Onde
não há fé, Jesus não pode fazer milagre!
Marcos
6,1-13
I. SITUANDO
Nos sete
Círculos deste bloco (Mc 3,13-6,13), cresceu o conflito e apareceu o mistério
de Deus que envolvia a pessoa de Jesus. Agora, chegando no fim, a narração
entra numa curva. Começa a aparecer uma nova paisagem. O texto que meditamos
neste encontro é um resumo do segundo bloco e faz a ligação com o terceiro
bloco (Mc 6,14 a 8,21). Ele tem duas partes bem distintas, como os dois pratos
da balança. A primeira descreve como o povo de Nazaré se fecha frente a Jesus
(Mc 6,1-6). A segunda descreve como Jesus se abre para o povo da Galileia
enviando os discípulos em missão (Mc 6,7-13).
No tempo em
que Marcos escreveu o seu evangelho, as comunidades cristãs viviam uma situação
difícil, sem horizonte. Humanamente falando, não havia futuro para elas. A
descrição do conflito que Jesus viveu em Nazaré e do envio dos discípulos, que
alargava a missão, despertava nelas a criatividade. Pois para quem crê em Jesus
não pode haver uma situação sem horizonte.
II. COMENTANDO
Marcos 6,1-3:
Reação do povo de Nazaré frente a Jesus
É sempre bom
voltar para a terra da gente. Após longa ausência, Jesus também voltou e, como
de costume, no dia de sábado, foi para a reunião da comunidade. Jesus não era
coordenador, mesmo assim ele tomou a palavra. Sinal de que as pessoas podiam
participar e expressar sua opinião. Mas o povo não gostou das palavras dele e
ficou escandalizado. Jesus, um moço que eles conheciam desde criança, como é
que ele agora ficou tão diferente? O povo de Cafarnaum tinha aceitado o
ensinamento de Jesus (Mc 1,22), mas o povo de Nazaré se escandalizou e não
aceitou. Motivo? “Esse não é o carpinteiro, filho de Maria?” Eles não aceitaram
o mistério de Deus presente num homem comum como eles! Para poder falar de Deus
ele teria que ser diferente deles!
Como se vê, nem
tudo foi bem-sucedido. As pessoas que deveriam ser as primeiras a aceitar a
Boa-nova, estas são as que se recusam a aceitá-la. O conflito não é só com os
de fora de casa, mas também com os parentes e com o povo de Nazaré. Eles
recusam, porque não conseguem entender o mistério que envolve a pessoa de
Jesus: “De onde vem tudo isso? Onde foi que arranjou tanta sabedoria? Ele não é
o carpinteiro, o filho de Maria, irmão de Tiago, de Joset, de Judas e de Simão?
E suas irmãs não moram aqui conosco?” Não deram conta de crer. Sobre a
expressão “Irmãos de Jesus” veja o Alargando do Círculo 8.
Marcos 6,4-6a:
Reação de Jesus diante da atitude do povo de Nazaré
Jesus sabe
muito bem que “santo de casa não faz milagre”. Ele diz: “Um profeta só não é
estimado em sua própria pátria, entre seus parentes e em sua família!” De fato,
onde não existe aceitação nem fé, a gente não pode fazer nada. O preconceito o
impede. Jesus, mesmo querendo, não pôde fazer nada. Ele ficou admirado da falta
de fé deles.
Marcos
6,6b-13: Envio dos doze para a missão
O conflito
cresceu e tocou de perto a pessoa de Jesus. Como ele reage? De duas maneiras.
1) Diante do fechamento da sua família e do seu povoado, Jesus deixou Nazaré de
lado e começou a percorrer os povoados nas redondezas. 2) Ele abriu a missão e
intensificou o anúncio da Boa-nova. Chamando os doze, os enviou com as
seguintes recomendações: deviam ir dois a dois, receberam poder sobre espíritos
maus, não podiam levar nada no bolso, não deviam andar de casa em casa e, caso
não fossem recebidos, deviam sacudir o pó das sandálias e seguir adiante. E
eles foram. É o começo de uma nova etapa. Agora já não é só Jesus, mas é todo o
grupo que vai anunciar a Boa-nova de Deus ao povo. Se a pregação de Jesus já
dava conflito, quanto mais agora, com a pregação de todo o grupo! Se o mistério
já era grande, ainda será maior com a missão intensificada.
