quinta-feira, 1 de setembro de 2016

ANO C – VIGÉSIMO-TERCEIRO DOMINGO DO TEMPO COMUM – 04.09.2016

A Palavra de Deus orienta, desinstala e converte!

Estamos em plena ‘semana da pátria’, e ela que sempre traz consigo o risco de exaltação de um patriotismo vazio, ultrapassado e até cínico. Com o Grito dos Excluídos, as Igrejas pretendem evitar essa tentação. Ademais, o abominável e criminoso processo de cassação da Presidenta e de expropriação dos direitos sociais garantidos pela Constituição de 1988 nos deixa perplexos.  E Jesus Cristo, Palavra viva de Deus, irrompe chamando nossa atenção para as consequências da palavra dada e para os custos da realização das nossas decisões. Temos mesmo disposição de ir a fundo no seguimento de Jesus Cristo?
É verdade que a cultura que caracteriza nossa sociedade de consumo não costuma chamar a atenção para a prudência e para o planejamento. A caderneta de poupança, com seu apelo a economizar e planejar, é coisa do passado. Hoje, reina absoluto o cartão de crédito, com seu permanente e sedutor convite a gastar sem planejamento, a seguir apenas os insaciáveis desejos de consumo. O que predomina e se impõe como regra é curtir e saborear a fundo o momento presente, sem preocupação com princípios e hábitos formulados por outros no passado, nem com aquilo que acontecerá no futuro.
Nesse ambiente, o seguimento responsável e maduro de Jesus Cristo corre riscos. Precisamos nos perguntar se é consciente e consequente nossa decisão de seguir Jesus Cristo. É claro que, para a maioria dos fiéis, o início da caminhada na fé cristã não está ligada a uma decisão pessoal, consciente e madura. Recebemos a fé cristã e católica misturada ao leite da mãe, ligada aos hábitos da nossa vizinhança, conjugada com a cultura transmitida pela escola. Seguimos esta estrada porque nos parecia a única, e o fizemos como ovelhas indiferenciadas de um rebanho. Era difícil e custoso trilhar outras sendas.
Mas nós crescemos, e os tempos mudaram. O pluralismo das opções que batem à nossa porta ou se oferecem aos nossos olhos todos os dias nos interpelam à aventura noutras estradas ou a dar razões para permanecer naquela que sempre trilhamos. E hoje sabemos que o Evangelho nos pede prudência e avaliação crítica diante de atitudes e projetos que se travestem de sabedoria e se apresentam falsamente como evangélicos e fautores de libertação. Jesus Cristo, com seu projeto de vida para todos, pede uma ruptura radical com a busca de vantagens individuais ou restritas a pequenos grupos.
Estar com Jesus e seguir seus passos supõe a decisão por uma específica escala de valores: a honra pessoal, a aceitação pública, a segurança dos bens e os próprios vínculos familiares são secundários em relação à prioridade absoluta de acolher e praticar os valores do Reino de Deus. A Palavra viva de Deus, feita carne em Jesus, nos mostra por onde andar. Tomar a cruz e caminhar com ele significa estar disposto a enfrentar a rejeição dos grandes e poderosos, libertar-se da busca infantil de cargos e honras e contar com a possibilidade do fracasso dos empreendimentos pessoais e institucionais.
Preferir Jesus Cristo ao pai, à mãe, à mulher ou marido e aos filhos e filhas significa viver as relações familiares fora dos moldes patriarcais, no horizonte da geração de um mundo de irmãos (como testemunha Paulo em relação a Onésimo e Filemon). É o próprio Jesus quem adverte: “Do mesmo modo, portanto, qualquer um de vós, se não renunciar a tudo o que tem, não pode ser meu discípulo.” Está claro que o problema não é possuir alguns bens ou consumir de modo maduro e consciente, mas deixar-se dominar totalmente pelos bens e pelo consumo, como se o sentido da nossa vida dependesse disso.
A necessidade de renunciar está ligada ao seguimento de Jesus. A renúncia aos bens limitados ou aparentes é um meio para percorrer com mais autenticidade um caminho que conduz à vida abundante, tanto para si mesmo como para os outros. Renunciar a tudo significa limpar a casa, abrir espaço, ordenar as prioridades e orientar-se pela compaixão misericordiosa proposta de Jesus. Ele é a Palavra de Deus que nos desinstala e chama à conversão. Sua proposta está longe de ser um anestésico barato. O caminho para a humanidade nova tem seus custos, e nós precisamos avalia-los e contabiliza-los!
Jesus de Nazaré, irmão maior nos caminhos que levam a uma humanidade irmanada e reconciliada, ensina-nos a conhecer e acolher os desígnios do teu e nosso Pai, a compreender o sentido dos nossos dias, a avaliar bem as possibilidades e exigências do nosso tempo. Alimenta-nos e ilumina-nos com a tua Palavra, para que nossa consciência não permaneça anêmica ou anestesiada diante dos imensos desafios que a situação do Brasil nos apresenta. Ajuda-nos a compreender as exigências do seguimento dos teus passos e a renunciar a tudo o que possa nos afastar de ti. E que teu apóstolo e nosso irmão Paulo nos estimule a lançar as sementes da igualdade na Igreja e no mundo, ainda tão divididos e tão desiguais. Assim seja! Amém!

Itacir Brassiani msf
(Livro da Sabedoria 9,13-18 * Salmo 89 (90) * Carta a Filemon 9-17 * Evangelho de São Lucas 14,15-33)

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