domingo, 24 de dezembro de 2017

ANO B – FESTA DO NASCIMENTO DE JESUS CRISTO – 25.12.2017

Em Jesus, Deus diz sua Palavra e a Vida brilha e faz a festa!
A festa da noite de ontem se prolongou madrugada adentro, e na manhã de hoje tudo está mais silencioso. Aproveitemos, pois, para compreender o sentido do Natal colocando entre parênteses os apelos e ofertas do mercado, e pedindo ajuda aos primeiros cristãos. Por trás do hino do Evangelho segundo João e dos primeiros versículos da carta aos Hebreus, sugeridas para a liturgia de hoje, está uma experiência concreta e uma profissão de fé amadurecida numa busca longa e intensa, em meio a conflitos e perseguições. O coração desta Boa Notícia é a manifestação da glória de Deus na vulnerabilidade da carne humana. Benditos e belos são os pés de quem corre anunciando isso!
Tudo parte da gruta de Belém e nela se sustenta. Mas não menos viva é a memória da vida inteira de Jesus, seu anúncio e sua ação polêmica e libertadora, sua condenação e morte na cruz dos proscritos. João tem isso presente quando nos fala da Palavra que estava junto de Deus e que era Deus, que é a Luz que brilha e que vence as trevas, que se faz Carne e vem habitar entre nós, que torna visível o Deus invisível. Na carta aos Hebreus, a comunidade cristã dá seu testemunho de que em Jesus, nascido na pobreza e perseguido pelos poderes políticos e religiosos, Deus nos falou de modo definitivo.
Os conceitos e imagens que aparecem no poema-resumo do evangelho de João são vários e complementares: Palavra, Vida, Graça e Glória. Enquanto Palavra, Jesus, o filho de Maria e de José nascido em Belém, é a exteriorização da interioridade de Deus, e esse mistério não é uma lei, uma advertência ou uma doutrina, mas uma boa notícia que produz felicidade porque gera e sustenta processos de liberdade. A Palavra de Deus assume a carne humana e a vida histórica e corporal de Jesus como lugar na qual os homens e mulheres podem encontrar, tocar e acolher o próprio mistério de Deus.
O mesmo Jesus, filho de Maria e de José, que nasceu em Belém e viveu como carpinteiro em Nazaré, que reuniu discípulos e foi por eles abandonado em Jerusalém, é portador da Vida plena e eterna, do “bem viver” que todos os povos buscam sem descanso. Nele, esse bem viver é revelado e doado como comunhão profunda com o mistério de Deus, comunhão solidária com todas os pobres e as vítimas, e comunhão graciosa com todas as criaturas. Em Jesus de Nazaré, a Vida mostra sua cara e sua força: nele não há lugar para o egocentrismo que amordaça, domina e mata.
Na pessoa e no caminho histórico de Jesus de Nazaré, vislumbramos também a Graça de Deus, graça manifestada e encarnada. Nele fica claro que Deus não é um cobrador de dívidas ou um juiz frio e calculista, mas um irmão e um hóspede no qual se mostram e sacramentalizam de modo inequívoco a gratuidade e o dom. A lei e a cobrança implacáveis vêm das velhas instituições, mas a Graça e a Verdade nós as recebemos por Jesus Cristo. Ele é a gratuidade de Deus em pessoa! Por isso Paulo pode escreves aos Hebreus: “Ele é o esplendor da glória do Pai, a expressão do seu ser.”
Em hebraico, a palavra glória expressa a importância e o valor interior de uma pessoa, e isso se revela nas ações e requer o respeito dos outros. Por isso, manifestar a glória de Deus significa testemunhar sua ação libertadora, prosseguir nos diversos contextos sua ação humanizadora, reconhecer sua santidade nos acontecimentos históricos.  A metáfora da luz e da glória é frequentemente usada para materializar a glória de Deus, como aparece no relato do nascimento de Jesus (cf. Lc 2,9).  E João afirma: “Nós vimos a sua (da Palavra feita carne) glória, glória como do Filho único da parte do Pai”.
A tradição cristã afirma com ousadia que a glória de Deus se manifesta de modo incomparável e insuperável na crucifixão de Jesus, na sua fidelidade radical e amorosa à humanidade oprimida. Sendo a cruz o desfecho de uma inteira vida de amor, podemos dizer que na humanidade de Jesus vemos a glória de Deus. E os discípulos de Jesus são glorificados na medida em que participam do dinamismo do seu amor ou paixão pelo mundo. Eis nosso brilho, nosso peso, nosso valor! Mas tudo isso não pode ser sermão monótono, doutrina abstrata ou ideologia escravizadora...
Diante da tua pequenez gloriosa, Deus Menino, ajoelhamo-nos eternamente agradecidos. É desta tua Glória que todos necessitamos. É este brilho que todos buscamos de forma inconsciente e quase desesperada. É desta Vida que se expande e multiplica que temos fome. Queremos que esta graça nos plenifique e nos torne benfeitores da humanidade. Tu nos ensinas que é armando a tenda dos nossos sonhos e palavras em meio à humanidade peregrina que alcançamos a liberdade e a plena realização. Obrigado por esta lição pronunciada em nossa própria carne. Queremos ser filhos desta luz. Assim seja! Amém!

Itacir Brassiani msf
(Profeta Isaías 52,7-10 * Salmo 97 (98) * Carta aos Hebreus 1,1-6 * Evangelho de João 1,1-18)

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