A Palavra de Deus nos mostra
o caminho e pede conversão!
Caminhando
decididamente para Jerusalém, arena do confronto definitivo com os poderes que
discriminam, excluem e matam, inclusive em nome de Deus, Jesus continua
alertando seus discípulos em relação à tentação da aparência, do dinheiro e do
poder. Ele polemiza com os fariseus, mas sua atenção está voltada aos
discípulos. A fé na sua Palavra e a adesão aos seus ensinamentos deve
qualificar nossa relação com os bens e com os pobres. Uma fé vivida unicamente
como remédio para nossos males individuais ou como combustível para uma
carreira de sucesso tem pouco a ver com ele.
Tanto no
tempo do Jesus como hoje, há um abismo, real mas ignorado e encoberto, que
separa as pessoas que frequentam a mesma comunidade, os cidadãos de um mesmo
pais, os habitantes do único planeta. É isso que aparece na parábola: há um
rico que se veste elegantemente e dá esplêndidas festas todos os dias; e há um
pobre coberto de feridas, devorado pela fome, rodeado de cães e sentado na
calçada, em frente à porta da casa do rico e absolutamente invisível a
irrelevante para ele. Profetas como Amós já
levantavam sua voz e denunciavam o insulto dos banquetes dos ricos frente à
miséria dos pobres...
No centro
da vida cristã está a compaixão pelos pobres, e não a indiferença e a busca do
próprio bem-estar individual a qualquer custo. O caminho entre a porta e a mesa
deve ser amplo e aberto! Jesus não aceita a indiferença dos ricos frente aos
sofrimentos dos pobres. Sua Palavra é clara e contundente: “Ai de vós, os
ricos, porque já tendes vossa consolação!” (Lc 6,24). Ele insiste que os pobres
e os sofredores devem ocupar os primeiros lugares na lista de convidados para
as festas e celebrações (cf. Lc 14,13). Mas, o Brasil naturaliza casas-grandes
e senzalas e não permite que Lázaro vá além da porta dos ricos...
Por isso,
é estranho, para não dizer cínico, o grito do rico, depois da morte, pedindo
que Lazaro tenha compaixão dele. O rico sem nome continua achando que os pobres
devem estar a seu serviço: bem que eles poderiam aliviar a sede ou avisar seus
parentes e livrá-los a tempo dos males que os esperam... Não pode não ser
cinismo este apelo para que os pobres tenham compaixão dos ricos que sempre se
vestiram de indiferença e prepotência. O caminho para o céu é nossa vida na terra,
e a indiferença corta a comunicação, destrói as pontes, cava abismos e fere de
morte a solidariedade entre as pessoas.
Jesus se
demora na descrição das tentativas infrutíferas do homem rico para reverter uma
situação irreversível, sem tomar consciência do abismo que ele mesmo cavou,
pedindo que lhe tragam água para amenizar a sede e enviem um morto ressuscitado
para convencer seus parentes da necessidade de mudar de atitude. Mas parece que
não há sinal poderoso ou milagre esplendoroso capaz de tocar o coração e a
mente de quem se fechou em si mesmo e faz da indiferença uma couraça protetora.
Nada pode curar aqueles que se fecharam à Palavra e dos profetas, dos apóstolos
e do próprio Jesus.
É
lamentável que ainda hoje muitos pregadores apresentem esta parábola simplesmente
como uma espécie fotografia da inversão que a morte provocaria na vida real.
Jesus não está falando da felicidade que espera os sofredores no paraíso
futuro, ou do sofrimento destinado aos ricos depois da morte! O que ele
enfatiza é o caráter decisivo e irreversível das opções que fazemos e das
práticas que desenvolvemos no tempo presente! O caminho da vida cristã é
pavimentado pela escuta da Palavra de Deus e pela conversão. E ela não há lugar
para privilégios, nem para milagres fáceis e encomendados...
Na carta
a Timóteo, Paulo pede: “Tu que és um homem de Deus, foge das coisas perversas, procura
a justiça e a piedade, a fé, a caridade, a constância, a mansidão. Combate o
bom combate da fé, conquista a vida eterna, para a qual fostes chamado.” Ele
nos pede para juntar a piedade à prática da justiça, unir a solidariedade à fé,
casar a mansidão com a perseverança no seguimento de Jesus Cristo, único e
soberano líder que pode nos guiar a um mundo justo, fraterno e liberto. Como
estamos longe dos sorrisos postiços e das propostas vazias daqueles que querem
nosso voto e nossa consciência...
Neste último domingo do mês que dedicamos à tua santa
Palavra, te pedimos: “Fala, Senhor! Fala da Vida! Só tu tens palavras eternas,
e nós queremos ouvir. São tantos os apelos que vêm dos oprimidos. Tu és quem
liberta, o Deus dos esquecidos.” Ajuda-nos a vencer a indiferença que cava
abismos entre pessoas que nasceram para ser irmãos e irmãs. Ensina-nos a
acolher, compreender e seguir aquilo que nos dizes através dos profetas e
santos de ontem e de hoje. Sustenta a coragem daqueles que denunciam golpes
midiáticos e sequestros de direitos. E que tua Palavra seja sempre a luz dos
nossos passos. Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
(Profecia de Amós 6,4-7 *
Salmo 145 (146) * 1ª Carta a Timóteo 6,11-16
* Evangelho de São Lucas 16,19-31)
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