quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Qual futuro para a vida consagrada?

Participei do segundo dia do Simpósio sobre o futuro da vida consagrada. Os temas previstos para hoje eram: 1) O futuro é agora; 2) Olhar para o futuro, pois ainda faz sentido consagrar-se a Deus. Para o primeiro tema foram convidadas duas teólogas: Ir. Giselle Gómez (nicaraguense) e Ir. Antonietta Potente (ítalo-boliviana). O segundo tema foi confiado ao conhecidíssimo Pe. Amedeo Cencini (italiano).
Profetas, artistas, terapeutas e apaixonados
Ir. Giselle Gomez
De acordo com a Ir. Giselle, a vida consagrada tem como carisma essencial procurar e sinalizar a presença do Deus da vida na história, e isso quer dizer: acelerar o dinamismo do ano/tempo de graça de Deus em favor dos empobrecidos e marginalizados. Entretanto, os/as religiosos/as não podem esquecer que são apenas uma das tantas vocações que fazem a Igreja, e devemos estabelecer relações de aliança com todos os movimentos que promovem a vida.
A religiosa nicaraguense lembrou ainda que a vida religiosa nasceu no deserto e na periferia, e é ali que se esconde o seu futuro. Hoje precisamos tomar o pulso da história, compreender o tempo que vivemos e nos situar profeticamente diante dos diversos movimentos de protesto e de mudança. E desafia: Onde e como estamos presentes hoje? Quem são nossos interlocutores e parceiros/as?
Segundo a Ir. Giselle, mais que perguntar se a vida religiosa tem futuro, é preciso ressignificar nossa paixão por Deus e pela humanidade. O que importa é abrir-se às diversas sedes e fomes dos nossos irmãos e irmãs, formar-se para um conhecimento profundo e amoroso da realidade, abandonar a pretensão de ter respostas claras e doutrinas seguras. Para que a vida consagrada tenha futuro, os religiosos/as devem ser profetas, artistas, enamorados e terapeutas.
Deus não é mais propriedade exclusiva das religiões
Ir. Antonietta Potente
Ir. Antonieta Potente sublinhou que a dimensão de tempo acompanha a fé e, portanto, a vida religiosa. Mais ainda: a própria vida religiosa nasce de uma especifica experiência do tempo, de um discernimento sobre a história. Assim também hoje: se a vida consagrada quer se repensar e reprojetar, deve olhar ao redor e aprender ler o tempo que habita.
Para a teóloga dominicana que adotou a América Latina a pergunta mais importante não é pelo futuro, mas pelo presente. É preciso ler o que dizem os sinais do tempo. E são sutis os fios que tecem a trama existencial da história presente: a precariedade, a complexidade e a pluralidade da vida que habita o mundo; a busca constante de superação e de novos patamares de coexistência e interação; o humano desejo das pessoas de serem reconhecidas e tratadas como adultas...
Inspirada num relatório da ONU que afirma que a riqueza das nações é sua gente, Ir. Antonieta pergunta: enquanto congregações religiosas, podemos dizer que nossa riqueza são as pessoas consagradas e nossos povos? É nisso que reside nossa maior consolação, é este nosso tesouro? É inútil refletir sobre a vida religiosa sem olhar em torno, sem caminhar com o povo, que tem que reinventar a vida cotidianamente. É dele que a vida consagrada precisa aprender a se reinventar.
Finalmente, a vida religiosa se transforma somente quando é capaz de compreender que a mudança não é uma possibilidade ou uma opção, mas uma necessidade e uma urgência. Só merece sobreviver uma vida religiosa que interaja com o pluralismo religioso e cultural e que esteja disposta a abrir  novos caminhos ecoantropológicos. Deus não é mais propriedade das religiões, a e vida religiosa precisa aprender a encontrá-lo alhures.
Consagrar-se a Deus continua fazendo sentido?
O Pe. Cencini se empenhou em animar a assembléia a fixar o olhar no futuro que já começou e despertar a convicção que a consagração continua tendo sentido. E apresentou o velho Abraão, amigo de Deus, como ícone da vida consagrada de hoje: como ele, em nossa desolação e fragilidade, somos convidados a contemplar o céu e contar as estrelas, convictos de que só temos futuro em deus.
Pontificia Universidade Urbaniana, local do Simposio
Infelizmente, Amedeu Cencini não consegue se libertar de uma visão eurocêntrica e de teologia demasiadamente centrada na religião. Quando afirma polemicamente que o mundo de hoje não é pós-cristão mas pré-cristão, induz a pensar que é uma realidade a ser conquistada e civilizada. E quando assume e elogia a metáfora do “Pátio dos Gentios”, proposta por Bento XV como estratégia de uma nova evangelização, acaba considerando o mundo moderno como um sujeito inferior, como o eram os pagãos dentro do templo de Jerusalém.
Parece que pouco adianta sublinhar e enumerar apologeticamente as mil razões para consagrar-se a Deus hoje se deixamos de lado o diálogo com um mundo adulto e cioso de sua autonomia e abandonamos a intereção com os diversos movimentos nos quais a vida se reinventa a cada dia. E no qual Deus está presente e é buscado com outros nomes, numa outra linguagem.
Itacir msf

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