Jesus Cristo é a Paz de Deus para todas as criaturas.
Percorremos as quatro semanas vigiando, preparando, desgustando e
escutando. O dia chegou e estamos com o coração leve, acolhedor e generoso. Com
os olhos limpos e os ouvidos abertos, estamos prontos a reconhecer e acolher a Presença de Deus que se manifesta do seu
próprio jeito: na carne humana, nas estrebarias e periferias, no silêncio de um
inocente que nos olha nos olhos e desperta em nós o que há de mais nobre: a
capacidade de se enternecer e de cuidar; a generosidade de fazer-se dom e
presente; o dinamismo que vence o fechamento em nós mesmos e na fugacidade do
presente...
O nascimento de Jesus ocorre no mundo dos pobres, à margem dos poderes
romanos e judaicos, na periferia daquele mundo que dizia garantir a paz
recorrendo ao medo. Os decretos oficiais põem José e Maria outra vez na
estrada: garantem a cobrança dos impostos mas não a tiram a Família de Nazaré
de sua pobreza. Aquela humilde família percorre um caminho em direção às raizes
das esperanças populares e messiânicas: a família e origem do pastor Davi. Em
Belém, os proscritos pastores põem sua atenção nesta familia de nela
identificam a esperança que os encoraja e alegra.
Para os pastores, naquela estrebaria ignota há mais luz que no brilho de
Jerusalém e na sabedoria da Lei. Os anjos, mensageiros de Deus, não estão
presos ao Templo, mas junto àqueles que, estando longe de tudo, vigiam os
rebanhos, inclusive à noite. E anunciam a boa noticia: o Salvador nasceu na
“periferia do mundo”. Indicam o sinal de que isso aconteceu: um bebê
deitado numa cocheira para animais, envolto em pobres panos. O sinal da “grande
alegria para todo o povo” não são os anjos, nem a luz que os envolve, nem a
música melodiosa que ressoa no céu; é a fragilidade de uma criança!
Para aqueles que crêem, o nascimento de Jesus é mais que um
acontecimento do passado. Não se resume também a uma revelação que aponta para
uma dimensão “sobrenatural” da vida ou para um evento que tem sentido apenas
para o coração. Com a ajuda do profeta Isaías, descobrimos que a encarnação do
Filho de Deus refulge como luz para quem caminha na escuridão, como a alegria
da colheita para os camponeses, como a vitória dos fracos sobre o medo e a
violência. O Natal é a passagem da opressão à liberdade, do medo à confiança,
da dependência à emancipação.
O romantismo e a beleza da música nos envolve e nos inspira: “Pobrezinho
nasceu em Belém. Eis na lapa Jesus, nosso bem. Dá-nos paz, ó Jesus!” Pois é
verdade que o natal é a festa da paz. Paz entre as nações. Paz entre as
Igrejas. Paz nas comunidades. Paz entre nas famílias. Paz na relação entre os
seres humanos e as demais criaturas. Paz entre o céu e a terra. Paz onde há
guerra e paz onde falta confiança, no norte e no sul, no oriente e no ocidente.
Os Papas nos lembram que a paz se chama desenvolvimento, e o caminho para a paz
é a superação da pobreza através da justiça.
Nossos povos originários também nos ensinam com sabedoria que a paz não
se reduz ao equilíbrio de forças políticas ou a um sentimento interior. Antes,
a paz se situa no coração da utopia ancestral do bem viver, que se realiza na
convivência harmoniosa e equilibrada da pessoa com a sua dimensão de
interioridade e exterioridade, das pessoas entre si e das pessoas com a natureza
como um todo. Neste sentido, o bem ou o mal de uma espécie ou parte da criação
resulta no bem ou no mal de todo o conjunto. Infelizmente, dos centros de poder
e das classes privilegiadas quase sempre nascem e se expandem, , mais cedo ou
mais tarde, crises perseguições.
A paz que não tem fim passa também pela comunidade eclesial. Nela nos
encontramos com pessoas diferentes, descobrimos que somos membros diversos num
único corpo e escutamos a Palavra sempre vive e criadora de Deus. Uma Palavra
que nos confirma como filhos e filhas que não perdem essa dignidade por motivo
nenhum. Uma Palavra que nos ajuda a compreender sempre de novo que a divindade
se esconde na humanidade e com ela se identifica, nos pobres que foram
acostumados a calar e sofrer. O caminho da paz passa por Belém, pela
estrebaria, pela manjedoura.
Deus Menino, vivo na nossa
frágil carne, filântropo do gênero humano: viemos te procurar e te encontramos
repousando sob o olhar humano e cuidadoso de um casal humilde e surpreso.
Parece que te faltam tantas coisas, mas, pobre, nos ensinas a bem viver. Por isso, o que nos
resta é apenas trocar presentes: tu nos dás a felicidade, a dignidade e a
solidariedade que há muito perdemos nos corredores dos shopings, e nós te oferecemos a palha da nossa
pequenez, a luz do nosso olhar e o calor que ainda resta nas nossas entranhas e
no meio das pessoas que amamos. Acolhe nossos dons... Amém! Assim seja!
Itacir Brassiani msf
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