quinta-feira, 28 de março de 2019

ANO C | TEMPO DE QUARESMA | QUARTO DOMINGO | 31.03.2019


Os pobres são os juízes da vida democrática de uma nação!
Esta afirmação parece extraída de um panfleto distribuído por movimentos sociais em uma de suas manifestações. Entretanto, é parte da reflexão que os Bispos do Brasil nos propõem para esta quaresma. Segundo a CNBB, as políticas públicas devem sempre levar em conta o princípio do bem comum e privilegiar os mais pobres, “pois a existência de milhões de empobrecidos é a negação da ordem democrática. A situação em que vivem os pobres é critério para medir a bondade, a justiça, a moralidade, enfim, a efetivação da ordem democrática. Os pobres são os juízes da vida democrática de uma nação” (Texto-base da CF, nº 181).
A realidade política, social e cultural que vivemos hoje no Brasil é muito semelhante àquela que Jesus evidencia no evangelho: são dois filhos do mesmo pai, mas o filho mais velho reclama seus méritos, acusa quem vive miseravelmente e não o reconhece como seu irmão. Há quem bata panelas cheias e proteste contra a inclusão de gente historicamente excluída. Mas Jesus age como uma espécie de transgressor, beneficiando pessoas que não pertencem ao judaísmo (7,1-10; 10,25-37), acolhendo outras de má fama (5,27-32; 7,36-50), ajudando as que são consideradas impuras (4,38-39; 5,1-16; 7,11-17; 8,26-56).
O filho mais jovem da parábola representa exatamente estes pobres e excluídos, menosprezados e perseguidos pelo mais alto mandatário do país. Uma leitura apressada e moralista da parábola põe a atenção na controversa atitude do filho mais jovem: pedir a parte da herança à qual tem direito; esbanjar tudo imprudentemente; arrepender-se e voltar à casa do pai. O mais importante na parábola, porém, é a alusão à situação em que vivem aqueles com quem Jesus se solidariza: são como desempregados num país estranho; mendigam para sobreviver; são tratados pior que os porcos, mas são os que denunciam e julgam a nação!
Com esta parábola, Jesus quer chamar a atenção para a figura do pai, sacramento da ação de Deus. Sua bondade supera uma justiça que se restringe a dar a cada um aquilo que, segundo a lei ou os costumes, lhe corresponde e, ‘tomado de compaixão’, corre ao encontro do filho necessitado, abraça-o, veste-o e beija-o. O pai não se importa com o refrão ensaiado por aquele que não é mais reconhecido como gente, tanto que sequer permite que o recite até o fim. Para o pai misericordioso, aquele resto humano nunca deixou de ser seu filho, e isso é o mais importante, o que realmente importa.
Deus não trata ninguém como empregado, muito menos como estrangeiro ou devedor. Ele não é contador, nem juiz! Todos são filhos e filhas, e podem usufruir incondicionalmente da sua acolhida e dos seus bens. Na sua casa há lugar para todos! Para os filhos e filhas maltratados e mais necessitados ele reserva as melhores túnicas, o anel com o brasão da família e a festa com carne do novilho mais gordo. No seu projeto, ninguém é excluído nem padece fome. No plano do Pai, as políticas sociais em favor dos pobres e vulneráveis ocupam o primeiro lugar! E isso mesmo que seja verdade que o fim da miséria seja apenas o começo.
Mas infelizmente existem cristãos que, por ignorância ou por maldade, murmuram contra a proposta de um mundo diferente e acusam os que ousam ensaiá-lo. Representando os fariseus e escribas, o filho mais velho é o protótipo do cidadão e do crente preconceituoso e observante das leis. Não lhe falta nada e tem tudo em abundância, mas não esconde que, frente a Deus, se sente credor. Não consegue disfarçar sua raiva diante de um pai que acolhe generosamente o jovem inquieto e necessitado de tudo. Ofende o próprio pai, acusando-o violentamente de ser parcial, injusto e avarento.
O filho mais velho não reconhece aquela criatura miserável e necessitada como seu irmão. Discutindo com o pai, refere-se a ele como ‘esse teu filho’. Mas o pai, depois de afirmar que os bens que julga seus na verdade lhe foram doados, insiste que aquele não-cidadão acolhido com festa é ‘teu irmão’. A solidariedade faz da humanidade uma família onde todas as pessoas se reconhecem e protegem mutuamente, e a ação contra a exclusão está intimamente associada à criação e recomposição dos laços sociais, laços de humanidade, ao nascimento como nova criatura, que desconhece a cínica fronteira entre “homens de bem” e “os outros”.
Jesus de Nazaré, peregrino no santuário das dores e esperanças humanas: desejamos ardentemente sentar à mesa do teu Reino, entre os pobres resgatados e os fiéis agraciados. Livra o nosso país da violência e da apartação social, do opróbrio da discriminação e da necessidade de mendigar direitos humanos. Infunde em nós a generosidade daquele pai com um coração de mãe, para que saiamos ao encontro dos oprimidos e os acolhamos festivamente, compartilhando com eles a palavra, a mesa e a missão. Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
Livro de Josué 5,9-12 | Salmo 33 (34) | Segunda Carta de Paulo aos Coríntios 5,17-21 | Evangelho de São Lucas 15,1-3.11-32

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