quarta-feira, 13 de novembro de 2019

ANO C | TEMPO COMUM | TRIGÉSIMO-TERCEIRO DOMINGO | 17.11.2019


Como construir o Reino de Deus em tempos tão difíceis?
Jesus não se deixa enganar pelo gesto meticulosamente pensado dos ricos que versam volumosas esmolas, banhadas de sangue, no tesouro do Templo. Lúcido e corajoso, ele critica a exploração que elas encobrem. Mas alguns dos seus discípulos se extasiam diante da grandiosidade dos muros e das ofertas. Será que imaginam que Deus vem a nós montado no poder, e que sua glória se expressa nos templos suntuosos? Será que a eternidade e a estabilidade são privilégios do poder e da grandeza? Será que o amor humilde e perseverante carece de brilho e de esplendor? Será que os últimos serão sempre os últimos?
Para Jesus, o futuro não é uma simples continuação dos horrores e injustiças do presente. Ele se inspira no horizonte do profeta Malaquias, para quem, no projeto de Deus há um ‘dia do Senhor’, um dinamismo semelhante ao fogo que queima como palha o atrevimento daqueles que praticam injustiças: deles não sobrará nem raízes, nem ramos. Mas, para os oprimidos, este Dia surge como sol depois de uma tempestade, fazendo-os saltar de alegria. A força de Deus que age mediante pessoas, grupos e comunidades frágeis e perseverantes reduzirá a nada as grandezas erguidas com o sangue e o suor dos pobres.
Por isso, Jesus não se impressiona com a aparente estabilidade do Templo. “Dias virão em que não ficará pedra sobre pedra. Tudo será destruído.” Ele não prevê uma vingança do destino, nem algo que acontecerá independente da ação humana. Mas quem crê nesta Palavra se liberta da sedução das grandes coisas e, na mesma medida, começa a desestabilizar os podres poderes nas suas próprias bases. Em nenhum momento, porém, Jesus nos assegura que esse caminho será fácil, pleno de êxito e de glória. Ao contrário, ele insiste que a luta é grande e difícil. O que ele faz é assegurar sua presença ao lado dos que permanecem na luta.
Viver na nostalgia e na expectativa dos grandes eventos, momentos e monumentos é contrário ao espírito de Jesus. O caminho daqueles que levam em seu corpo as marcas do crucificado é o único capaz de transportar vida e garantir fidelidade à Igreja do Senhor. Mas precisamos ficar atentos, pois, nos momentos de crise, quando os caminhos se bifurcam e os poderes estabelecidos inventam novas formas de opressão, costumam surgir mensageiros que se apresentam como libertadores, propondo estranhos caminhos de salvação e assegurando que ela está à porta. E anunciam, cinicamente: “Deus acima de tudo!”
Jesus pede que não sejamos ingênuos, e diz claramente: “Não andeis atrás desta gente!” Não podemos dar crédito a mensagens e mensageiros alheios ao Evangelho, que passam à margem da compaixão com os pobres e da humildade da semente de mostarda. E isso mesmo quando tais mensagens e mensageiros vêm do interior da Igreja e revestidos de ostensiva piedade. Não podemos seguir aqueles que nos distanciam de Jesus Cristo e seu Evangelho, fundamento, origem e meta da nossa fé. Não podemos também ceder a propostas de fuga dos conflitos e de espera passiva da intervenção de Deus.
É verdade que, nos momentos de crise, somos tentados a pedir demissão da condição de discípulos missionários ou a lançarmo-nos afoitos na restauração de estruturas caducas que parecem dar segurança. Jesus aponta para uma direção diferente. Nos tempos difíceis e contraditórios é preciso aprofundar as raízes, ampliar os horizontes, identificar o que é essencial e inegociável. O planejamento da própria defesa não pode consumir nossas melhores energias! Insegurança, marginalização e perseguição não são sinais de fracasso, mas convite a anunciar o Evangelho com a vida. “Será uma ocasião para dardes testemunho...”
Cada geração tem seus próprios problemas e desafios. Sem perder a calma, precisamos encontrar a forma adequada de testemunhar aquilo que cremos e esperamos. Não precisamos sonhar com heroísmos que ultrapassam as nossas forças, nem com defesas e seguranças que impedem que nos tornemos adultos na fé. Não podemos sacrificar a vocação profética no ambíguo altar da apologética.  Jesus não promete vida fácil para quem segue seus passos. O sucesso é mera possibilidade, mas a perseverança na luta é uma obrigação.
Jesus, sonhador indomável, verbo eloquente e profeta perseguido: fica conosco nestes tempos difíceis, de ruína e de reconstrução do mundo, da Igreja e do Brasil. Ensina-nos a viver a fé, a cultivar um estilo de vida paciente e tenaz, liberto e criativo, que nos ajude a responder aos muitos desafios sem perder a serenidade, nem a lucidez e a coragem.  Ajuda-nos a construir o mundo que sonhaste nas situações adversas nas quais vivemos, sem medo, sem passividade e sem ingenuidade, esperando como se tudo dependesse de ti e sendo criativos como se tudo dependesse de nós. Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf


Profecia de Malaquias 3,19-20 | Salmo 97 (98)
2ª Carta de Paulo aos Tessalonicenses 3,7-12 | Evangelho de São Lucas 21,5-19

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