sexta-feira, 14 de outubro de 2022

ANO C | TEMPO COMUM | VIGÉSIMO-NONO DOMINGO | 16.10.2022

A oração alarga nosso horizonte e sustenta nossa missão.

No evangelho de hoje, Jesus fala sobre a oração.  Ele não insiste propriamente sobre a quantidade da oração, mas sobre a perseverança na oração, sobre a confiança em Deus. Ou seja: para Jesus não se trata apenas de ‘rezar sempre’, mas de ‘nunca desistir’ de rezar. O próprio Jesus não foi uma espécie de monge dedicado exclusivamente à oração, e os discípulos que deram prosseguimento à sua missão, conjugaram equilibradamente o anúncio do Evangelho com muitas iniciativas em favor das pessoas da comunidade ou de fora dela, a prática da caridade e a oração.

Para entender a parábola proposta por Jesus no evangelho deste domingo precisamos dar um passo atrás e situá-la no seu contexto literário. Jesus está tratando da questão da vinda do Reino de Deus (cf. Lc 17,20-37). Misturando a linguagem direta com a linguagem apocalíptica, Jesus ensina que o Reino de Deus não aparece de forma ostensiva e espetacular, mas é uma surpresa que se esconde em todas as ações e movimentos de solidariedade. E a súplica da viúva da parábola tem seu foco implícito na expectativa da manifestação próxima da justiça do Reino de Deus.

Na Bíblia, a viúva é o protótipo da pessoa pobre e abandonada, de quem está no limite da vida e não tem com quem contar. A tais pessoas pertence o direito de clamar a Deus. Quem clama são os oprimidos e os pobres; os poderosos e ricos apenas declamam ou reclamam. E Deus jamais se mostrou indiferente ao clamor de quem, dia e noite, suplica diante dele. A passagem exemplar continua sendo aquela do livro do Êxodo: “Os israelitas continuavam gemendo e clamando sob dura escravidão. E os gritos de socorro devidos à escravidão subiram até Deus” (Ex 2,23).

Por isso, podemos afirmar que Jesus não quer propriamente chamar a atenção para a necessidade da oração contínua, e nem apenas para o seu conteúdo. A parábola está focalizada na eficácia do clamor dos injustiçados, daqueles que clamam insistentemente pela intervenção de Deus. Fazendo referência ao juiz que, mesmo não tendo fé, atende ao clamor da viúva, Jesus nos interroga: “E Deus, não fará justiça aos seus escolhidos, que dia e noite gritam por ele? Será que vai fazê-los esperar?” O próprio Jesus responde: “Eu vos digo que Deus lhes fará justiça bem depressa”.

Jesus é a mediação do socorro de Deus, mas não apenas ele. Todas as pessoas que creem em Deus são mediadoras da sua resposta aos clamores pela vinda do seu Reino. Mesmo que, muitas vezes, nós mesmos estejamos entre aqueles que clamam, à medida em que aderimos a Jesus Cristo também somos responsáveis pela resposta de Deus aos clamores dos outros. Continuamos a pedir “venha o teu Reino”, mas não podemos enterrar os talentos que recebemos. Jamais podemos esquecer o exemplo do samaritano (cf. Lc 10,25-37): “Vai e faze tu a mesma coisa”.

A oração cristã é sempre um exercício de ruptura com o fechamento e a confiança absoluta em nós mesmos, e de progressiva abertura à vontade de Deus, que é, ao mesmo tempo, surpreendente e libertadora. A oração é um exercício humano e espiritual que tenta aproximar a nossa vontade da vontade de Deus, que procura deslocar o centro em torno do qual gira a nossa vida de nós mesmos para o advento Reino de Deus, para a vida plena ou do bem viver para todos.

A eficácia da oração se mostra claramente não apenas no atendimento automático desse ou daquele pedido por parte de Deus, mas no alargamento e no aprofundamento da nossa consciência, do nosso modo de ver as coisas. A oração ajuda-nos a tomar consciência da ação de Deus que está em curso na história, e das possibilidades escondidas nela e em nós mesmos. Mas também nos eleva ao alto da cruz para que, assumindo a perspectiva de Jesus Cristo, sintonizemos com todas as criaturas que clamam por uma libertação que ainda não se realizou.

Jesus, missionário do Pai, dai-nos a confiança e a perseverança daquela viúva que não tinha com quem contar. Torna tua Igreja cada vez mais missionária, uma Igreja que sai de si e vai ao encontro dos irmãos e irmãs empurrados para as periferias, para testemunhar a eles a tua misericórdia. Ajuda-nos e pedir, sem cansar, que venha o teu Reino. Envia irmãos e irmãs que sustentem nossos braços cansados. Leva-nos até o alto da tua cruz para que, sintonizados/as com todos os clamores, desçamos aos caminhos da história para iluminá-los com o nosso testemunho. Assim seja! Amém!

Itacir Brassiani msf

Livro do Êxodo 17,8-13 | Salmo 120 (121) | 2ª Carta de Paulo  a Tmóteo 3,14-4,2 |  Evangelho  de São  Lucas (17,1-8)

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