sábado, 2 de agosto de 2025

Aumentar os celeiros

Na abundância, sejamos mais generosos na partilha | 794 | 03.08.2025 | Lucas 12,13-21

Chamando Jesus de mestre, o personagem sem nome do evangelho de hoje não está expressando sua adesão a ele. Jesus percebe a ironia da saudação, tanto que, dá a entender que, se não for aceito como mestre, também não pode ser buscado como juiz. No fundo, Jesus percebe que este indivíduo não é uma pessoa em necessidade e nem um candidato a discípulo. Trata-se de alguém queimado pela ganância. Mas essa situação proporciona a Jesus a oportunidade de falar sobre a relação do discípulo com os bens.

“Atenção! Guardai-vos contra todo tipo de ganância, pois mesmo que se tenha muitas coisas, a vida não consiste na abundância de bens”. Esta é a reação de Jesus ao perceber que, por trás do pedido de “justiça”, não está uma necessidade, nem uma sede de justiça, mas o desejo de possuir bens. E, para sublinhar a seriedade da exortação, Jesus propõe uma parábola na qual o protagonista é uma pessoa radicalmente voltada para si mesma, que fala e decide tudo sozinha e não se interessa por mais ninguém.

No final de uma safra bem-sucedida, o personagem diz a si mesmo: “Meu caro, tens uma boa reserva para muitos anos. Descansa, come, bebe e goza da vida”. Como não lembrar aqui a parábola do rico que festeja todos os dias, indiferente à miséria de Lázaro que jaz à sua porta (Lc 16,19-31)? Segundo Jesus, as pessoas que agem assim são desprovidas de qualquer resquício de razão, vazias de qualquer valor humano, e passam longe da piedade cristã. São o tipo de indivíduos que, com suas decisões, cavam abismos que os separam dos demais “simples humanos”.

Mas, se o acúmulo desmedido de bens é tolice, o que significa ‘ser rico diante de Deus’? Está claro que, para Jesus, o problema não está nos bens em si mesmos. O mal dos bens está no obstáculo que podem interpor à liberdade radical e ao engajamento no movimento do Reino de Deus, que passa necessariamente pela partilha solidária.

O Reino de Deus é a pérola preciosa e o tesouro que vale mais que tudo, o terreno no qual brota o trigo que vai para a mesa dos pobres, o ventre no qual é gerada a nova humanidade. Aos ricos, o que falta não são armazéns novos, mas uma visão mais solidária e um coração mais generoso. A pessoa rica diante de Deus é aquela que, na abundância, aumenta o tamanho da mesa, para acolher, e não as dimensões do celeiro para entesourar!

 

Sugestões para a meditação

§ Preste atenção nas palavras do protagonista da parábola: o “eu” está no centro de tudo, ocupa todo o seu pensamento

§ Quais as luzes que a parábola e o ensino de Jesus trazem para quem só pensa em acumular, e para quem não tem nem o necessário?

§ O que significar hoje ser “rico diante de Deus” e “não ajuntar tesouros para si mesmo”?

sexta-feira, 1 de agosto de 2025

É tempo de curtir!

UMA VIDA MAIS SAUDÁVEL

«Deita-te, come, bebe e dá-te uma boa vida»: este lema do homem rico na parábola evangélica não é novo. Tem sido o ideal de não poucas pessoas ao longo da história, mas hoje vive-se em grande escala e sob uma pressão social tão forte que é difícil cultivar um estilo de vida mais sóbrio e saudável.

A sociedade moderna há muito institucionalizou o consumo: quase tudo está orientado para desfrutar de produtos, serviços e experiências sempre novas. O lema do bem-estar é claro: «Dê-se uma boa vida». O que nos é oferecido através da publicidade é juventude, elegância, segurança, naturalidade, poder, bem-estar, felicidade. Temos que alimentar a vida no consumo.

Outro fator decisivo na evolução da sociedade atual é a moda. Sempre houve na história dos povos correntes e gostos flutuantes. A novidade é o império da moda, que se converteu no principal guia da sociedade moderna. Já não são as religiões ou ideologias que guiam o comportamento da maioria. A publicidade e a sedução da moda estão substituindo a Igreja, a família ou a escola. É a moda que nos ensina a viver e a satisfazer as necessidades artificiais do momento.

