Sobre a ideológica obsessão por
algumas questões morais na campanha eleitoral.
No último domingo
(dia 03 de agosto), publiquei no facebook
algumas linhas sobre a exploração politiqueira e oportunista do projeto de
discriminilazição do aborto. Comecei afirmando que a legalização do aborto é
indefensável do ponto de vista ético e cristão (mesmo que a discussão não seja
exatamente sobre a legalização, mas sobre a discriminalização em algumas
situações bem específicas), e questionei a postura de cristãos (?!) que acusam
o PT e o governo Dilma de abortistas como forma disfarçada de chamar os
cristãos e católicos e votar nos outros candidatos.
E perguntava: “Trata-se de
militância “pro-life” ou de postura “pro-forbes”, “pro-money” e “pro-elites”?” Confessava
também minha tristeza e minha preocupação ao ver “membros do clero e da
hierarquia eclesiástica assumindo posturas tão ingênuas, e rezo para que sejam
apenas ingênuas, e não maliciosas e interesseiras, eivadas de desprezo por tudo
o que é popular e venha em benefício de um povo livre e soberano...” Isso
porque, salvo engano, os que levantam estas bandeiras seriam “os mesmos que se
calam diante do trabalho escravo, da grilagem de terras, dos fundos-abutres,
das arbitrariedades dos EUA no mundo, da idolatria do capital em todos os
cantos, do roubo dos territórios e do genocídio dos indígenas, das guerras
promovidas e sustentadas para alimentar o comércio de armas...”
Discutindo minha postagem, o amigo Léo Löw (de Ijuí –
RS) escrevia: “Um Padre jamais
pode apoiar um partido que incentiva o aborto, as uniões homossexuais e a ‘forçação
de barra’ com nossas
crianças para que sejam gays, a
corrupção intensa e os interesses dos bancos como faz o PT. O PSDB é péssimo
também, mas não incentiva o aborto e a homossexualidade. Somente isso já proíbe
um Padre de apoiar o PT, mesmo que façam outras coisas boas... Nada
justifica...” (os destaques são dele).
Sem entrar na questão
da análise dos programas e práticas dos partidos que postulam o governo do
Brasil, quero apenas fazer duas considerações. A primeira é que o PT não é o
criador da cultura hegemônica e globalizada, que tem suas ambiguidades, mas
também afirma, com acerto, a diversidade e o pluralismo como valor e a
dignidade inalienável da pessoa humana, inclusive dos negros, gays, indígenas, mulheres,
migrantes, enfim, daqueles que a ideologia do mercado trata como impessoas (Noam Chomsky). E tenho
dificuldades de encontrar fundamentos na afirmação de que o PT está forçando a
barra para gayficar nossas crianças.
E na questão de favorecimento dos bancos, o PT não tem feito outra coisa que
manter, impondo pequenos e insuficientes limites, a execrável política
implementada por FHC e o PSDB. O silêncio interesseiro sobre a questão dos gays e o aborto não o faz melhor e mais
aceitável que p PT!
A segunda
consideração é sobre meu apoio ao PT e a dita contradição com a fé que professo
e me orienta. Reconhecendo que que o ensino do Papa Francisco é amplo e não
pode ser manipulado, repito com ele: “Com sou eu para julgar os gays?” E acresento dois pensamentos que
ele nos propõe na exortação Evangelii
Gaudium. “Uma pastoral em chave missionária não está obsessionada pela transmissão
desarticulada de uma imensidade de
doutrinas que se tentam impor à força
de insistir. Quando se assume um objetivo pastoral e um estilo missionário,
que chegue realmente a todos sem exceções nem exclusões, o anúncio concentra-se no essencial, no que é mais belo, mais
importante, mais atraente e, ao mesmo tempo, mais necessário” (n° 35).
O Papa diz
também que a hierarquia das verdades da fé e a unidade orgânica entre as
virtudes nos impedem de excluir qualquer uma delas do ideal cristão. “Quando a pregação é fiel ao Evangelho,
manifesta-se com clareza a centralidade
de algumas verdades e fica claro que a pregação moral cristã não é uma
ética estóica, é mais do que uma ascese, não
é uma mera filosofia prática nem um catálogo de pecados e erros.” Segundo o
Papa Francisco, o Evangelho convida, antes de tudo, a responder a Deus que nos
ama e salva, e a reconhecê-lo nos outros, saindo de nós mesmos para procurar o
bem de todos.
Baseado
nesse princípio, o Papa afirma: “Este
convite não há-de ser obscurecido em nenhuma circunstância! Todas as virtudes
estão ao serviço desta resposta de amor. Se tal convite não refulge com
vigor e fascínio, o edifício moral da Igreja corre o risco de se tornar um
castelo de cartas, sendo este o nosso pior perigo; é que, então, não estaremos propriamente a anunciar o
Evangelho, mas algumas acentuações doutrinais ou morais, que derivam de certas
opções ideológicas” (n° 39).
Infelizmente, alguns militantes católicos chamados pro-life não escondem esta obsessão
doentia por alguns temas moralizantes, silenciando propositalmente princípios
mais centrais e relevantes...
Refletindo sobre o papel da catequese na evangelização, o Papa diz ainda
que “é oportuno indicar sempre o bem desejável, a proposta de vida, de
maturidade, de realização, de fecundidade, sob cuja luz se pode entender a nossa
denúncia dos males que a podem obscurecer. Mais
do que como peritos em diagnósticos apocalípticos ou juízes sombrios que se
comprazem em detectar qualquer perigo ou desvio, é bom que nos possam ver como
mensageiros alegres de propostas altas, guardiões do bem e da beleza que
resplandecem numa vida fiel ao Evangelho” (n° 168).
Itacir Brassiani msf
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