Quem encontra
O Caminho, deixa seus velhos caminhos!
Ainda dentro do
tempo litúrgico do Natal, hoje somos convidados/as a participar da manifestação
de Jesus Cristo como caminho de salvação para todos os povos. Em Jesus, todos
as pessoas, grupos, povos e religiões são reconhecidos/as como legítimos
herdeiros do Reino de Deus. Assim, Jesus Cristo não é propriedade dos
católicos, nem dos cristãos. O cristão verdadeiro é católico, aberto,
universal, avesso a rotulações. O encontro com Deus nos leva a mudar conceitos
e rumos!
Paulo fala-nos
de um mistério até então desconhecido e finalmente a ele revelado: que todos os
povos e religiões participam da mesma herança do Reino de Deus e são membros do
corpo de Cristo em igual dignidade com os judeus. Com isso, Paulo derruba todos
os muros que hierarquizam e separam. Em nome de Deus, o apóstolo das nações
nega toda espécie de privilégio ou superioridade baseada em princípios
religiosos. Na raiz da nossa fé está esta alegre descoberta da igualdade, sem
privilégios. Mas como é difícil assimilar este aspecto da nossa fé!
O evangelho de
hoje nos apresenta homens de outros pagos e diferentes crenças, que chegam a
Jerusalém guiados por uma estrela. Eles batem às portas dos chefes políticos e
religiosos, comodamente instalados na capital, pedindo ajuda para decifrar os
sinais e descobrir o caminho. Os escribas mostram que sabem, mas não se movem.
Herodes parece desejar saber das coisas, mas é assaltado pelo medo de perder o
poder. Os magos insinuam que Aquele que merece honra e reverência não costuma
instalar-se nos palácios e templos, nem morar e demorar nas capitais.
Herodes aconselha
aqueles peregrinos a irem a Belém em busca de informações, mas eles caminham
levando presentes, e não cadernos de anotações. A estrela-sinal cumpre seu
papel transitório, mas, para esses buscadores de Deus, o sinal de que a humanidade tem
um novo líder é o “menino deitado na manjedoura”. Os magos reconhecem a realeza
de Jesus Menino e lhe oferecem ouro; proclamam sua divindade oferecendo-lhe
incenso; prenunciam já sua humana morte oferecendo-lhe mirra. Mas eles não
voltam pelo mesmo caminho!
Este é o núcleo
da fé que professamos: um Deus que se sente bem assumindo a carne humana e que,
por amor solidário, não recusa a cruz. Como é possível que tenhamos nos
afastado tão perigosamente disso? Como entender que as igrejas tenham
transformado a estrebaria em palácio, os sábios estrangeiros em reis que barram
migrantes, os pastores em imperadores sedentos de mais poder e domínio? Como é
possível que tenhamos esvaziado a fé cristã, reduzindo-a a uma espécie de
analgésico para acalmar a consciência, em mecanismo de sustentação de poderosos?
Como é que
certos setores do cristianismo, que multiplicam glórias e louvores públicos ao
nome de Jesus, incriminam, ainda com mais força e publicidade, quem não comunga
da sua estreita ideologia, quem não compartilha seus mesquinhos interesses e
quem não professa sua surrada cartilha? Que misteriosa e tenebrosa cegueira é
essa que tomou conta deles e os faz desejar a morte dos inimigos e perseguir
índios, negros, migrantes e pobres? Que tipo de tolice tomou conta da mente e
da fé dessa gente e a tornou incapaz de admitir a mentira dos mitos travestidos
de verdade?
Será que o medo
que tirava o sono de Herodes deixou Jerusalém, atravessou os mares e se
instalou no Brasil? Será que o espírito assombrado e tenebroso do coronel
Ustra, invocado e admirado pelo hoje presidente, está tomando o lugar da
estrela de Belém e trazendo medo aos amantes da tortura? Será que não perdemos
o endereço de Belém e da Manjedoura? Outros são os caminhos da paz, outra é a
segurança que o povo brasileiro necessita: respeito aos direitos e à dignidade,
conquistados com lutas de anos e com sangue!
Dirigimo-nos a ti,
Deus dos humilhados, Deus envolto em faixas, destino e refúgio de todos os que
peregrinam nas estradas deste mundo desigual. Dá-nos palavras e sinais que
guiem nossos passos inseguros no rumo certo. Não permitas que nos detenhamos
nos palácios que, geralmente, escondem tramas, traições e prisões. Ajuda-nos a
reconhecer tua presença na Belém de todos os homens e mulheres, e a ver a fé daqueles/as
que creem diversamente como caminhos que conduzem ao encontro contigo no
coração das tuas amadas criaturas. Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
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