terça-feira, 13 de fevereiro de 2018

ANO B – QUARTA-FEIRA DE CINZAS – 14.02.2018


Deus não despreza ninguém, e tem compaixão de todos!
Estamos iniciando a caminhada quaresmal, tempo de concentração e de busca do essencial, convite a voltar a Deus de todo o coração, a vencer a tendência à fragmentação e à indiferença, a verter todas as energias para o único objetivo realmente decisivo: acolher a oferta de reconciliação que o próprio Deus nos faz; refazer as relações fraternas e avançar na superação das violências e na construção de uma sociedade radicalmente igualitária. Isso significa, entre outras coisas, reforçar o nosso combate sem tréguas contra os males que se enraízam tanto nos nossos sentimentos e pensamentos quanto na cultura e na estrutura social do Brasil, mesmo aqueles embutidos nas reformas ditas imprescindíveis.
Escrevendo aos cristãos de Corinto, Paulo enfatiza que o próprio Deus toma a iniciativa de refazer sua aliança e consertar a ruptura que provocamos com a sua proposta: em Jesus Cristo, ele reconciliou definitivamente consigo o mundo e cada um de nós. É desse dom incondicional, dessa amizade reatada unilateralmente, que brota para nós a possibilidade e a exigência de reconciliação com o Pai e com os irmãos e irmãs. E isso não é algo secundário, mas uma tarefa essencial e coisa para hoje, para agora! “É agora o momento favorável, é agora o dia da salvação!”, sublinha o apóstolo das nações.
A tradição das comunidades cristãs privilegiou três ações que expressam simbolicamente a mudança de direção e a convergência das forças que marcam o tempo quaresmal: a esmola, a oração e o jejum. Mas, em relação a estas práticas de piedade, Jesus Cristo pede vigilância e autocrítica, pois nem mesmo estas ações estão livres da falsificação e do faz-de-conta. Por mais piedosos que pareçam, estes gestos podem ser motivados pela busca de aprovação, de estima e de reconhecimento e, então, afastam da lógica de Deus, que aprecia e reconhece aqueles que o mundo não vê, aquilo que fica escondido...
Jesus não a descarta a esmola, mas também não se entusiasma ingenuamente com ela. De fato, Jesus questiona a motivação e a disposição com a qual costumamos dar esmola. “Não mande tocar trombeta na frente... Que a sua mão esquerda não saiba o que a sua direita faz.” O sentido autêntico da esmola é a solidariedade e a partilha daquilo que temos com as pessoas que tem menos ainda. Mais que dar daquilo que sobra ou não faz falta, trata-se de partilhar aquilo que é fruto da terra e do trabalho da humanidade e que, por isso mesmo, não pode ser privatizado, pertence a todos.
A oração é, na maioria das religiões, uma expressão de fé e de comunhão com a divindade. Não faltam grupos e pregadores que insistem na necessidade de rezar muito, de multiplicar terços, ladainhas, missas e promessas. No Evangelho, Jesus insiste mais na qualidade e na motivação que na quantidade da oração.  Para ele, a oração é abertura radical a Deus e à sua vontade, superação dos estreitos limites dos nossos gostos, preferências e necessidades, diálogo íntimo e amigo com Aquele que quer nosso bem e que não descansa enquanto todos os seus filhos e filhas não estejam bem.
Quanto ao jejum, hoje ele está de novo na moda, e recebe o simpático nome de dieta. Mas quem a pratica está muito preocupado consigo mesmo, com a saúde ou com a aparência, e pouco interessado na compaixão e na partilha. No tempo de Jesus, muitas pessoas usavam o jejum, sinal de arrependimento e de mudança, para impressionar os outros e aumentar a influência e o poder sobre eles. Como cristãos, precisamos resgatar o sentido pedagógico do jejum: experimentar a humana vulnerabilidade e participar solidariamente das necessidades dos nossos irmãos e irmãs.
Na espiritualidade quaresmal, o jejum, a esmola e a oração estão a serviço do fortalecimento da vontade de combater todas as formas de mal, da conversão ao tesouro do reino de Deus, da renovação da vida em todas as suas expressões. E isso se mostra cotidianamente na abertura humilde e reverente a Deus, na consciência da nossa interdependência em relação aos nossos irmãos e irmãs, na luta permanente para superar todas as formas de violência, assim como a indiferença e o pragmatismo interesseiro que podem condicionar as igrejas e religiões em suas relações com a sociedade civil e o estado brasileiro.
Deus e Pai, nós vos louvamos pelo vosso infinito amor e vos agradecemos por ter enviado Jesus, o Filho amado, nosso irmão. Ele veio trazer paz e fraternidade à família das criaturas e, cheio de ternura e compaixão, sempre viveu relações repletas de perdão, solidariedade e misericórdia. Derrama sobre nós o Espírito Santo, para que, com o coração convertido, acolhamos o projeto de Jesus e sejamos construtores de uma Igreja fraterna e inclusiva e de uma sociedade justa e sem violência, solidaria e igualitária, para que, no mundo inteiro, cresça o vosso Reino de liberdade, verdade e de paz. Amém! Assim seja!
Itacir Brassiani msf
(Profecia de Joel 2,12-18 * Salmo 50 (51) * 2ª. Carta aos Coríntios 5,20-6,2 * Evangelho de S. Mateus 6,1-6.16-18

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