Jesus é pastor, porta e
caminho para uma vida abundante
O quarto
domingo do tempo pascal é marcado pela bela imagem do bom pastor. É uma
metáfora poética que nos conduz ao mundo pastoril e sugere presença, carinho,
ternura, conhecimento, orientação, segurança. Reunida em torno do ressuscitado
e convicta de que ele lhe daria quantas vidas tivesse, a comunidade cristã pede
a Deus que, apesar da sua fraqueza e das suas contradições, encontre segurança
no pastor bom, aprenda a reconhecer sua voz, como a mãe conhece os sussurros
dos filhos, e se comprometa com a missão de despertar, chamar, formar e enviar
as diversas vocações eclesiais.
O
Espírito Santo, dom que nos vem do Pai pelo Filho, possibilita aos discípulos e
discípulas, não obstante as barreiras do tempo e do pecado, uma relação pessoal
com Jesus Cristo. E esta relação começa com a experiência de ser chamado pelo
nome, pelo que somos realmente. A Deus não importam as funções hierárquicas, os
papéis sociais ou eclesiais, os títulos de crédito ou de honra, as fraquezas
éticas e morais, mas unicamente o nome, a realidade humana que existe e
subsiste sob toda esta indumentária, maquiagem ou sujeira. O nome expressa nossa
identidade mais profunda e original.
Reconhecendo
a voz daquele que nos chama pelo nome, descobrimos também que Jesus nos conduz
para fora. Ao bom pastor não interessa atrair o rebanho para dentro de um redil
e conservá-lo seguro, mesmo que este redil se chame Igreja. Ele não quer
conduzir as pessoas a uma vida interior projetada como indiferença para com o
mundo exterior. Como bom pastor, ele chama pelo nome e conduz aqueles que o
ouvem para fora de si mesmos e para fora de um sistema que anestesia e,
concomitantemente, separa, hierarquiza e aprisiona as pessoas. O Bom Pastor nos
chama e nos manda sair às periferias! Ele não apenas pronuncia nosso nome com
delicadeza: ele nos confia uma missão, ele nos envia!
Neste
percurso, o próprio Jesus caminha à nossa frente, livre e solidário, militante
e sonhador, cordeiro e pastor. Ele não considera suficiente despertar os homens
e mulheres e mostrar-lhes um caminho. Ele se faz caminho e companheiro de
caminhada, um pouco à frente para dissipar medos e incertezas, mas sempre
próximo para curar feridas e fortalecer nos tropeços. No fim, ele é porta
aberta em forma de cruz, passagem-páscoa para a liberdade, seta que aponta para
um outro mundo possível e urgente. O importante é reconhecer sua voz que nos
chama pelo nome e nos manda sair porta a fora de nós mesmos.
Enquanto
pastor, além de manter uma relação personalizada com cada pessoa, Jesus também
reúne um rebanho, uma comunidade, uma coletividade. O caminho de saída, sem
deixar de ser pessoal e tocar a cada um, é sempre comunitário, solidário. Somos
ovelhas do seu rebanho, membros de um povo solidário no pecado e na graça.
Recebemos o bônus e o ônus de estarmos ligados a um povo e a um mundo que
caminha para a liberdade tropeçando nos próprios pés, mas que também mantem o
olhar fixo naquele que vai à sua frente. Deus quis nos salvar constituindo-nos
como povo!
O sonho
de Deus, afirmado, firmado e confirmado por Jesus Cristo, é que a vida floresça
em todas as dimensões, em todas as criaturas. Não se trata de uma vida miúda,
apertada e resignada, mas de uma vida abundante, transbordante, de um bem
viver. Esta vida não germina senão na terra fecundada pelo dom de si. É
entrando e saindo do redil de Jesus Cristo, vivendo nossa vida como dom, que
encontraremos pastagem. É na ousadia de ir além dos limites e muros erguidos
para defender privilégios e ideologias mesquinhas que encontraremos o alimento
que sustenta esta vida tão sonhada.
Escrevendo
a uma comunidade imersa numa situação de dura perseguição, Pedro convida os
cristãos de todos os tempos a suportarem com paciência, como Jesus, os
sofrimentos causados por terem feito o bem. Isso porque a vida abundante é um
milagre que costuma contar com o engajamento crítico e profético de homens e
mulheres que, conscientes de serem chamados para fora, se engajam na política,
nas iniciativas e movimentos que protestam, reivindicam e transformam as
estruturas sociais, jurídicas e econômicas e, com isso, acabam atraindo
incompreensões, difamações e perseguições.
Senhor da messe e pastor do rebanho: faz que
reconheçamos tua voz e tua presença no meio de nós e à nossa frente. Ajuda-nos
a suportar com serenidade as perseguições que nosso trabalho e testemunho porventura
causarem. Dá-nos coragem e liberdade para fazermos da Igreja um lugar de
passagem, um espaço onde entramos e de onde saímos para transformar o mundo.
Concede-nos mais operários para o trabalho do Reino, mas também a corajosa
liberdade de remover os entulhos de leis e tradições que impedem a tantos
irmãos e irmãs realizar sua própria vocação. Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
(Atos dos
Apóstolos 2,14.36-41 * Salmo 22 (23) * 1ª. Carta de Pedro 1,20-25 * Evangelho
de Joao 10,1-10)
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