quarta-feira, 22 de junho de 2016

ANO C – DÉCIMO TERCEIRO DOMINGO DO TEMPO COMUM – 26.06.2016


Fomos libertados para viver com paixão o Amor e a Justiça.

Quem quiser seguir Jesus Cristo em tempos de cultura líquida (que rejeita referências sólidas, enrijece a lógica que transforma tudo em mercadoria, aceita a exclusão como destino inexorável e estabelece a indiferença como sinônimo de liberdade) precisa tomar uma decisão firme e refletida. Não pode ter como única referência os próprios desejos e sonhos, mas precisa ter claro o objetivo de seguir e imitar Jesus na sua paixão pela humanidade, na sua solidariedade com os últimos, no seu enfrentamento com os poderes que se opõem ao projeto de um mundo no qual todas as criaturas tenham seu lugar.
É emblemático que, frente à tentação do integralismo e à discussão sobre quem é o maior e (cf. Lc 9,46-50), Jesus tenha tomado “a firme decisão de partir para Jerusalém”. Nossa meta da vida cristã não é voltar os olhos ao céu ou contemplar numa espécie de êxtase o esplendor dos impérios, mas, como o faz Jesus, perceber e denunciar suas contradições e suas injustiças. Ademais, perseverar no caminho de Jesus Cristo exige renovada coerência com o Evangelho, imbatível firmeza diante das resistências e ânimo indestrutível frente às possíveis decepções. Como os discípulos daquele tempo, somos enviados à frente de Jesus para preparar-lhe um lugar, sempre cientes das possíveis resistências.
A reação dos samaritanos – grupo social que, segundo os evangelhos, recebe uma atenção privilegiada de Jesus – é compreensível diante de um anúncio possivelmente insuficiente por parte dos discípulos. Assim como haviam proibido o trabalho daqueles que faziam o bem mas não estavam com eles, é possível que os discípulos tenham anunciado aos samaritanos um Jesus nacionalista, identificado com os poderes e doutrinas que diminuíam e excluíam os samaritanos, omitindo que Ele estava subindo a Jerusalém exatamente para contestar a validade do templo e para enfrentar a rejeição e o martírio.
Não seria também essa a principal causa da resistência que o mundo ocidental e moderno opõe ao cristianismo? Será que não temos identificado demasiadamente Evangelho e poder? Será que não temos renegado culpavelmente a defesa corajosa e decidida dos direitos de todos os humanos? Será que não temos esquecido perigosamente a profecia? Pouco adianta ameaçar os ateus e as (indevidamente chamadas) seitas com o fogo que desce do céu ou sobe do inferno... O que precisamos mesmo é de conversão ao Evangelho de Jesus Cristo e de abandono da pretensão do monopólio da verdade.
Os cristãos precisam levar a sério a advertência de Jesus de Nazaré e partir para outros povoados e periferias, cientes de que segui-lo pelos caminhos da história de hoje é a vocação de todos os homens e mulheres que aderem ao cristianismo, inclusive dos que não o fazem explicitamente. Se nosso caminho tiver uma direção clara e permanecer fiel à prática de Jesus, é possível que muitas pessoas, pertencentes tanto aos setores sociais mais abastados como aos grupos populares, se sintam também hoje fortemente interpeladas e decidam se incorporar à comunidade dos discípulos e discípulas.
É verdade que as pessoas que procuram nossas comunidades trazem consigo contradições e ambivalências, das quais, aliás, nem prelados da Igreja conseguem se livrar. Com Jesus, aprendemos a apresentar a elas, com delicadeza e clareza, as exigências e consequências da opção de estar com ele.  Jesus nos apresenta uma espécie de ética do seguimento, na qual as rupturas e renúncias são uma pedagogia para a liberdade. Assim como exige um distanciamento frente ao fanatismo, Jesus pede uma ruptura com alguns costumes que, mesmo conservando um certo valor, podem limitar a liberdade.
Com palavras diferentes, Paulo repete o mesmo ensinamento de Jesus: “Toda a lei se resume neste único mandamento: amarás o teu próximo como a ti mesmo.” Eis a liberdade bela e preciosa à qual somos chamados e à qual não podemos renunciar sem descer ao nível dos mortos: não a autonomia, a indiferença e a superioridade, mas o respeitoso reconhecimento da dignidade do próximo e o livre serviço às suas necessidades. Nisto consiste a obediência razoável devida a Deus e o amor maduro que de nós ele tem direito a esperar. Fomos libertados para a prática do amor e da justiça.
Jesus de Nazaré, mestre de exigentes lições e peregrino que avança no caminho para Jerusalém, decidido a enfrentar o poder: queremos caminhar contigo, aprender aquilo que realmente conta e alcançar a liberdade profunda e radical. Queremos aprender de ti e dos profetas que te precederam e seguiram a profecia e o ardor pelos direitos de Deus. Dá-nos a disciplina e a coragem para romper com todos os compromissos que reduzem ou adiam nossa autêntica liberdade.  Que São João Batista, festa e alegria dos pequenos, nos estimule e acompanhe, e que nada nos impeça de caminhar contigo. Assim seja! Amém!

Itacir Brassiani msf
(1° Livro dos Reis 19,16.19-21 * Salmo 15 (16) * Carta aos Gálatas 5,1.13-18 * Evangelho de S. Lucas 9,51-62)

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