Outra característica que marca o estilo de vida moderno é a sedução dos sentidos e o cuidado com o externo. Temos que prestar atenção ao corpo, à linha, ao peso, à ginástica e aos check-ups; é preciso aprender novas terapias e remédios; temos que seguir os conselhos médicos e culinários de perto. Temos que aprender a «se sentir bem» consigo mesmo e com os outros; temos que saber mover-nos habilmente no campo do sexo: conhecer todas as formas de prazer possíveis, desfrutar e acumular novas experiências.

Seria um erro «demonizar» esta sociedade que oferece tantas possibilidades de cuidar das várias dimensões do ser humano e de desenvolver uma vida integral e integradora. Mas não seria menos errado deixarmo-nos arrastar levianamente por qualquer moda ou reclame, reduzindo a existência a puro bem-estar material. A parábola evangélica convida-nos a descobrir a insensatez que se pode encerrar nesta abordagem da vida.

Para acertar na vida, não basta passar bem. O ser humano não é apenas um animal sedento de prazer e bem-estar. Está feito também para cultivar o espírito, conhecer a amizade, experimentar o mistério do transcendente, agradecer a vida, viver a solidariedade. É inútil queixarmo-nos da sociedade atual. O importante é agir de forma inteligente.

José Antônio Pagola

Tradução de Antônio Manuel Álvarez Perez

Herodes e João

As tradições, leis e honras não estão acima da vida! | 793 | 02.08.2025 | Mateus 14,1-12

A notícia sobre a trama que levou o profeta João Batista à morte não é uma espécie de parênteses sem relevância na apresentação da missão de Jesus, embora possa parecer isso. O episódio é uma antecipação daquela que seria a sorte de Jesus e um alerta aos discípulos: eles precisam ser lúcidos e corajosos, não fechar os olhos frente à prepotência e não ter medo.

Herodes é um político judeu que exerce um poder limitado, concedido ou, pelo menos, tolerado pelo imperador de Roma e a serviço dele. É um príncipe pequeno e insignificante, que entra em colisão com o Reino de Deus anunciado por Jesus e age com prepotência contra seu irmão, se apossando de sua esposa. É contra essa prepotência, e contra outros desmandos e injustiças que reinavam na corte, na sociedade e no judaísmo, que João Batista se levanta corajosamente.

Mateus deixa claro que Herodes desejava eliminar o incômodo profeta. Ele temia que a pregação de João acabasse provocando uma revolta popular, e, dada a popularidade que desfrutava, tinha que esperar a ocasião perfeita, para não perder completamente o apoio do povo. E a ocasião se lhe oferece numa festa que reúne a elite masculina do seu reino e chama mulheres como parte da diversão e das orgias. Dançar no meio dos homens significava insinuar-se o oferecer serviços sexuais.

E João Batista, que não come nem bebe, acaba tendo o seu destino definido numa festa com comida, bebida e dança. Atendendo ao pedido de sua mulher, Herodes valoriza mais os códigos de honra do poder e da família patriarcal que os mandamentos da religião que professa, e que proíbem matar. Herodes, e não sua mulher, é o responsável pela morte de João, pois há tempos desejava matá-lo, e sua mulher não tinha poder para tanto. Herodes se aproveita da situação, inclusive do pedido dela, para eliminar um crítico incômodo e assegurar a benevolência do império romano.

Jesus é informado do desfecho da vida do profeta e amigo, mas isso não o intimida, nem diminui sua fidelidade no anúncio e na construção do Reino de Deus. Antes, ele colhe essa ocasião para perceber e sublinhar a urgência e a relevância da sua missão. Por mais belas e estimulantes que sejam as parábolas do Reino de Deus, a sua realização encontra violenta resistência.

 

Sugestões para a meditação

§ Leia atentamente esse relato, e perceba o papel de cada personagem na execução de João Batista

§ O profeta do Jordão não recuou diante das ameaças e riscos, e manteve sua pregação e suas denúncias

§ Recorde o nome de profetas e profetizas que marcaram a vida dos cristãos nos últimos tempos

§ Deixe-se estimular e motivar pelo testemunho de João Batista e dos profetas e profetizas que você recordou

quinta-feira, 31 de julho de 2025

Santo de casa

É o preconceito que impossibilita o milagre dos santos de casa | 792 | 01.08.2025 | Mateus 13,54-58

Depois de uma longa seção dedicada ao anúncio do Reino de Deus às multidões em forma de parábolas, e depois de algumas catequeses especiais dirigidas aos discípulos, Jesus volta à sua terra e vai à sinagoga de Nazaré, onde seus amigos e familiares costumavam se reunir. A notícia da sua ação poderosa, assim como a clareza e a pertinência do seu ensino, impressionara a todos, tanto em Nazaré como na circunvizinhança.

