quarta-feira, 13 de junho de 2018

ANO B – DÉCIMO-PRIMEIRO DOMINGO DO TEMPO COMUM – 17.06.2018


Sejamos realistas! Busquemos a impossível Justiça do reino!
Na liturgia, o Tempo Comum não tem nada de comum, e isso não apenas por causa das festas juninas, ou, no ano em curso, por conta da copa do mundo de futebol. Este é o tempo da encarnação do Evangelho no cotidiano da vida pessoal, eclesial e social; de acolher o mistério do Reino de Deus que vai lentamente adquirindo contornos e produzindo frutos; de cultivar pacientemente a esperança que, como o artista do circo, caminha sobre a corda bamba. Somos chamados a caminhar na esperança, e façamo-lo acolhendo e espalhando muitas sementes, mesmo que às vezes nos pareçam frágeis e insignificantes.
Essa esperança é muito importante, pois hoje o realismo cínico nos é apresentado como uma virtude, e se torna uma tentação, inclusive para as pessoas que dizem acreditar num crucificado que ressuscitou. Querem nos convencer que o mundo sempre foi assim, e que não seremos nós os protagonistas de uma hipotética mudança. Um outro mundo não seria possível, e ponto final! A sabedoria então seria cada um cuidar da sua própria vida, não deixando escapar nenhuma oportunidade de derrotar os outros na competição pela sobrevivência, procurando sempre tirar o máximo de vantagem em menor tempo? Não é isso que está demonstrando parte daqueles que nos governam ou postulam uma candidatura política?
No entanto, como cristãos, fazemos parte de uma caravana que percorre os caminhos da história guiada por outras convicções: as sementes crescem por si mesmas, e as que parecem pequenas e insignificantes, como a de mostarda e de eucalipto, se tornam árvores frondosas. Sem esquecer que é próprio da mostarda ser picante... Partindo da própria experiência e escrevendo sobre a esperança da ressurreição, São Paulo diz que vivemos como se estivéssemos fora de casa, como peregrinos que buscam outra morada, uma outra cidade. Mas insiste que nesta permanente saída estamos cheios de confiança.
A fé cristã toma distância tanto do delírio dos que ardem de paixão por um mundo fictício e ilusório depois da morte como do conformismo medroso daqueles que aparam as arestas do Evangelho e o acomodam a um mundo sem coração e sem justiça. Nossa confiança se inspira na sabedoria dos semeadores que sabem que a semente não é a colheita, mas este saber não os impede de lançá-las generosamente na terra. Eles o fazem conscientes de que é falta de realismo contar apenas com as próprias forças, confiar apenas nas nossas estratégias, esquecer a gratuidade e fechar-se às surpresas.
O que acontece é que o medo do futuro e o controle do presente costumam asfixiar e matar as sementes. “A terra produz o fruto por si mesma”, nos ensina Jesus, num dos contos populares que recolheu na zona rural da Palestina e que a Igreja nos sugere hoje. “A semente vai brotando e crescendo, mas o homem não sabe como isso acontece.” É possível que um processo de mudança se mostre verdadeiramente profundo quando nos leva à consciência dos próprios condicionamentos e limites, abrindo-nos a contribuições outras, iluminando-nos e fecundando-nos pela experiência da gratuidade.
Precisamos ser libertados da ilusão da grandeza e colocar no centro da nossa fé a memória da coragem dos escravos frente ao faraó, a memória da vida de Jesus de Nazaré, o mistério escondido na semente de mostarda. O Reino de Deus não brilhará apenas quando chegar o hipotético dia em que não haverá mais compradores de justiça, a liberdade não será uma ilusão, a verdade será a fonte das notícias e poderemos crer nas pessoas outra vez. O reino de Deus não é um particípio passado mas um gerúndio e um futuro: ele “vai sendo” nas milhares de ações de compaixão e de afirmação da dignidade do outro.
Alcançamos a desejada e difícil maturidade quando conseguimos conjugar adequadamente paciência e urgência históricas. Os processos humanos e sociais também têm e seu ritmo de maturação. Conhecê-los sem controlá-los, e remover as forças que podem representar obstáculos ao seu desenvolvimento, é a arte das artes.  Mas eu acho que hoje o risco que nos ronda hoje mais fortemente é deixar passar o tempo propício da maturação e da colheita, fechar os olhos e os ouvidos a Deus, que pede que sejamos, urgentemente, pessoas mais solidárias, Igrejas mais comunitárias e sociedade mais igualitária.
Jesus de Nazaré, semeador da Palavra que liberta e nos faz libertadores! Ajuda-nos a compreender que a fé é dinamismo que nos abre à escuta de Deus, cria espaços de silêncio nos quais sua Palavra é acolhida e semeada. Frente às dores e esperanças que habitam o mundo, dá-nos o senso profundo da paciência e da urgência que tu mesmo exercitaste. Faz com que essa escuta fundamente a convivência igualitária, nos faça sair das nossas próprias certezas e nos comprometa numa dinâmica de comunhão e de solidariedade no interior da qual nasce, cresce e frutifica o sonho do bem-comum da humanidade. Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
(Profecia de Ezequiel 17,22-24 * Salmo 91 (92) * 2ª. Carta aos Coríntios 5,6-10 * Evangelho de  São Marcos 4,26-34)

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