quarta-feira, 14 de julho de 2021

ANO B | TEMPO COMUM | DÉCIMO-SEXTO DOMINGO | 18.07.2021

A compaixão é a base, o dinamismo e o horizonte da vida cristã!

Dos nossos antepassados e dos pensadores ocidentais, aprendemos que é refletindo, dobrando-nos sobre nós mesmos, que chegamos a saber o que e quem somos. A tradição bíblica, porém, tem uma perspectiva diferente: descobrimos e revelamos nossa identidade respondendo a quem nos interpela, tomando uma atitude diante do rosto do Outro que está diante de nós, assumindo nossa responsabilidade na história. Nós somos a resposta que damos aos dilemas do mundo e aos múltiplos chamados que nos solicitam! 

Mas não podemos esquecer também que um dos aspectos mais profundos da fé que herdamos dos hebreus é a imagem de um Deus que cuida de nós como o pastor toma conta das suas ovelhas: Ele nos guia por caminhos seguros e nos conduz a pastagens abundantes, e nos dá a felicidade e o amor como companheiros que vão à nossa direita e à nossa esquerda. “O Senhor é meu pastor, nada me falta”: assim começa uma das mais belas orações do judaísmo. E essa não é uma afirmação ingênua e piedosa, mas a expressão de resistência, a convicção de um povo que sente falta de quase tudo, mas resiste.

As pessoas que fazem a experiência de serem amadas e guiadas por Deus se descobrem também intimadas a amar e cuidar dos outros, sem agenda fixa e sem hora marcada. O evangelista nos conta que, depois de enviar os discípulos para uma experiência de missão, e depois de saber do assassinato do profeta João Batista, é tanta gente que procura Jesus e os apóstolos que eles não têm mais tempo nem para comer. O cansaço da missão recém concluída e a tensão provocada pelo martírio de João pedem descanso, um retiro mais tranquilo. E isso lhes parece prudente e mais que merecido.

Um verdadeiro pastor, porém, não sabe dar as costas às suas ovelhas. Jesus simplesmente não é capaz de ignorar as necessidades do seu povo, e ensina seus discípulos a não se contentarem com a contabilização de pequenos sucessos pastorais. A necessidade fez o povo apressar o passo, e muita gente, tendo visto Jesus e os discípulos partirem de barco, correu por terra e chegou ao lugar do descanso antes que eles.

Diante da multidão que se antecipou para não perder o encontro, Jesus poderia ter atitudes: orgulho pelo sucesso da pregação; indiferença diante do que poderia ser somente busca de milagres e vantagens fáceis. Mas, descendo do barco, Jesus lê no rosto da multidão o abandono por parte daqueles que deveriam conduzi-la e defendê-la. O evangelista diz que “quando saiu da barca, Jesus viu uma grande multidão e teve compaixão, porque estavam como ovelhas sem pastor.”

Compaixão é a atitude profunda e quase orgânica de quem assume as dores dos outros como e fossem suas, de quem reconhece como próprias as lutas daqueles que são mais vulneráveis. É uma força que destrói os muros que, por medo, comodismo ou egoísmo, os povos, religiões, Igrejas e indivíduos vão construindo em torno de si mesmos e seus interesses. Por isso, a compaixão é também o dinamismo que comove Jesus e tira os cristãos dos castelos construídos pelo individualismo para coloca-los na estrada da missão.

É isso que Jesus demonstra ao longo de toda a sua vida, e é isso que ele propõe para aqueles que seguem seus passos. Sua primeira ação diante do povo abandonado é “ensinar muitas coisas para eles”: ensinar que eles sofrem porque foram abandonados pelas autoridades políticas e religiosas; que os muros que separam povos e classes são invenções humanas e devem acabar; que Deus não é um pastor amigo e compassivo...

Escrevendo aos efésios, Paulo sublinha que, a partir de Jesus Cristo, acabaram os privilégios de raça e de religião que definem quem está mais perto ou mais longe de Deus, quem tem prioridade e quem deve esperar na fila. Privilégios estabelecem hierarquias e classes, e perpetuam dominações. Pregado na cruz em meio a dois criminosos, Jesus derruba os muros que separam, elimina hierarquias culturais e sociais, assina o tratado de paz que faz de todos os povos uma única família. Não há mais diferença de dignidade entre homens e mulheres, cristãos e pagãos, escravos ou livres. Eis a Boa Notícia que há dois milênios suscita alegria!

Jesus, belo e amado pastor, peregrino no santuário das dores humanas! Atravessamos hoje os sombrios vales da indiferença, da discriminação e do ódio transformadas em cultura, inclusive nas redes sociais e comunidades eclesiais. Desperta também hoje homens e mulheres que, como tu, diante das dores e misérias humanas, deixem-se mover pela compaixão. Que ninguém busque piedosas razões para justificar a indiferença diante do sofrimento humano.  Assim seja! Amém!

Itacir Brassiani msf

Profecia de jeremias 23,1-6 | Salmo 22 (23) | Carta de Paulo aos Efésios 12,3-18 |  Evangelho  de São  Marcos 6,30-44

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