Mas também nessa ocasião e nesse episódio emerge a dificuldade que os diversos grupos de interlocutores têm de reconhecer na ação e no ensino libertário de Jesus a ação libertadora de Deus. Essa dificuldade para discernir a identidade de Jesus é abordada por Mateus do capítulo 11 ao capítulo 16 da sua versão do Evangelho, mas o que surpreende é que ela se estende também aos seus conterrâneos e familiares.

Fica claro que o povo de Nazaré, mesmo se encantando e admirando com ensino e com o poder transformador das ações de Jesus, acaba tropeçando nos preconceitos próprios das pequenas cidades e das pessoas que o conhecem de perto. Seus conterrâneos começam a se perguntar onde ele teria encontrado tal sabedoria e tal poder, já que tem uma origem humilde e não pertence a uma elite cultural ou religiosa. Eles não conseguem defini-lo fora do seu contexto familiar. Para eles, o enviado de Deus deveria vir de cima, e não de baixo; do centro, e não da periferia.

Para o senso comum no qual se movia o povo de Nazaré e a própria família de Jesus, o fato de ter origem humilde e ser filho de carpinteiro nega a Jesus a possibilidade de ser o agente ungido e enviado por Deus. A sinagoga acaba sendo o joio que aparece no meio do trigo, e a querida Nazaré acaba se comportando como Corazim, Betsaida e Cafarnaum, povoados que se fecharam à novidade escandalosa e provocativa do Reino de Deus.

Jesus interpreta a rejeição por parte dos seus familiares e conterrâneos no horizonte da histórica resistência e perseguição que se voltam contra todos os profetas. E esta notória falta de fé do povo de Nazaré acaba impedindo a ação libertadora de Jesus na sua própria cidade. Como sabemos, a fé não é uma reação de convencimento diante de um fato miraculoso, mas uma atitude de abertura que precede o milagre.

 

Sugestões para a meditação

§ Em que medida, e em que ocasiões, você também foi vítima do preconceito das pessoas mais próximas e conhecidas?

§ Não aconteceu de você se escandalizar diante da Palavra ou da ação de Jesus? Nestas circunstâncias, o que você faz?

§ Como Jesus Cristo e seu Evangelho podem nos ajudar a não reduzir as pessoas aos seus erros, à profissão que exerce ou à origem familiar?

§ Será que a mentalidade fechada e o preconceito às vezes também não nos impedem de crer em processos de mudança?

quarta-feira, 30 de julho de 2025

A rede e os peixes

O Reino de Deus é belo e precioso, mas também exigente | 791 | 31.07.2025 | Mateus 13,47-53

Jesus termina a sessão das parábolas do Reino de Deus lançando demonstrando sua preocupação em ser entendido pela multidão e com uma boa formação para os discípulos: “Compreendestes tudo isso?” “Tudo isso” se refere às parábolas e ao dinamismo do Reino de Deus na história, mas também ao seu ensino como um todo. Ele sabe que entre a escuta e a compreensão há um longo caminho de conversão a ser percorrido. E nós também sabemos que a conversão é um dinamismo belo, mas exigente.

Compreender significa aderir à Boa Notícia e colocá-la em prática, e Jesus está consciente do risco de que seus ouvintes não consigam ou não queiram mudar sua mentalidade e visão de Deus e do mundo. E os fatos posteriores mostrarão as dificuldades reais dos discípulos em compreender e mudar. O caminho da conversão de mentalidade é longo e exigente!

Com a explicação da parábola da rede que pega uma grande diversidade de peixes, Jesus volta à questão das práticas de vida contrastantes, tanto na sociedade como na comunidade dos discípulos e discípulas. Os peixes maus ou inaproveitáveis são as pessoas, grupos e setores que resistem aos propósitos de Deus manifestados por Jesus; os bons são os discípulos que perseveram no longo e complexo caminho do amadurecimento.

