sábado, 5 de maio de 2018

Seminário sobre a Vida Religiosa (1)


O mundo que nos toca

Vivemos tempos escatológicos. Esta foi a afirmação do professor Sérgio Coutinho na conferência de abertura do Seminário da Vida Consagrada, que está sendo realizado em Aparecida (SP) e reúne mais de 500 religiosos e religiosas vindos de todo o Brasil.
Ele lembrou que, desde 2008, o mundo enfrenta uma crise, primeiro financeira, que partiu dos EUA e nos alcançou. E levantou perguntas: As coisas retornarão ao seu curso normal proximamente? Ou estaríamos chegando ao fim da globalização neoliberal, de uma etapa do capitalismo? Chegamos ao fim dos tempos, ou a fim de um tempo?
Segundo Coutinho, que cita Slavoj Zizek, vivemos tempos escatológicos, o fim de um tempo. O fim de um tempo não é um tempo de medo nem de esperança, mas um tempo de ação. A escatologia apocalíptica nega o mundo e espera pela intervenção divina, mas a escatologia ético-sapiencial é a nega este mundo por uma ação capaz de transformá-lo.
Mas, se é verdade que estamos no fim de um mundo, afirma o historiador, não nos despedimos dele sem mais. Como sociedade, precisamos passar pelo ritual do luto, lamentar a perda, o fim, como o fazem as pessoas diante de morte de alguém querido. E isso acontece, segundo alguns estudiosos, em cinco atitudes: negação, raiva, barganha, depressão, aceitação.
A postura de negação vem se faz evidenciar no retorno ao protecionismo econômico, das políticas anti-imigratórias, na tentativa de voltar ao período pré-liberal.  A atitude de raiva se mostra na onda de violência desmedida contra os grupos sociais que são identificados como inimigos ou ameaçadores, tanto sujeitos religiosos como afetivos e sociais; a própria diferença passa a ser vista como ameaça e perigo, e gera reações raivosas.
A reação da barganha se faz ver na procura brechas e oportunidades para que o capitalismo sobreviva. As relações trabalhistas passam pela precarização, pela exclusão e cancelamento de direitos, de exploração suplementar: trabalho a domicílio, estágio, trabalho por peças, empresas de alocação de mão de obra, regime de trabalho intermitente, microempresário individual, trabalho voluntário, enfim: a “uberização” do trabalho.
Como nem o paradoxo das redes sociais consegue exorcizar as novas formas de desencanto subjetivo, vem um estado de depressão social. A falsidade da promessa neoliberal do bem-estar e da igualdade se derramando sobre o mundo e as pessoas levou a sintomas de depressão. Nasceu uma sociedade do do desencanto, do colapso da confiança, da crença de que todos os líderes são corruptos, estúpidos e incapazes. Criou-se um individualismo rasteiro, o ativismo do sofá, desvinculado de ações que podem mudar. Nasceu um universo fechado, individual, inoculado, homogeneizado.
Mas isso não é o fim. Há sinais de ressurgimento da subjetividade emancipatória e de práticas da democracia transformadora. A emergência de modos mais solidários de produzir, consumir e distribuir engendra novos processos de subjetivação, numa perspectiva emancipatória, com coletivos potentes. Será que a vida consagrada representa e potencializa esta possibilidade?, pergunta Coutinho. O trabalho associativo, cooperativo e auto gestionário é uma dessas expressões.
Itacir Brassiani msf

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