quinta-feira, 22 de dezembro de 2022

Ano A | Tempo do Natal | Vigília da Noite do Natal | 24.12.2022

A notícia dessa noite é boa, verdadeira e para todas/as!

Estamos quase acostumados com meias verdades e mentiras. Elas imperam nos comerciais, predominam nas campanhas políticas, germinam no interior das famílias, contaminam as religiões e igrejas. Batem à nossa porta e entram em nossa intimidade com nomes que disfarçam: publicidade, programas, segredo, subjetividade, promessa divina. Recebem o nome “civilizado” de narrativas, ou de fake news. Será que o nascimento não faz parte desse conjunto de coisas?

Naquele tempo, quando Quirino governava, César Augusto decretou em Roma uma medida que mexeu com a vida do povo de Israel. A canga da opressão política, econômica e religiosa vergava o pescoço dos pobres; a prepotência dos fiscais se superava a cada dia na forma e na intensidade; as tropas de soldados, com suas botas ruidosas e suas fardas ensanguentadas, desfilavam para assustar o povo da roça e da cidade; e o povo vivia como os pastores, obrigados a trabalhos noturnos e acossados permanentemente pelo medo de tudo e de todos.

Em nosso tempo, sentimo-nos encurralados pelos discursos agressivos e ameaçadores de grupos saudosos do escravagismo, apaixonados pela tortura, casadas com a violência e amantes das fardas verde-oliva. Estas elites, mancomunadas com a imprensa mercantilista, não aceitam que o povo tenha rejeitado um projeto de segregação social, de limitação de direitos, de ódio aos indígenas e imigrantes, de intolerância com o pensamento divergente, de segurança jurídica para os capitalistas às custas da insegurança dos trabalhadores. Também hoje a noite é escura.

A escuridão tenebrosa dessa noite assusta e abate, a mentira repetida toma feições e cores de verdade, a intolerância e a violência rondam nosso pensamento e nos tentam como saídas viáveis e desejáveis. Mas a memória do nascimento de Jesus em Belém, da sua pregação na Galileia, da sua ação livre, destemida e libertadora no caminho a Jerusalém, da ousada firmeza diante dos podres poderes, abre nossos olhos, enxuga nossas lágrimas, põe fogo nas cangas ideológicas que nos cegam e nas botas e fardas manchadas de sangue. Damo-nos as mãos e cantamos, desafiando a noite.

A alegria suscitada pela encarnação de Deus não é fake news, nem uma entre as outras alegrias que experimentamos, não se equipara à que sentimos quando adquirimos um bem desejado, recebemos a visita esperada, conseguimos a vitória nas urnas ou no campo. É uma alegria intensa, profunda e imensa, inexplicável. Ela vem da certeza de que na fragilidade de uma criança a justiça que e a paz que aspiramos se entrelaçam e completam; que a luz do Evangelho ilumina e elimina as trevas e abre caminhos, evidenciando a irmandade universal; que o mundo imundo não é eterno.

A celebração do Natal suscita essa alegria porque, em Jesus, a graça de Deus se manifesta e confirma a dignidade e o valor das pessoas excluídas da lista dos meritórios “homens de bem”. O Natal suscita esperança porque revela que a força da mudança mora em nós, em nossa capacidade de viver com piedade, equilíbrio e justiça. Assumindo nossa fragilidade, Deus se mostra forte e nos fortalece. Enfrentando incansavelmente os opressores, ele se mostra príncipe da paz. Armando sua tenda na escuridão, ele se faz nossa luz.

Os pastores são os primeiros a receber a notícia, a ver e a tocar esse mistério inefável, a experimentar a alegria que exorciza o medo. Mas eles não são os únicos! Essa alegria, suscitada pela esperança, cuja realização embrionária nos espera nas grotas do mundo, é para todo o povo, para todos os que “jazem nas sombras da morte”. As praças iluminadas e os shoppings sedutores não conseguem produzi-la, nem o cinismo dos que sequestraram o verde e o amarelo conseguirá suprimi-la. Ela brota do abraço entre a paz e a justiça, da união esperançosa de todas as vítimas!

Deus amável, abraço da misericórdia e da justiça, comunhão incondicional e sem limites, encontro reconciliador entre a divindade e a humanidade! No mistério dessa noite fazes resplandecer a notícia boa e verdadeira, e nela entendemos que não queres habitar as alturas inacessíveis, e fazes de nós tua morada definitiva. Que tua encarnação nos faça menos medrosos/as e mais alegres, menos resignados/as e mais lutadores/as, menos indivíduos e mais comunidade, mais proféticos/as que piedosos/as, espaços e sementeiras de verdade, de justiça e de paz. Amém! Assim seja!

Itacir Brassiani msf

Profecia de Isaías 9,1-6 | Salmo 95 (96) | Carta de São Paulo a Tito 2,11-14 | Evangelho segundo Lucas  (2,1-14)

Um comentário:

Anônimo disse...

Li e reli. Parabens. Boas Festas.