A tentação do fundamentalismo e da separação dos discípulos que se julgam bons e puros dos outros é permanente, assim como o risco de ficar nas velhas tradições herdadas, nas “antigas lições de viver pela pátria e viver sem razões”. Cada nova geração precisa entender claramente a dinâmica do Reino de Deus na história, que comporta tensões, ambivalências, imperfeições, crescimento. Mas, no final, o mal e os malvados não terão a última palavra.

Tonar-se discípulo de Jesus implica em um compromisso real e consequente com ele e na disposição para aprender sempre, para mudar e alargar a visão e os padrões de avaliação. Jesus é o próprio modelo do especialista na Palavra, que sabe tirar coisas velhas e novas desse tesouro, mais coisas novas que coisas velhas. Os valores valem, mas precisam manter a capacidade de iluminar os novos problemas e os novos desafios. O que é velho, bom, permanente e não muda é somente a misericórdia e a compaixão de Deus. Nisso, Deus continua sempre o mesmo e não muda!

 

Sugestões para a meditação

§ Como o sentido dado por Jesus à parábola da rede ilumina nossas urgências e estimula nossa paciência com quem se mostra lento ou resistente às mudanças?

§ Que luzes a imagem da rede que recolhe peixes bons e ruins traz para nossa convivência familiar, comunitária e social?

§ Como conjugar paciência com urgência, evitando criminalizar ou excluir quem diverge ou se opõe a nós?

terça-feira, 29 de julho de 2025

O tesouro e a pérola

O que estamos dispostos a dar para adquirir o sumo bem? | 790 | 30.07.2025 | Mateus 13,44-46

Estamos diante das últimas parábolas dessa espécie de “cartilha” que é o capítulo 13 do evangelho de Mateus. O capítulo será concluído com algumas novas explicações sobre este gênero de pregação e suas aplicações na vida. Aqui temos aquelas que conhecemos como parábolas do tesouro escondido e encontrado por acaso, e da pérola preciosa ardentemente buscada. Ambas falam, obviamente, da preciosidade incomparável do reino de Deus e da reação de quem se encontra com ele.

O Reino de Deus é o horizonte que dá sentido e direção a tudo o que Jesus busca, anuncia e faz. Seu conteúdo é uma vida plena, fraterna e solidária acessível a todas as pessoas, um mundo no qual haja lugar para todas as criaturas. Pode parecer incompreensível que haja quem se feche a este anúncio, quem o rejeite e se oponha a ela. Na verdade, há quem tenha essa atitude, também hoje: gente que não admite que todos somos iguais em dignidade e possamos compartilhar os mesmos lugares e os mesmos bens; que não abre mão de usufruir de algumas coisas com exclusividade, e que considera a promoção dos outros como uma ameaça aos seus privilégios.

Por isso, as parábolas sublinham a preciosidade, o valor incalculável do Reino de Deus, assim como a reação esperada e adequada de quem se depara com ele. Na primeira parábola, ao que parece, quem encontra o tesouro no campo é um trabalhador, e isso ocorre por acaso. Mas o que ele faz é justo, e nos representa: arrisca todo o pouco que tem e “aposta todas as fichas”, com incontida alegria, no mundo assim como foi imaginado e criado por Deus, e promovido por Jesus. Ninguém entra no alegre dinamismo sem essa ruptura fundamental.

A condição do negociante de pérolas é um pouco diferente: ele se dedica incansavelmente à procura de pérolas finas e valiosas. Quando seu empenho alcança um bom resultado, ele se recusa a vender a pérola preciosa. Ele vende tudo, abandona o ofício de comerciante e passa a dedicar-se integralmente ao Reino de Deus. Ele descobre que o que vale mesmo todas as penas é buscar o Reino de Deus e a sua justiça. O resto, inclusive as perseguições, vêm por acréscimo. Mas esse é o tesouro que o ladrão não rouba e a traça do tempo não corrói.

 

Sugestões para a meditação

§ Escute e leia as duas parábolas com a maior atenção possível, acompanhando com a imaginação a ação e a reação dos personagens

§ Você acha que a Igreja tem conseguido sublinhar adequadamente o valor precioso e desejável do Reino de Deus aos seus membros?