III. ALARGANDO
Envio e missão
No tempo de
Jesus havia vários outros movimentos de renovação. Por exemplo, os essênios e
os fariseus. Também eles procuravam uma nova maneira de conviver em comunidade
e tinham os seus missionários (cf. Mt 23,15). Mas estes, quando iam em missão,
iam prevenidos. Levavam sacola e dinheiro para cuidar da sua própria comida.
Pois não confiavam na comida do povo, que nem sempre era ritualmente “pura”.
Ao contrário
dos outros missionários, os discípulos e as discípulas de Jesus recebem
recomendações diferentes que ajudam a entender os pontos funda¬mentais da
missão de anunciar a Boa-nova, que recebem de Jesus e que ainda é a nossa
missão:
a) Deviam ir sem
nada. Não podiam levar nada, nem bolsa, nem ouro, nem prata, nem dinheiro, nem
bastão, nem sandálias, nem sequer duas túnicas. Isto significa que Jesus os
obriga a confiar na hospitalidade. Pois quem vai sem nada vai porque confia no
povo e acredita que será recebido. Com esta atitude criticavam as leis de
exclusão, ensinadas pela religião oficial, e mostravam, pela nova prática, que
tinham outros critérios de comunidade.
b) Deviam
comer o que o povo lhes dava. Não podiam viver separados com sua própria comida
e deviam aceitar a comunhão de mesa. Isto significa que, no contato com o povo,
não deviam ter medo de perder a pureza tal como era ensinada na época. Com esta
atitude criticavam as leis da pureza em vigor e mostravam, pela nova prática,
que tinham outro acesso à pureza, isto é, à intimidade com Deus.
c) Deviam
ficar hospedados na primeira casa em que fossem acolhidos. Isto é, deviam
conviver de maneira estável e não andar de casa em casa. Deviam trabalhar como
todo o mundo e viver do que recebiam em troca, “pois o operário merece o seu
salário” (Lc 10,7). Em outras palavras, eles deviam participar da vida e do
trabalho do povo, e o povo os acolheria na sua comunidade e partilharia com
eles casa e comida. Significa que deviam confiar na partilha. Isto também
explica a severidade da crítica contra os que recusavam a mensagem (Lc
10,10-12), pois não recusavam algo novo, mas sim o seu próprio passado.
d) Deviam tratar
dos doentes e necessitados, curar os leprosos e expulsar os demônios (Lc 10,9;
Mt 10,8). Isto é, deviam exercer a função de “defensor” (goêl) e acolher para
dentro do clã, dentro da comunidade, os que viviam excluí¬dos. Com esta atitude
criticavam a situação de desintegração da vida comunitária do clã e apontavam
saídas concretas.
Estes eram os
quatro pontos básicos que deviam marcar a atitude dos missionários ou das
missionárias que anunciavam a Boa-nova de Deus em nome de Jesus: hospitalidade,
comunhão de mesa, partilha e acolhida aos excluídos (defensor, goêl). Caso
estas quatro exigências fossem preenchidas, eles podiam e deviam gritar aos
quatro ventos: “O Reino chegou!” (cf. Lc 10,1-12; 9,1-6; Mc 6,7-13; Mt
10,6-16). Pois o Reino de Deus que Jesus nos revelou não é uma doutrina, nem um
catecismo, nem uma lei. O Reino de Deus acontece e se faz presente quando as
pessoas, motivadas pela sua fé em Jesus, decidem conviver em comunidade para,
assim, testemunhar e revelar a todos que Deus é Pai e Mãe e que, portanto, nós,
seres humanos, somos irmãos e irmãs uns dos outros. Jesus queria que a
comunidade local fosse novamente uma expressão da Aliança, do Reino, do amor de
Deus como Pai, que faz de todos irmãos e irmãs.
Carlos
Mesters e Mercedes Lopes
Nenhum comentário:
Postar um comentário