quinta-feira, 26 de setembro de 2019

O Evangelho dominical (Pagola) - 29.09.2019


QUEBRAR A INDIFERENÇA

Segundo Lucas, quando Jesus gritou que não se pode servir a Deus e ao dinheiro, alguns fariseus que o ouviam e eram amigos do dinheiro riram-se dele. Mas Jesus não recua, e conta uma parábola comovente para que aqueles que vivem escravos da riqueza possam abrir os olhos.
Jesus descreve em poucas palavras uma situação dramática. Um homem rico e um mendigo pobre, que vivem perto um do outro, estão separados pelo abismo que há entre a vida de opulência insultante do rico e a miséria extrema do pobre.
A história descreve os dois personagens enfatizando fortemente o contraste entre os dois. O homem rico está vestido de púrpura e linho fino, o corpo do pobre está coberto de feridas. O rico banqueteia-se esplendidamente, não apenas nos dias de festa, mas diariamente; o pobre está deitado na sua porta, incapaz de levar à boca o que cai da mesa do homem rico. Apenas os cachorros que procuram algo no lixo lambem suas feridas.
Não se fala em nenhum momento que o homem rico tenha explorado o pobre ou que o tenha maltratado ou desprezado. Poderíamos dizer que não fez nada de mal. No entanto, toda a sua vida é desumana, pois só vive para o seu próprio bem-estar. O seu coração é de pedra. Ignora totalmente o pobre. Tem-no à sua frente, mas ele não o vê. Está ali mesmo, doente, faminto e abandonado, mas não consegue atravessar a porta para tomar conta dele.
Não nos enganemos. Jesus não está a denunciar apenas a situação da Galileia dos anos trinta. Está tentando mexer com a consciência daqueles que se acostumaram a viver na abundância, tendo junto ao seu portal, apenas a algumas horas de voo, a povos inteiros vivendo na miséria mais absoluta.
É desumano fechar-nos na nossa sociedade do bem-estar ignorando totalmente essa outra sociedade do mal estar. É cruel continuar a alimentar essa secreta ilusão de inocência que nos permite viver com a consciência tranquila, pensando que a culpa é de todos e de ninguém.
A nossa primeira tarefa é quebrar a indiferença. Resistir a desfrutar de um bem-estar vazio de compaixão. Não continuar a isolar-nos mentalmente para deslocar a miséria e a fome que há no mundo em direção a uma afastamento abstrato, para poder assim viver sem ouvir nenhum clamor, gemido ou choro.
O Evangelho pode nos ajudar a viver vigilantes, sem tornarmo-nos cada vez mais insensíveis aos sofrimentos dos abandonados, sem perder o sentido da responsabilidade fraterna e sem permanecermos passivos e omissos.
José Antônio Pagola.
Tradutor: Antônio Manuel Álvarez Perez.

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