§ Em que medida o reino de Deus e a sua justiça é, para você, a única coisa necessária, o valor pelo qual você tudo troca?

§ Nossa catequese e nossas celebrações conseguem despertar nos cristãos a busca, a alegria e a ousadia? Por quê?

segunda-feira, 28 de julho de 2025

Marta, Maria e Lázaro: amigos de Jesus

Betânia é o ambiente da acolhida fraterna e calorosa | 789 | 29.07.2025 | João 11,19-27

Marta, discípula e amiga de Jesus, é mais conhecida pela passagem de Lucas, onde ela aparece atazanada com os afazeres domésticos e reclama da passividade de Maria, sua irmã, empenhada na escuta de Jesus. Ambas moravam em Betânia e são irmãs de Lázaro. Este núcleo de acolhida e convivência fraterna era frequentado com gosto por Jesus. O texto ilumina a memória dos três santos, que o Papa Francisco propôs à Igreja.

A cena de hoje faz parte de um conjunto literário maior, que é a enfermidade, a morte e o reerguimento de Lázaro. O pequeno fragmento oferecido à nossa meditação começa com um clima de desolação, lamentação ou fim de festa. A desolação é ainda maior porque todos sabem que Jesus fora avisado da enfermidade do amigo, e não quis mudar sua agenda a tempo de chegar para curá-lo. Os judeus se mostram amigos de Marta e Maria, e chegam para consolar as duas irmãs pela morte de Lázaro.

Marta sai ao encontro de Jesus na estrada, e começa o diálogo manifestando sua dor e censurando-o: “Se tivesses estado aqui, meu irmão não teria morrido...” Ela espera de Jesus um benefício, pois o considera um potente curador. Ela ainda não sabe o que significa o seu amor, e vê Jesus como apenas um mediador poderoso da ação de Deus. Sua crença na ressurreição é para o final dos tempos. Sua adesão a Jesus é imatura, parcial e insuficiente, como a dos demais discípulos.

A passagem da morte para a vida se dá no encontro pessoal e profundo com Jesus e na adesão a ele. Porque Jesus é Vida, a morte não tem poder sobre ele e sobre quem acredita nele. O “último dia” é antecipado na cruz, do alto da qual ele abraça a humanidade sem excluir ninguém, e derrama seu Espírito de vida. Quem recebe o Espírito de Deus e se deixa mover por ele não conhecerá a morte nem o medo.

Marta percebe que a fé tradicional não é suficiente e pronuncia uma bela profissão de fé: Jesus é vida e ressurreição, o Ungido e Filho de Deus, enviado para que todos tenham vida. Ela chega à maturidade da fé, e não lamenta mais a morte, porque conhece a Vida. E, como discípula missionária que chegou à maioridade, ela nos ensina o valor da acolhida fraterna no seguimento de Jesus.

 

Sugestões para a meditação

§ Você se reconhece no lamento de Marta, que se interroga porque Jesus não evita ou remedia certas situações dolorosas?

§ Você crê firmemente que aderir a Jesus é passar da morte para vida já agora? Como você expressa essa fé e essa adesão a ele?

§ Como acolher a fé na ressurreição como dinamismo de esperança e compromisso histórico, e não como desprezo da história concreta?

§ O que você está disposto a colocar hoje nas mãos de Jesus para que ele ajude a diminuir o sofrimento do seu povo?

domingo, 27 de julho de 2025

A força dos pequenos

As forças mais fecundas estão nas pequenas sementes | 788 | 28.07.2025 | Mateus 13,31-35

Já vimos que Jesus prefere anunciar o mistério do Reino de Deus através de parábolas. As parábolas são um recurso sapiencial e popular que usa imagens da experiência cotidiana e exige o engajamento do ouvinte na interpretação. Aos discípulos, Jesus se comunica de modo mais explicativo, mas às multidões ele prefere usar as parábolas.

Nas parábolas de hoje, explicitamente relacionadas com o Reino de Deus, ou Reino dos Céus, na linguagem contida de Mateus, Jesus recorre às imagens da semente de mostrada e do fermento e parte da experiência agrícola e doméstica. Enquanto a parábola do semeador chama a atenção sobre a ação de semear e as condições da terra, as de contrastam o pequeno e o pouco de hoje com a grandeza e a força no futuro.

