sábado, 17 de março de 2018

A sagrada terra da missão (4)


Voltando ao Jardim da Infância
Desde minha chegada a Moçambique, fiquei somente alguns dias na casa da missão, pois logo em seguida vim para Nampula, onde estou fazendo o curso de inculturação e de língua macúa. Esse é um grande desafio! Nunca imaginei estudar uma língua tendo que deixar um pouco de lado o que havia aprendido nos meus anos escolares. Não que a língua macúa não tenha uma estrutura semelhante ao português ou alguma das outras línguas que já estudei. A dificuldade, que é ao mesmo tempo a riqueza, está na novidade. Encontro algumas semelhanças estruturais tudo o mais é diferente. Sinto-me no jardim de infância, começando a dar os meus primeiros passo.
É difícil mas é muito bom recomeçar! É uma riqueza você começar a mergulhar numa nova cultura, ainda que teoricamente. Mas a prática vai acompanhando a teoria de muito perto. Nesse aprendizado, é muito importante descalçar-se e entrar respeitosamente na terra sagrada da cultura macúa, nos seus ritos, celebrações, filosofias e teologias de vida.
Na cultura macúa, tudo gira em torno da natureza, que, para essa cultura, não tem os mesmo ciclos que nós ocidentais ensinamos. Afirmando isso, não quero generalizar, pois sei que muitos dos nossos povos ameríndios também possuem formas distintas de encarar a vida. Para os macúas, cada passagem da vida, cada plantação e cada gesto tem o seu significado. Muitos desses significados encontram a sua gênese nos ciclos que a própria natureza traz consigo, principalmente as quatro estações.
O povo macúa é um povo aguerrido, que não desiste perante as incertezas da vida. Muitas vezes lhe falta o pão, a água e quase tudo, mas não lhe falta a vontade de se levantar ao raiar do sol e seguir na labuta. Para compreender isso, é necessário arrancar qualquer tipo de preconceito que possa estar enraizado no nosso modo de ver e de viver. Quem chega aqui e quer entender a cultura local precisa compreender que a noção de tempo é diferente.
O povo daqui segue o tempo do divino, o tempo da natureza, e isso é algo que preciso ainda assimilar no meu viver. Poder viver melhor, rezar melhor, estar mais disponível àqueles que me procuram, àqueles que convivem comigo! Parar e conversar! Sentar e escutar! Conviver e amar! Converta-me, mãe África, para que eu possa ser cada dia mais livre!
Fr. Ricardo Klock msf
28 de fevereiro de 2018

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