At 5,27-32.40-41; Sl 29; Ap
5,11-14; Jo 21,1-19: Começar de novo
“Mas não
pescaram nada naquela noite”, escreve o evangelista (Jo 21,3). É muito amarga a
experiência de Pedro, Tomás e Natanael, dos filhos de Zebedeu e dos outros dois
discípulos (são sete, número que representa a universalidade, primeiro gérmen
da Igreja), depois de uma cansativa noite de pesca.
É uma
experiência não muito diferente daquela de tantos homens e mulheres, de tantos
dias e noites: não produzir nada. Nestes casos, a ‘noite’ não é apenas uma
questão de tempo, mas sinal da ausência do Senhor e do consequente
enfraquecimento, sinal da inutilidade de tantos esforços.
Mas ao
amanhecer, um homem se aproxima do cansaço e da desilusão dos apóstolos. A
proximidade de Jesus, não importa se é reconhecido ou não, significa o fim da
noite, e o que conta é o começo de um novo dia, de uma nova vida. Jesus pede se
eles têm algo para comer e aqueles sete homens são obrigados a confessar a
própria pobreza e impotência. Mesmo sem ter sido reconhecido, Jesus os convida,
com amizade digna de crédito, a procurar o alimento alhures: “Lançai a rede à
direita do barco e achareis” (Jo 21,6). Aqueles sete homens acolhem o convite.
Sem nenhuma forma de resistência, mesmo que fosse absolutamente racional
resistir, obedecem. E a pesca é abundante, milagrosa, para além de toda medida.
Diante
desta experiência de fecundidade e de alegria, um dos discípulos, aquele que
Jesus amava, reconhece sua voz e diz aos outros: “É o Senhor!” Mais uma vez, na
boca do discípulo ecoa o anúncio da Páscoa, a vitória do Senhor sobre a morte.
Ao sentir a proximidade do Senhor, Simão Pedro, se dá conta da própria
indignidade: veste-se, porque está nu, se joga no lago e vai em direção a
Jesus. Os demais se aproximam com a barca, arrastando a rede cheia de peixes.
Neste
momento o Evangelho descreve uma cena convivial, cheia de ternura: todos estão
juntos, em torno de um fogo no qual alguns peixes são assados, preparado por
Jesus, que também lhes providencia pães. Ninguém ousa fazer perguntas.
Permanecem sem palavras, como que vencidos pelo amor e pela ternura.
É a terceira
vez que Jesus se manifesta aos seus discípulos. Para nós é o terceiro domingo
que nos reunimos na liturgia dominical, respondendo ao convite que Jesus nos
dirige, como o fez aos seus: “Vinde comer!” (21,12). Hoje, como naquele dia,
vemos se repetir a mesma cena e escutamos as mesmas palavras: “Jesus
aproximou-se, tomou o pão e deu a eles” (21,13).
É uma cena
simples e, ao seu modo, cheia de perguntas, sobretudo de uma pergunta: aquela
que o próprio Jesus dirige a Pedro. Não é uma pergunta sobre o passado ou sobre
as desilusões, nem sobre os medos, que não eram poucos. “Simão, filho de João,
tu me amas mais do que estes?” (21,15)
Jesus
interpela Pedro a respeito do amor. Não lhe recorda a traição de alguns dias
antes. De fato, o amor cobre uma multidão de pecados. E Pedro, que estava
envergonhado diante dele e havia corrido ao seu encontro, respondeu sem
hesitação: “Sim, Senhor, tu sabes que sou teu amigo.” Esta resposta é mais
verdadeira que aquela que havia dado no cenáculo, quando dissera a Jesus:
“Senhor, eu estou pronto a ir contigo até mesmo à prisão e à morte!” (Lc
22,339. Agora sua resposta era mais verdadeira, mais humana.
E a ele,
que não merecia nada, Jesus diz: “Cuida dos meus coirdeiros.” Em outras
palavras: seja responsável pelos homens e mulheres que te confio. Exatamente
ele, que não havia conseguido ser fiel, deveria ser o responsável? Ele mesmo?
Sim, porque agora Pedro acolhia o amor que Jesus memo lhe doava, e no amor nos
tornamos capazes de falar, de testemunhar e de cuidar dos outros. Jesus não o
interroga aobre o amor apenas uma vez, mas três vezes, ou seja, sempre. Todos
os dias somos perguntados se amamos o Senhor. A cada dia nos é confiado o
cuidado dos outros. A única força e o único título que nos permite viver é o
amor pelo Senhor.
Jesus diz
ainda a Pedro: “Quando eras jovem, tu mesmo amarravas teu cinto e andavas por
onde querias.” Talvez Pedro tenha recordado seu tempo de juventude como
pescador em Betânia, quando se levantava cedo para ir pescar, para sair de casa
e ir onde quisesse. Recordou talvez também as desilusões e o lugar onde
encontrou Jesus pela primeira vez. E enquanto estas lembranças lhe vinham à
mente, Jesus acrescentou: “Quando, porém, fores velho, estenderás as mãos, e
outro vai te amarrar e te levará onde não queres ir.” O evangelista explica que
se fala da sua morte.
Mas Pedro,
como cada discípulo, não ficará sozinho: o amor sobre o qual somos interrogados
compromete o Senhor antes e mais que a nós. De fato, é ele que nos amou
primeiro e jamais nos abandonará, mesmo quando um outro nos amarrar e nos levar
para onde não queremos ir. O que conta mesmo é a fidelidade àquela cena à
margem do lago, que cada domingo se repete para nós. Aquela cena tem um sabor
de eternidade.
Reflexão preparada pela Comunidade Santo
Egídio de Roma e traduzida ao português a pedido da mesma por Itacir Brassiani msf)
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