Jesus tem presente que o aparente fracasso do Reino que ele prega não se deve unicamente à oposição que muitos grupos fazem a ele, mas também à própria natureza do reino de Deus. O Reino de Deus não cresce ao modo dos impérios e poderes políticos, nem se impõe pela força e pela grandeza, mas de modo discreto e escondido, lentamente, corroendo a lógica do poder e do egoísmo como o fermento corrompe a farinha.

As parábolas do Reino de Deus nos chamam a manter os pés e mãos no tempo presente, mas sem deixar de vislumbrar o futuro, com realismo e esperança. O projeto alternativo do Reino de Deus, como o fermento escondido pela farinha, é invisível aos olhos da elite, mas lentamente vai minando o status quo e, de pequeno e quase invisível como a semente de mostarda, se torna hortaliça frondosa à sobra da qual os povos e pessoas oprimidas e frágeis (aves) encontram acolhida.

Às vezes, aquilo que nós e nossas organizações e grupos fazemos parece muito pequeno e insignificante, praticamente sem futuro. Mas, como é difícil medir a força de crescimento contida numa minúscula semente, embora seja real e palpável, é-nos pedida a confiança de que aquilo que é bom perdura e se multiplica. Somos peregrinos de esperança.

O texto termina com frases que nos causam desconforto. Mas o sentido delas pode ser expresso assim: alguns ouvem e entendem a mensagem do Reino de Deus e outros não entendem e rejeitam. Mas a salvação de Deus é oferecida a todos, e está aberta até àqueles que a rejeitam. E isso é bom!

 

Sugestões para a meditação

§ De que modo estas parábolas, assim como toda a vida e ensino de Jesus, podem nos ensinar a unir realismo e esperança, paciência e urgência?

§ Você nota alguma “fermentação” evangélica na sua vida desde que você começou a praticar a Leitura Orante do Evangelho?

§ O que podemos fazer para que o fermento do Evangelho ajude nossas famílias e a Igreja a serem melhores?

A Igreja e a COP-30

A urgência de uma profunda conversão ecológica

Em meados de junho passado, representantes da Igreja Católica da África, da Ásia e da América La­tina e Caribe se reuniram para aprofundar as demandas do ‘sul global’ para COP30 (Cúpula nas Nações Unidas sobre o Clima). No final, comprometeram as Igrejas desses continentes a somar sua voz às vozes das ciências, da sociedade civil e dos setores mais vulneráveis para alcançar uma verdadeira e ampla justiça ambiental e social.

As constatações são conhecidas e preocupantes. A maioria absoluta dos países não buscou com seriedade e urgência as metas da COP21, conhecida como Acordo de Paris (2015). A crise climática é uma realidade urgente e palpável, como sentimos na pelo em nossa região. Em 2024 atingimos o ameaçador aumento 1,55°C na média da temperatura global. E isso não é apenas um problema técnico, mas humanitário e global.

Para evitar os efeitos catastrófi­cos dessa elevação da temperatura é necessário limitar o aquecimento global a 1,5°C, e jamais devemos abandonar essa meta. O ‘sul global’, especialmente a população mais pobre, já sofre as consequências disso. Soluções como o ‘capitalismo verde’, o comércio de carbono e o extrativismo são soluções limitadas ou falsas, e apenas adiam o problema e perpetuam exploração e injustiça.

Por isso, a Igreja Católica propõe substituir estas soluções falsas e insuficientes por soluções justas e equitativas. E o primeiro caminho para isso é exigir das nações ricas o pagamento da sua dívida ecológica com as nações mais pobres, através do financiamento de iniciativas que assegurem o clima como bem comum, reparem as perdas e danos e potencializem a resiliência na África, América Latina e Caribe, Ásia e Oceania.

Um segundo caminho é a tomada de medidas concretas para a substituição dos combustíveis fósseis por energias renováveis, a interrupção de todas as novas infraestruturas de exploração de combustíveis fósseis, e a taxação pesada dos países que se beneficiam deles. Nesse horizonte estão também as políticas de ‘descrecimento econômico’ e a colocação dos povos mais afetados pelas crises no centro da discussão.

