Não deixemos que nos
roubem a alegria da missão!
A Igreja
católica tomou consciência de que a missão faz parte do seu código genético, e
proclama que esta não é apenas mais uma entre as suas múltiplas tarefas, nem uma
responsabilidade de apenas algumas pessoas. Em 2007, na Conferência de Aparecida, os bispos da América Latina e do Caribe
colocaram a questão da missão no centro das preocupações da Igreja na América
Latina e convocaram todos os seus membros a serem discípulos e missionários de
Jesus Cristo. Na mensagem para a jornada mundial das missões do ano em curso, o
papa Francisco insiste: a missão está no coração da nossa fé!
Na
perspectiva do evangelho do 27° domingo, a missão não consiste propriamente em
semear a mensagem do Reino de Deus onde o cristianismo ainda não lançou raízes,
mas em ir aos “arrendatários da vinha do Senhor” para recolher os frutos
esperados. Como missionários, somos enviados àqueles que foram investidos de
autoridade ou ocupam posições de liderança política, social e religiosa para
verificar se realmente se dedicam ao povo e defendem sua dignidade. A missão é ir
àqueles que se apropriaram indevidamente da vinha do Senhor. Uma missão com uma
clara dimensão crítica e profética!
Esta
missão é tão urgente quanto difícil e conflituosa. A parábola de Jesus menciona
as agressões e espancamentos sofridos pelas pessoas enviadas. Quando os
missionários não se limitam a propor doutrinas e celebrar ritos, correm o risco
de serem pessoas indesejáveis e sofrerem violências nas mãos dos ‘malvadamente
maus’ ou dos ‘canalhas’, como diz o evangelista. A história remota e recente
também registra as calúnias e torturas, as prisões e o martírio sofridos pelos
profetas e testemunhas. Em alguns países da África e do Oriente Médio, mas não
só, isso continua terrivelmente atual...
Digamos
uma vez mais, para que fique claro: a missão, como a entendemos hoje, não
consiste em colher frutos para a instituição eclesial ou multiplicar suas
agências, mas em cobrar o estabelecimento do direito de Deus no mundo: a
implantação da justiça para os pobres, o reconhecimento da dignidade dos
desprezados, a primazia dos últimos, o cuidado e a bondade gratuita para com
todas as criaturas. Se estes frutos não forem encontrados, o Reino de Deus deve
ser subtraído às elites e autoridades constituídas e entregue a pessoas, grupos
e movimentos que produzam esses frutos.
Jesus é o
missionário enviado pelo Pai, modelo e o caminho de todos os missionários e
missionarias. Ele não se negou a pagar o preço que a missão lhe exigiu: foi
caluniado, desprezado, descartado e crucificado. Foi tratado como uma pedra que
os pedreiros descartam porque consideram sem valor, inadequada e problemática no
seu projeto de dominação e exclusão. Mas, para ele, isso não se configurou numa
tragédia. Pelo contrário, a rejeição acabou revelando sua opção pessoal e o
princípio norteador da sua vida. Ou seja: “a missão da Igreja encoraja a uma atitude de peregrinação contínua através
dos vários desertos da vida, através das várias experiências de fome e sede de
verdade e justiça.”
O
princípio cardeal da missão de Jesus e dos seus discípulos é sair
solidariamente ao encontro dos rejeitados e excluídos para estabelecer, em nome
do Pai que os envia, uma primazia e uma dignidade que jamais prescreve: os
grupos humanos e sociais aparentemente problemáticos e disfuncionais são a
pedra-de-toque do Reino de Deus. Sem o anúncio de uma Boa Notícia aos pobres e
sem a reversão social que coloca os últimos em primeiro lugar, não há Igreja
nem missão fiel a Jesus. É daqui que brota a alegria cristã, alegria inerente
ao Evangelho, como vem sublinhando insistentemente o papa Francisco.
E esta é
a perspectiva de todo trabalho autenticamente missionário: subverter os
esquemas, inverter as prioridades, afirmar os excluídos como indispensáveis no
projeto de um mundo que deseje ser humano. É nisso que a Igreja precisa
empenhar de forma contínua todos os seus membros, todos os seus esforços e os
melhores meios de que dispõe. A missão segue seu caminho de baixo para cima, da
periferia para o centro, dos últimos para os primeiros. A parábola da pedra
rejeitada pelos grandes e recolocada por Deus no centro, é a parábola da
missão. Não deixemos que nos roubem essa genuína alegria!
Deus pai e mãe, cuidador e amante apaixonado da tua
vinha: continua a suscitar homens e mulheres conscientes da própria fragilidade
e da força do teu amor e envia-os para cuidar do teu povo. Que eles não
desanimem quando forem tratados como pedras inúteis na construção dos muros.
Que eles sintam a companhia inspiradora de Teresinha, André, Ambrósio, Mateus,
Francisco e tantos outros. E que esta comunidade que nasce do lado aberto do
teu filho empenhe seus melhores membros e meios na missão de testemunhar a
comunhão fraterna e de anunciar a boa notícia aos pobres. Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
(Profecia de Isaias 5,1-7 * Salmo 79 (80) * Carta de
Paulo aos Filipenses 4,6-9 * Evangelho de São Mateus 21,33-43)
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