Esperar atentamente e
engajar-se lucidamente!
No
domingo passado recordamos, com pesar, os dois anos da catástrofe ecológica e
social de Mariana. Por criminosa irresponsabilidade de empresários e
administradores públicos, desapareceu o povoado de Bento Rodrigues, morreram 17
pessoas, centenas foram desalojadas, milhares ainda sofrem com a água contaminada e uma multidão é duramente golpeada pelos danos à fauna, que devem se
prolongar por décadas. Isso faria parte das coisas imprevisíveis e inesperadas?
Jesus estaria se referindo a isso quando diz “ficai vigiando, pois não sabeis
qual será o dia, nem a hora”?
Seguramente,
não! Jesus está falando sobre o mistério e o dinamismo do reino de Deus, que
traz tudo de bom para todos, e passa longe das pregações de mau gosto e
interesse suspeito que se tornaram comuns na boca de pastores de ocasião. Jesus
insiste na necessidade de preparar-nos adequadamente para esse acontecimento,
que se manifesta discretamente, que cresce como a semente escondida na terra,
mas um dia deve aparecer em toda a sua beleza e força. A manifestação do reino
de Deus é algo que devemos desejar, porque é benéfico para a humanidade toda, e
preparar, porque sua edificação depende de nós!
É claro
que isso não tem nada a ver com o propalado e temido fim do mundo, ao menos do
mundo em sentido físico. A irrupção do reino de Deus significa o fim de um mundo, deste mundo de competição
predatória, de dominação violenta, de exploração desmedida, de indiferença
globalizada, de soberba inflacionada, de desigualdade absurda. Trata-se do fim
deste “mundo imundo” e da manifestação de um novo modo de viver e conviver, de
trabalhar e consumir, de crer e de celebrar, de fazer alianças e de lutar. E esse
fim nos encanta e estimula, como a chegada do noivo, com o que se inicia a
festa.
Para
guiar-nos nessa esperança que faz caminhar, Jesus nos conta a parábola das dez
moças que saíram ao encontro do noivo que devia chegar para que a festa
começasse. Cinco jovens, desavisadas e desatentas, pouco lúcidas e muito
afoitas, pegaram lâmpadas mas não se preocuparam com uma reserva de óleo;
pensavam que a espera era coisa de pouco tempo... As outras cinco,
entusiasmadas como as demais, porém mais previdentes, levaram uma pequena
reserva de óleo, prevendo a possibilidade de que a vigília e a espera fossem
mais longas do que gostariam.
E foi
exatamente isso que aconteceu! A vinda do noivo demorou mais que o previsto, e
as lâmpadas do grupo mais afoito se apagaram. Enquanto foram improvisar uma
solução, o noivo chegou, as outras moças o acolheram e foram recebidas na
festa. E as portas se fecharam. Com as lâmpadas tardiamente reabastecidas e
acesas, o primeiro quinteto bateu com insistência, mas sem sucesso. O noivo
disse que não conseguia reconhecê-las, pois quem se fez sua amiga e discípula vive
vigilante e se engaja ativamente. O discípulo de Jesus é movido e guiado pela
sede do Reino de Deus...
A atitude
de vigilância recebe destaque na liturgia de hoje porque estamos nos
aproximando do fim do ano litúrgico, e isso pede que pensemos também no fim do
mundo e no fim da vida. Mas nisso a gente não gosta muito de pensar... Pensemos
então num fim de campeonato de futebol: como a rodada final é esperada,
preparada, encarada com seriedade. Haja treinamento! A diferença é que o final
de um campeonato tem uma data prevista, mas a expectativa, a preparação, a
ansiedade, são semelhantes ao que se espera em relação à irrupção do reino de
Deus, que não tem data marcada.
No Brasil,
vivemos tempos sombrios, “temerosos”, devastadores como o “acidente” de Mariana
e mais destruidor que a deplorável corrupção. Um Executivo golpista e
impopular, secundado por um Congresso que não representa a nação e legitimado
por uma Justiça vesga, caça um por um direitos sociais que custaram anos de
luta, suor e sangue. Com a criminosa conivência da grande imprensa, vende o
patrimônio coletivo e achincalha a democracia. Não podemos esperar que isso se
acabe por decurso de prazo. Precisamos imitar as jovens prudentes, munir-nos do
óleo da indignação e partir para a luta. Neste sentido, “esperar não é saber”, e
“quem sabe, faz a hora, não espera acontecer...”
Deus Pai e Mãe, Compaixão e Misericórdia, Sabedoria
dos humildes, Força dos fracos: teu filho nos pede vigilância e engajamento,
para que não fiquemos fora da festa da Vida. Que a tua Sabedoria venha ao nosso
encontro, acorde-nos do sono letárgico e desperte-nos para a profecia. Que
nossos pensamentos, noturnos e diurnos, sejam o teu Reino. Que nas vigílias
suspiremos por ele. Que seja por ele o cântico que brota dos nossos lábios. E
que os eventos que celebramos nos próximos domingos – dia dos pobres e dia dos
leigos – provoquem atitudes e iniciativas que deem novo rosto à tua Igreja.
Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
(Livro da Sabedoria 6,12-16 * Salmo 62 (63) * 1ª.
Carta aos Tessalonicenses 4,13-18 * Evangelho de São Mateus 25,1-13)
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