quarta-feira, 13 de setembro de 2017

ANO A – VIGÉSIMO-QUARTO DOMINGO DO TEMPO COMUM – 17.09.2017

Sejamos incansáveis agentes do perdão e da reconciliação!
A vingança implacável e violenta hoje é quase uma exceção e, por isso, quando ocorre, torna-se notícia. Mas isso não quer dizer que as tensões tenham sido resolvidas e que os débitos tenham sido realmente perdoados e eliminados da convivência social. Os débitos e ofensas tem hoje uma conotação mais psicológica e social que moral, e às vezes se diluem numa situação que se criou sem culpa. Assim, muitos pensam que os pobres, os negros, as mulheres, os indígenas e outros, devem se contentar com um lugar subalterno e marginal, e não são perdoados quando ousam questionar esta ordem desordenada...
A parábola que Jesus propõe no evangelho deste domingo parte de uma pergunta que Pedro faz, como sempre, em nome dos discípulos: até quantas vezes devemos perdoar os irmãos e irmãs? Por trás da pergunta está a experiência viva de uma comunidade que enfrenta situações de tensão, de ofensa e pecado. Pedro não escamoteia esta situação, mas pensa que perdoar até sete vezes seja um inequívoco e suficiente sinal de generosidade. Efetivamente, essa já seria uma radical e corajosa inversão da postura de Lamec, que propunha vingar sete vezes quem agredisse Caim (cf. Gn 4,24).
A resposta de Jesus é contundente: “Não até sete vezes, mas até setenta vezes sete vezes!” Sua intenção é clara: o perdão aos irmãos e irmãs não deve ter limites, pois não é uma questão de números, mas de espiritualidade e de ética. E, para ilustrar aquilo que afirma, Jesus conta uma parábola, na qual contrapõe a pratica esperada de um cristão com a de um empregado que, mesmo tendo uma grande dívida perdoada por seu patrão, se nega a perdoar uma pequena dívida do seu companheiro. As ações do rei destoam do ensino de Jesus Cristo, mas Jesus não se preocupa com nossos fajutos pudores morais...
Precisamos também superar uma visão moralista e superficial das ofensas e débitos. A dívida do escravo da parábola é absolutamente impagável: 10 mil talentos equivalente ao tributo que o rei Pompeu exigiu de Israel depois de conquistá-lo! Ademais, o foco do ensino de Jesus nesta parábola não é o nosso pecado, mas o pecado ou a dívida dos irmãos. Muitos pensam que as pessoas nas escalas inferiores devem obediência e respeito às das pessoas das escalas superiores; que os pobres devem se contentar com as migalhas mal-humoradas dos ricos; que os leigos devem se submeter aos ministros ordenados...
O núcleo do ensino de Jesus é a conexão indissociável entre receber perdão e dar perdão. E isso é lustrado na relação que a parábola estabelece entre o perdão de uma enorme dívida, que o empregado recebe incondicionalmente do rei, e a sua falta de compaixão para com o companheiro que lhe devia algo insignificante. Esse empregado se mostra surdo e indiferente aos apelos do irmão, e o trata com violência (agarra, sufoca e joga na prisão). Até seus companheiros ficam impressionados diante de tanta violência. É isso que faz o rei voltar atrás e revelar que sua compaixão não era sincera nem profunda.
É sobre isso é que Jesus chama a atenção: “É assim que o meu pai que está nos céus fará convosco, se cada um não perdoar de coração ao seu irmão!” Se a vontade de Deus, que é estender seu perdão a todas as relações humanas, não for levada a sério, ele se verá forçado a agir como o rei da parábola. Aqui Deus não é o ‘rei dos céus’ mas o ‘pai que está nos céus’, e enquanto pai, nutre e testemunha um amor indiscriminado (cf. Mt 5,45-48), um amor que responsabiliza os discípulos. A misericórdia de Deus é um dinamismo que deve sustentar um modo de vida também misericordioso nos discípulos.
Quem não consegue perdoar, não alcançou a verdadeira liberdade. Viver sob o ressentimento, cobrando eternamente as ofensas cometidas, exigindo o pouco que os outros devem, é uma terrível escravidão que impede nosso amadurecimento humano e espiritual. Paulo diz que que somos nós que devemos amor ao próximo e não eles a nós (cf. Rm 13,8), e pede que sejamos acolhedores e compreensivos com aqueles que se mostram mais fracos na fé. Ele nos ensina que o núcleo da fé não é nossa honra ou nossos méritos, mas Jesus Cristo e seu Reino. “Ninguém vive para si mesmo ou morre para si mesmo. Se estamos vivos, é para o Senhor que vivemos, e se morremos, é para o Senhor que morremos...”
Deus pai e mãe, o resumo da tua palavra é a verdade (cf. Sl 119/118,160). Hoje tua Palavra nos ensina que o perdão, tanto quando é recebido quanto quando é dado, é um dom que nos faz livres e resgata a igualdade essencial de todas as pessoas. Que teu Espírito e a participação na eucaristia, a mesa dos iguais, dos pecadores reconciliados, nos liberte da ira que mutila, das cobranças infantis, das acusações desequilibradas. Faz da nossa comunidade um laboratório de perdão e de igualdade, e, da Igreja inteira, um movimento capaz de fecundar o mundo e a história com a força do perdão. Assim seja! Amém!

Itacir Brassiani msf
(Livro do Eclesiástico 27,33-28,9 * Salmo 102 (103) * Carta aos Romanos 14,7-9 * Evangelho de S. Mateus 18,21-35) 

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