Um terceiro conjunto de soluções agrupa a defesa dos povos indígenas e tradicionais e dos ecossistemas e comunidades empobrecidas. Junto está o reconhecimento da maior vulnerabilidade de mulheres, meninas e novas gerações. E o tratamento das migrações climáticas como um desafio global no horizonte da justiça global e dos direitos humanos.

As Igrejas do ‘sul global’ desafiam as autoridades nacionais se comprometerem com ações inadiáveis:  cumprir as metas e compromissos do Acordo de Paris; priorizar o bem comum acima do lucro; implantar uma economia que priorize o bem-es­tar das pessoas e a sustentabilidade do planeta; promover políticas climáticas ancoradas nos direitos humanos; implementar soluções tecnológicas éticas e descentralizadas; f) restaurar os ecossistemas aquáticos e terrestres e reduzir o desmatamento a zero até 2030; fortalecer os processos e organismos democráticos multilaterais.

Por fim, a Igreja convoca seus fiéis a uma série de compromissos pessoais e comunitários: defender os setores sociais mais vulneráveis; promover economias baseadas na solida­riedade, na sobriedade feliz e no bem viver; fortalecer a cultura do cuidado, da cooperação e da solidariedade; monitorar os resultados das COP’s; promover a cooperação entre Norte e Sul na solução das crises. Estes são compromissos de todos!

Dom Itacir Brassiani msf

Bispo Diocesano de Santa Cruz do Sul

Um pai que não dorme!

“PAI NOSSO”

Do Pai Nosso tudo se disse. É a oração por excelência. O melhor presente que Jesus nos deixou. A mais sublime invocação a Deus. E, no entanto, repetida uma e outra vez pelos cristãos, pode converter-se em oração de rotina, palavras que se repetem mecanicamente sem elevar o coração a Deus.

Por isso, é bom que nos detenhamos de vez em quando para refletir sobre esta oração na qual toda a vida de Jesus está encerrada. Logo perceberemos que só a podemos rezar se vivermos com o Seu Espírito.

«Pai Nosso»". É o primeiro grito que brota do coração humano, quando vive habitado não pelo temor a Deus, mas por uma plena confiança no seu amor criador. Um grito no plural àquele que é o Pai de todos. Uma invocação que nos enraíza na fraternidade universal e nos faz responsáveis diante dos outros.

«Santificado seja o vosso Nome». Esta primeira petição não é apenas mais uma. É a alma de toda esta oração de Jesus, a sua aspiração suprema. Que o «nome» de Deus, isto é, o seu mistério insondável, o seu amor e o seu poder salvífico, se manifeste em toda a sua glória e poder. E isto dito não numa atitude passiva, mas a partir do compromisso de colaborar com a nossa própria vida nessa aspiração de Jesus.

«Venha a nós o vosso reino». Que a violência e o ódio destrutivo não reinem no mundo. Que Deus e a sua justiça reinem. Que o Primeiro Mundo não reine sobre o Terceiro, os europeus sobre os africanos, os poderosos sobre os fracos. Que o homem não domine a mulher, nem o rico o pobre. Que a verdade se torne dona do mundo. Que se abram caminhos à paz, ao perdão e à verdadeira libertação.

«Seja feita a vossa vontade». Que não encontre tanto obstáculo e resistência em nós. Que toda a humanidade obedeça ao apelo de Deus, que desde o fundo da vida convida o ser humano à sua verdadeira salvação. Que a minha vida seja hoje mesmo uma procura dessa vontade de Deus.

«Dai-nos o pão de cada dia». O pão e o que precisamos para viver dignamente, não só nós, mas todos os homens e mulheres da Terra. E isto dito não desde o egoísmo acumulador ou o consumismo irresponsável, mas desde a vontade de partilhar mais do que é nosso com os necessitados.

«Perdoai-nos». O mundo precisa do perdão de Deus. Nós seres humanos só podemos viver pedindo perdão e perdoando. Aqueles que renunciam à vingança desde uma atitude aberta ao perdão assemelham-se a Deus, o Pai bom e perdoador.

«Não nos deixeis cair em tentação». Não se trata das pequenas tentações de cada dia, mas da grande tentação de abandonar Deus, esquecer o Evangelho de Jesus e seguir um caminho errado. Este grito de socorro fica ressoando nas nossas vidas. Deus está conosco diante de todo o mal.

José Antônio Pagola

Tradução de Antônio Manuel Álvarez Perez