Que a minha loucura seja perdoada!
Há alguns anos percebi, não diferente de muitos jovens que conheço, que
a minha felicidade não chegaria com a formatura. O sonho de concluir a
faculdade, trabalhar e casar não era meu. Era a expectativa dos outros para mim
– e para qualquer menina da minha idade. Queria mais que isso, necessitava ir
além.
Agora, aos 25 anos, parto para a experiência que deve concretizar o meu
desejo. Trilhando este caminho, compreendi que apenas viveria tão feliz quanto
esperava, quando me desafiasse a sair de mim e de tudo que sempre concebi como
mundo. Assim, decidi ser missionária.
A Igreja Católica do Rio Grande do Sul mantem um projeto de apoio à
Arquidiocese de Nampula, em Moçambique. Lá, a Igreja-Irmã acolhe há 23 anos
missionários e missionárias gaúchos. A pequena vila de Moma, no litoral leste
da África, será minha casa a partir do dia 12 de setembro.
Na preparação para este tempo, compreendi que missão é serviço. E servir
com amor. Primeiro servir no sentido de se colocar à disposição às necessidades
do outro, mesmo que talvez não seja aquilo que eu ache que é necessidade.
Aí entra o amor. Compreender que o outro precisa e oferecer o que tens
na gratuidade. As necessidades de cada um, os anseios, as angústias e as
alegrias também se tornam meus quando me disponho a caminhar lado a lado. Eu me faço, me construo, me reconheço quando me encontro no outro.
Vou para servir a partir da realidade e não do meu desejo. Um novo mundo
se constrói quando somos capazes de compreender com compaixão e empatia a
cultura, a religião, os costumes, as opções e os contextos sociais, políticos e
históricos de um povo.
Por isso, ao contrário do que normalmente se espera, não se sugere ao
missionário grandes obras ou feitos extraordinários. A marca de uma missão começa pelo ouvir. Escutar e ver as aflições do
outro, ir ao seu encontro e, com ele, construir a libertação. A vida plena se
alcança e amadurece à medida que é entregue para dar vida aos outros. Isto é,
definitivamente, a missão.
As expectativas? Todas as possíveis. Às vezes tenho medo, angústias, um
monte de perguntas. Entretanto, em grande parte do tempo, me inundo de alegria
pela possibilidade de poder construir em Moma novos caminhos.
Há os que questionam: “Mas aqui não é muito melhor?”. Há também os que
avisam: “Conheço gente que morreu de malária...” E, ainda, os que anunciam
“Quero ver como vai ser na volta”. Tem também os que, duros para compreender,
lançam o diagnóstico: “Você não está bem certa da cabeça...” “Se assim for, que a minha loucura seja perdoada, porque metade de mim é
amor e a outra metade também." (Oswaldo Montenegro)
Victoria Holzbach
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