificado e, ao mesmo tempo, viver de costas ao sofrimento de tantos seres humanos destruídos pela fome, pelas guerras ou pela miséria.
Deus continua a interpelar-nos desde os crucificados dos nossos dias. Ele não nos autoriza continuar vivendo como espectadores desse sofrimento imenso alimentando uma ingênua ilusão de inocência. Temos de rebelar-nos contra essa cultura do esquecimento que nos permite isolar-nos dos crucificados, deslocando o sofrimento injusto que há no mundo para um «afastamento» onde desaparece todo o clamor, gemido ou choro.
Não podemos encerrar-nos na nossa «sociedade de bem-estar», ignorando essa outra «sociedade do mal-estar» em que milhões de seres humanos nascem só para desaparecer em poucos anos de uma vida que só foi de sofrimento. Não é humano nem cristão instalar-nos na segurança, esquecidos de quem só conhece uma vida insegura e ameaçada.
Quando os cristãos levantamos os nossos olhos até ao rosto do Crucificado, contemplamos o amor insondável de Deus, entregue até à morte para a nossa salvação. Se olhamos mais detidamente, depressa descobrimos nesse rosto o rosto de tantos outros crucificados que, longe ou perto de nós, estão reclamando o nosso amor solidário e compassivo
José Antonio Pagola
Tradução de Antonio Manuel Álvarez Perez

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